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Covid-19. 90% dos restaurantes não reduziram preços, até há clientes a pagar mais, mas o seu futuro é incerto

Covid-19. 90% dos restaurantes não reduziram preços, até há clientes a pagar mais, mas o seu futuro é incerto
Mgg Vitchakorn/Unsplash

No balanço de duas semanas do regresso dos restaurantes, um estudo apurou que 40% reduziram as ementas, só 10% estão a fazer promoções e continuam a ser geridos "exatamente como antes da pandemia"

Faltou fazer contas e planear melhor a reabertura. É o que conclui um estudo de balanço das duas primeiras semanas de desconfinamento dos restaurantes portugueses, realizado pela Consulting2gether, consultora especializada em restauração, com base num inquérito a restaurantes reabertos em Lisboa.

Cerca de 40% dos restaurantes reduziram a ementa, apenas 10% fizeram promoções especiais para atrair clientes e, tirando as novas medidas sanitárias que adotaram, "mais de metade dos estabelecimentos reabriram as portas exatamente como antes da pandemia". Em termos financeiros, "sem uma estratégia específica para estes novos tempos", segundo conclui o estudo.

Na primeira semana, 70% dos restaurantes diziam que os clientes estavam a consumir como antes da pandemia e para 20% os clientes até estavam "a gastar um pouco mais do que o normal, em razão do confinamento". Na segunda semana, já se sentiram melhorias, com vários restaurantes a sentir que os clientes estavam a gastar mais do que na anterior fase.

Se 90% dos restaurantes que reabriram não baixaram os preços, também não é isso que lhes salva o negócio, uma vez que estão a ter uma frequência menor do que o habitual, ditada por comportamentos muito erráticos do lado dos clientes, que aos poucos começam a desconfinar no que toca a comer fora.

"A frequência ainda está tímida, mas já a indicar uma retoma da normalidade, e com os clientes dispostos a gastar o mesmo, ou até um pouco mais do que antes", é outra das conclusões do estudo.

O "receio em sair e frequentar um restaurante" melhorou na segunda semana

"O comportamento dos clientes ainda mostra um certo receio em sair e frequentar um restaurante", o que tem vindo a melhorar à medida que o tempo passa e que as restantes atividades vão sendo desconfinadas, como constata o estudo.

Os restaurantes estiveram também a funcionar com a lotação reduzida a 50%, restrição a que deixam de estar sujeitos se usarem separadores em acrílico a salvaguardar a distância entre as mesas. Na primeira semana, 50% dos restaurantes estiveram a trabalhar com metade da ocupação relativamente ao que era permitido, o que significa que só estiveram a usar 25% da sua capacidade.

Só 10% dos restaurantes conseguiram aproximar-se de estar cheios, dentro da nova capacidade permitida desde a reabertura (que era de 50%), mas notaram-se melhorias da primeira para a segunda semana, em que 30% já puderam trabalhar com uma ocupação entre 51 e 70% do número de lugares permitidos.

"Falta um novo planeamento que contemple aspetos financeiros, de logística e de análise de rentabilidade do negócio. E não oferecer promoções neste momento, em que as pessoas estão preocupadas com os problemas financeiros, pode representar uma diminuição da ocupação", defende Jorge Abreu, presidente executivo da Consulting2gether, responsável pelo estudo.

O recurso dos restaurantes à entrega de refeições em casa dos clientes, através de plataformas como a Uber ou a Glovo, é outro aspeto destacado no estudo, que constata que "ao longo do período em que estiveram de portas cerradas, 30,8% dos restaurantes inquiridos implementaram o serviço de 'delivery' por estas plataformas, sistema que já era utilizado por 46,15%". O inquérito da consultora foi realizado junto de 16 restaurantes "previamente selecionados" a operar em diferentes zonas de Lisboa, como Alvalade, Avenidas Novas, Príncipe Real e Chiado, acompanhando os 12 dias de reabertura e comparando com os resultados verificados antes de a pandemia ocorrer.

36% dos restaurantes não reabriram e ponderam abrir insolvência, avança a AHRESP

Planear "uma estratégia financeira para este novo momento" é um fator crítico para os restaurantes portugueses nesta nova fase, conforme enfatiza a consultora, que entre uma série de medidas que elaborou aponta como "ação estratégica nº 1" a necessidade de se "analisarem custos fixos e outros dados financeiros pré-Covid", além de "adequar e reduzir a ementa, projetar cenários de faturação e dimensionar a operação".

O futuro dos restaurantes continua sob grandes incertezas, sendo fundamental, segundo Jorge Abreu, que se mantenha o 'layoff' parcial, uma vez que 87,5% dos estabelecimentos do sector têm os trabalhadores neste regime, e "o não prolongamento do layoff pode comprometer a saúde financeira e provocar despedimentos em grande número".

Um inquérito recente da Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), constatou que 36% dos restaurantes a nível nacional não reabriram a 18 de maio, e que 45% das empresas que reabriram têm registado uma faturação média abaixo dos 10%. Praticamente 60% dos restaurantes prevêem faturar menos de €10 mil em junho, o que não é comportável face aos seus custos fixos, e 36% ponderam avançar para insolvência já em junho.

De acordo com a AHRESP, cerca de metade dos restaurantes que reabriram registaram uma faturação média abaixo dos 10% relativamente às receitas habituaisobtiveram receitas abaixo dos 10%, e as "perpetivas para o verão e os tradicionais meses da época alta são dramáticas, 54% não vão conseguir suportar os encargos habituais", como pessoal, energia, fornecedores, entre outros.

A associação enfatiza que para o alojamento turístico "o cenário é igualmente preocupante, pois 49% das empresas continuavam encerradas no final do mês de maio, e que "a tradicional época alta será devastadora, com 30% dos inquiridos a perspetivarem uma taxa de ocupação máxima de 25%", e "perante este cenário, 18% das empresas de alojamento ponderam avançar para insolvência".

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: cantunes@expresso.impresa.pt

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