Sociedade

O que querem, até quando dura e que impacto terá? Onze respostas para explicar a greve de médicos e enfermeiros

O que querem, até quando dura e que impacto terá? Onze respostas para explicar a greve de médicos e enfermeiros
David Gray

Os médicos e os enfermeiros iniciaram esta terça-feira uma greve exigindo a revisão e progressão na carreira e um melhor Serviço Nacional de Saúde (SNS)

Qual é a duração das greves dos médicos e dos enfermeiros?
A greve dos médicos teve início esta terça-feira às 00h e deverá prolongar-se por dois dias até às 00h do dia 4 de julho. Os enfermeiros também iniciam uma paralisação esta terça-feira a partir das 8h que durará até ao final da semana.

O primeiro dia de greve dos médicos foi convocada pelo Sindicato Independente dos Médicos (SIM), enquanto o segundo é agendado pela Federação Nacional dos Médicos (FNAM). Está também prevista para as 15h de quarta-feira uma manifestação dos médicos junto ao Ministério da Saúde.

Quais são os sectores que serão afetados?
A greve afetará hospitais, centros de saúde e todos os outros serviços de saúde dependentes do Ministério da Saúde, Ministérios do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, da Educação, da Economia, da Justiça, das Secretarias Regionais da Saúde das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira e entidades públicas ou privadas.

Quais são os serviços mínimos garantidos?
Estão definidos serviços mínimos e segundo o comunicado do pré-aviso de greve, os meios necessários para os assegurar são os mesmos que em cada estabelecimento de saúde disponibilizados durante os domingos e feriados. Entre as áreas que estão garantidos os serviços mínimos estão as urgências, a quimioterapia e a radioterapia, os cuidados paliativos, a diálise ou a imunohemoterapia com ligação aos dadores de sangue, recolha de órgãos e transplantes.

No caso da paralisação dos enfermeiros, a definição dos serviços mínimos foi entregue ao tribunal arbitral face ao desacordo quanto aos serviços a salvaguardar.

Quem garante os serviços mínimos?
Além dos médicos e enfermeiros que não fazem greve, deverão garantir os serviços mínimos os profissionais da saúde que estão escalados, independentemente da sua categoria e/ou função.

Quais são as principais reivindicações das duas classes profissionais?
Os médicos exigem a revisão da carreira, uma nova grelha salarial, a diminuição do serviço em urgência das 18 para as 12 horas, a redução das listas de utentes dos médicos e a criação de um estatuto profissional de desgaste rápido e de risco.

Já os enfermeiros reivindicam a progressão na carreira, a equiparação de todos os vínculos de trabalho, o pagamento do suplemento remuneratório a todos os enfermeiros especialistas, que sejam definidos os 35 anos de serviço e 57 de idade para o acesso à aposentação e também medidas compensatórias face ao desgaste e risco da profissão.

Há mais ou menos profissionais no SNS?
O aumento de profissionais de saúde tem sido o principal argumento usado pelo Governo para tentar contrariar as queixas das várias classes profissionais.

Segundo os dados oficiais do Ministério, entre final de 2015 e maio deste ano, o SNS teve um acréscimo de 10.816 pessoas, um aumento de 9%.

Por classe profissional o reforço foi de: mais 4.500 enfermeiros, 1.700 médicos especialistas, 2.000 internos, 900 assistentes operacionais, 619 técnicos de diagnóstico e terapêutica, entre outros.

Ao todo, o SNS tem atualmente mais de 130 mil profissionais, refere o Ministério da Saúde. Em final de 2015 eram 119 mil.

Qual o rácio de médicos e de enfermeiros por mil habitantes no SNS?
Portugal tem dos mais elevados rácios de médicos por mil habitantes, com mais de 4,5 clínicos por cada mil pessoas, quando a média da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) é de 3,4. Contudo, dos 52 mil médicos inscritos na Ordem, apenas 45 mil estão no ativo em Portugal e menos de 29 mil estão no SNS.

No caso dos enfermeiros, Portugal continua na cauda da Europa. Apesar de ter 6,3 enfermeiros por mil habitantes, está muito abaixo da média de 9 dos países da OCDE. Quanto ao rácio no SNS, em 2016 o país tinha 4,2 enfermeiros por mil habitantes e em 2017 passou para 4,1, segundo dados da Ordem.

Quais as consequências destes rácios para os profissionais?Os profissionais sentem-se exaustos, desmotivados e fazem muitas horas extraordinárias. Estudos já apresentados apontam para elevadas taxas de burnout.

No caso dos enfermeiros, o estudo mais recente diz que um em cada cinco profissionais estão exaustos.

O estudo feito a pedido da Ordem dos Médicos mostra que 66% dos médicos estão num nível de exaustão emocional e 30% referem uma acentuada diminuição da realização profissional.
O recurso às horas extra é outra das formas de tentar contornar as carências de recursos humanos.

Num ano, os médicos do SNS fizeram cerca de seis milhões de horas extra, que já representam um quarto do rendimento médio mensal dos clínicos.

No caso dos enfermeiros, reclamam mais de dois milhões de "falsas horas extra" em dívida, que são colocadas em bolsas de horas que os profissionais acabam por não conseguir gozar.

Que áreas do país ou especialidades são mais afetadas por carência de profissionais?
Segundo a Ordem dos Médicos, há algumas zonas particularmente carenciadas, como o Alentejo e o Algarve. Contudo, o bastonário Miguel Guimarães indica que "há problemas em unidades de todo o país", lembrando casos como o hospital de Gaia e de Vila Real ou os casos de Viseu, Leiria e Guarda.

As especialidades de ginecologia e obstetrícia e de anestesiologia têm evidenciado falhas nos serviços mais recentemente. Mas a Ordem calcula que faltem cerca de cinco mil especialistas em Portugal, o que torna o défice de recursos humanos quase transversal a todas as especialidades clínicas.

O financiamento é outro ponto de discussão na saúde. Tem ou não aumentado?
Segundo o Governo, em quatro anos, o orçamento do SNS cresceu 1.400 milhões de euros. Desde o início de 2018 foram feitos reforços de capital e adiantamentos de mais de 1.500 milhões de euros para pagamento de dívidas. Na sexta-feira, o Governo anunciou um reforço extraordinário de 152 milhões de euros, num total de 445 milhões previstos para este ano.

Mas dados da Comissão Europeia sobre os sistemas de saúde divulgados este mês mostram que o total da despesa em saúde em Portugal "tem vindo a cair" e está nos 9% do Produto Interno Bruto (PIB), quando a média da União Europeia é de 10%.
Em termos per capita, a despesa pública de Saúde em Portugal fica a menos de metade da média da União Europeia.

E a atividade do SNS tem crescido?
Segundo dados oficiais do Ministério da Saúde, entre final de 2015 e final de 2018 foram feitas mais 589 mil consultas médicas nos centros de saúde, mais 184 mil consultas nos hospitais e um acréscimo mais ligeiro de cirurgias – mais cerca de 18 mil.
Contudo, o desempenho do SNS tem mostrado problemas nas listas de espera e no cumprimento dos tempos máximos de resposta considerados clinicamente aceitáveis.

Cerca de 20% das cirurgias de doença oncológica nos primeiros meses de 2018 foram feitas além dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos (TMRG, os tempos de espera clinicamente aceitáveis).

Dados do regulador da Saúde mostram que, no total das cirurgias programadas, os hospitais apresentaram taxas de incumprimento dos tempos de espera de 18,5%.

Já 39% das primeiras consultas de especialidade hospitalares foram feitas além dos tempos máximos definidos.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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