Abdesselam Tazi recrutava jiadistas para a Síria? Julgamento começa esta segunda-feira em Lisboa
Marroquino de 65 anos é acusado de vários crimes de terrorismo mas a defesa alega que não existem provas contra o ex-polícia. Alegado cúmplice foi detido em França quando estaria a preparar dois atentados naquele país
Abdesselam Tazi encontra-se em prisão preventiva na cadeia de alta segurança de Monsanto há dois anos. Há precisamente um ano, o marroquino de 65 anos foi acusado pelos procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) por um crime de adesão a organização terrorista internacional, outro de falsificação com vista ao terrorismo, quatro de uso de documento falso com vista ao financiamento do terrorismo, um de recrutamento para terrorismo e um de finaciamento do terrorismo.
Esta segunda-feira de manhã, o ex-polícia nascido em Fez começa a ser julgado no Juízo Central Criminal de Lisboa.
Ao Expresso, o advogado do ex-polícia marroquino, Lopes Guerreiro, é taxativo: "Não há provas que Tazi é terrorista ou tenha angariado pessoas para o Estado Islâmico". E defende que este processo "nasceu torto" já que, na sua ótica, o Ministério Público (MP) baseia-se nas informações prestadas por uma testemunha-chave, o irmão do cúmplice de Tazi, que "em sede da instrução deu o dito pelo não dito".
As autoridades suspeitam que Tazi usou cartões de crédito para financiar as atividades de recrutamento de jovens para o autodenominado Estado Islâmico (Daesh). E de acordo com a investigação, persuadiu pelo menos dois cidadãos marroquinos, que também passaram por Portugal, para se juntar à organização terrorista na Síria. Seria-lhes prometido um salário de 1800 dólares (cerca de 1600 euros) para lutar no califado.
O acusado é conhecido pela alcunha de "Salim Adam" e chegou a ser preso na Alemanha no verão de 2016 por fraude informática. Acabou por ser extraditado para Portugal. A defesa garante que este é o único crime pelo qual é suspeito.
Hicham El Hanafi, o alegado cúmplice marroquino de 29 anos com quem viajou para Portugal, foi detido em França em novembro de 2016 por suspeitas de preparar dois atentados naquele país nos mercados de Natal. As autoridades suspeitam que Tazi financiou as atividades terroristas de Hanafi.
Os dois homens aterraram no aeroporto da Portela a 23 de setembro de 2013 num voo proveniente de Bissau com passaportes falsos. Alegaram ser perseguidos em Marrocos por motivos políticos, obtendo o estatuto de refugiados e autorização de residência em Portugal. Nos anos seguintes, viveram entre Aveiro e Lisboa.
As autoridades vigiaram os dois homens quase desde o início da sua presença em território nacional e seguiram de perto algumas das viagens por países da Europa e até pela América do Sul. De acordo com a PJ e SIS, este périplo internacional teria um único objetivo: o financiamento do terrorismo de cariz jiadista.
Guerra com Ivo Rosa
O caso gerou uma polémica extra, quando em novembro do ano passado o Tribunal da Relação de Lisboa desmontou alguns dos principais argumentos do juiz de instrução Ivo Rosa.
Meses antes, o polémico magistrado − que também tem em mãos a instrução da Operação Marquês − considerou que não havia razões para acusar o marroquino Abdesselam Tazi dos crimes de terrorismo, deitando por terra a acusação do DCIAP.
Para Ivo Rosa só fazia sentido pronunciar este ex-polícia por falsificação de documentos e contrafação de moeda. Mas os desembargadores decidiram em sentido contrário, dando razão a um recurso do Ministério Público.
No acórdão da Relação, é referido que “causa evidente perplexidade” que o juiz de instrução não tivesse aceitado alguns dos factos descritos na acusação; “não se vislumbra” que tenham sido confundidos meios de prova; ou que Ivo Rosa “deveria ter tido em consideração” algumas das provas em vez de as ter “omitido” na sua fundamentação.
A Relação corroborou as principais suspeitas dos procuradores do caso.