Sociedade

O Leslie soprou, assustou, feriu e deixou a EDP em modo “perturbado”

Danos provocados pelo vento no bairro de Benfica, em Lisboa
Danos provocados pelo vento no bairro de Benfica, em Lisboa
RAFAEL MARCHANTE

Furacão que passou por Portugal danificou mas não devastou. EDP deixou milhares sem luz e admitiu a gravidade da situação

Expresso

Foi um sopro persistente e nervoso, desgastante e agressivo: o furacão Leslie encontrou caminhos imprevisíveis na breve passagem por Portugal, porque a rota que lhe traçaram não foi o rumo que percorreu, deixou danos complexos para cada um dos diretamente afetados - há feridos ligeiros, perdas materiais, gente retida em espaços públicos e outros sustos e temores - mas as consequências não são devastadoras para um país que sabe o que é perda quando a natureza fica irada. Centenas de milhares de clientes da EDP ficaram sem luz, houve um número de árvores por quantificar que não tiveram força para se aguentarem erguidas, as estradas - com a A1 na lista - tornaram-se intransitáveis e o céu também para os aviões que vinham, há muitos carros torturados pela tempestade e telhas que se perderam no ar, mas as autoridades destacaram sempre ao longo da noite que o Leslie foi domado pela prevenção e intervenção humanas. Este é o balanço até às 04h, hora a que acabou a fase crítica e a que este artigo foi publicado - depois de o vento ter mostrado ao país o que é acelerar a 176 quilómetros por hora.

Uma das vítimas maiores do Leslie é a EDP, censurada ao longo da noite nos diretos televisivos pela falhas de alimentação a milhares de casas. “Mais de 15.000 habitações sem fornecimento de eletricidade”, começou por noticiar a imprensa à entrada da madrugada. Piorou: “EDP incapaz de fornecer energia a centenas de milhares de clientes devido ao Leslie. Empresa admite que é ‘grave’”, titulava o Expresso a partir de um take da Lusa. A diretora de comunicação da EDP Distribuição, Fernanda Bonifácio, admitia que a situação era “muito grave e complexa” e anunciava que a empresa ia reforçar meios e recursos depois de ativar um módulo de intervenção com designação psíquica: “estado perturbado”. “O estado perturbado é superior ao estado de alerta. Estamos a mobilizar mais meios de outras partes do país para responder às ocorrências”: explicações de Fernanda Bonifácio, que apontava ainda que a empresa ia “naturalmente” dar prioridade a “aglomerados populacionais com maior densidade” na resolução dos problemas. Às zonas isoladas o Leslie mostrou-lhes naturalmente os custos do seu isolamento.

Alguns dos relatos humanos mais complicados chegaram do distrito de Coimbra: “Quedas de árvores, acidentes com carros, telhas que se soltaram e outros objetos fazem feridos ligeiros”, alertava o Expresso novamente a partir de um take da Lusa, que relatava também “o nível de destruição do Leslie” na região. A natureza virou-se contra si própria - “registaram-se muitas quedas de árvores, algumas arrancadas pela raiz pela força do vento”, contava o citado take - e mostrava a debilidade da construção humana - “andaimes e placas de sinalização” cederam às rajadas da tempestade. Além dos ferimentos, o Leslie deixou “dezenas de desalojados” no distrito (à semelhança do constatado em Alcobaça e na Marinha Grande) e provocou “uma destruição muito grande em telhados de habitações”.

A Figueira da Foz assistiu à infração maior do furacão, ventos de 176 quilómetros por hora. O IPMA tinha preparado o país para a eventualidade da transgressão chegar a 180 ou até 190 mas ninguém se prepara para ficar com mais de 800 pessoas retidas num mesmo espaço. Foi o que aconteceu no Centro de Artes e Espetáculos da Figueira da Foz, após um concerto da fadista Carminho - as árvores tombavam na rua e havia que proteger a multidão do Leslie, ele que começou há 20 dias e “é muito distinto das tempestades tropicais habituais no Atlântico norte”. Trata-se de explicações do investigador Ricardo Trigo na SIC Notícias, que trouxe de novo o léxico psíquico para uma noite de tempestade: “Há um sistema depressionário muito intenso na Península Ibérica que está puxar o Leslie para norte”. Depressionário como numa das canções de Carminho: “E quando o vento se agita / Agita-se o meu tormento / Quero esquecer-te, acredita / Mas cada vez há mais vento”.

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