Sociedade

O papel não desaparece, mas o futuro do dinheiro é digital

Jamie Dimon, CEO do JP Morgan Chase
Jamie Dimon, CEO do JP Morgan Chase
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O problema com as moedas virtuais é exatamente a falta de sistemas de regulação que sejam oficialmente reconhecidos pelos mercados e, assim, lhe confiram a legalidade exigida por todos os atores do sistema

O valor da Bitcoin atingiu esta semana os 6000 dólares, pouco mais de 5000 euros. A criptomoeda mais popular da Internet (há mais moedas virtuais, como a Ethereum e a Ripple, por exemplo) é usada para várias finalidades. No lado negro da Web serve para comprar armas e droga. Na vertente banhada pela luz da legalidade, a Bitcoin já é aceite como moeda por dezenas de empresas. Desde a Microsoft à Bloomberg, passando pela Remax, em Londres - pode ver uma lista atualizada AQUI.

Este valor, os tais 6000 dólares, terá sido muito bem recebido pela família holandesa Taihuttu, que vendeu tudo o que tinha para investir na moeda virtual. Os Taihuttu despacharam a casa, os três carros e a moto; a CNBC diz que até “venderam os sapatos”. Ficaram sem nada, ou quase nada, e foram viver para um parque de campismo à espera da valorização da Bitcoin.

O mesmo terão feito milhares de pessoas e empresas espalhadas pelo planeta. Todos sabem que o número de Bitcoins é finito. Por isso, à medida que o tempo for avançando e a moeda for escasseando, a tendência será para que o seu valor aumente – um princípio básico da Economia. Já existirão entre 2,9 e 5,9 milhões de utilizadores ativos de carteiras com criptomoedas (o que inclui todas as moedas virtuais disponíveis). Quer isto dizer que há muita gente a confiar num sistema que não tem autor conhecido e que é regulado, apenas, pela tecnologia que encerra.

Explicando: a Bitcoin foi criada em 2008 por um programador (ou grupo de programadores) conhecido pelo pseudónimo Satoshi Nakamoto. Cada moeda é, basicamente, um código de zeros e uns que está protegido por uma chave pessoal. E é a tecnologia que a “fecha” que fez desta uma moeda única: cada Bitcoin só pode ser usada uma única vez numa transação pelo mesmo utilizador. Este sistema de verificação foi totalmente inovador e dá pelo nome de Blockchain. Esta tecnologia é, realmente, o melhor que a Bitcoin trouxe ao mercado. A sua capacidade de garantir a integridade de uma informação que passe pela Rede é tão resiliente que a tecnologia está a ser usada nas mais variadas atividades, até pela banca, que vê na Blockchain uma forma de garantir transações seguras.

Aqui é necessário relembrar que a Bitcoin está fora de qualquer sistema monetário oficial. Daí, não ser supervisionado pelo sistema bancário convencional.

O CEO da JP Morgan já VEIO DIZER que a Bitcoin é uma fraude e que a moeda vai entrar em colapso, mas que continua a ser uma boa unidade monetária para “assassinos e traficantes de droga”. Jamie Dimon compara a criptomoeda à febre dos bolbos de túlipas que assolou a Holanda no século XVII e que levou a uma especulação no preço da planta. A especulação, como todas as especulações, não acabou bem, levando muitos investidores à falência e à degradação dos próprios bolbos.

O problema com as moedas virtuais é exatamente a falta de sistemas de regulação que sejam oficialmente reconhecidos pelos mercados e, assim, lhe confiram a legalidade exigida por todos os atores do sistema. Aliás, a China já decretou uma proibição de todas as transações feitas com recurso a moedas virtuais. Atenção, a recusa chinesa refere-se às atuais criptomoedas.

O recurso à já referida tecnologia Blockchain abre portas à criação de uma moeda virtual (ou várias) que possa funcionar dentro do sistema bancário atualmente em vigência. Essencialmente, é importante a criação de processos que acabem com o anonimato das transações características de moedas como a Bitcoin. Aliás, várias empresas já vieram a público declarar o potencial da tecnologia Blockchain, que tem, além do fator “segurança” já referido, a capacidade de aumentar a velocidade a que se efetuam as transações comerciais. Basta ler o que o CEO do Citigroup DISSE À BLOOMBERG.

Quer isto dizer que o “mercado” já percebeu que o futuro do dinheiro inclui as moedas virtuais. No entanto, a Bitcoin parece estar fora desse cenário.

Reforçando o paradoxo: hoje há milhões de pessoas a investir numa moeda criada de forma anónima, que não tem supervisão reconhecida e cujas transações são feitas sem qualquer identificação dos autores. O único facto de autenticidade é fornecido pela tecnologia, que certifica que vão ser emitidas um total de 21 milhões de Bitcoins. Ou seja, lá para 2140 já não vão existir novas moedas deste tipo e a escassez será uma realidade. Mas faltam mais de 100 anos! Neste período de tempo tudo pode mudar. Que garantias tem a tal família holandesa que esta moeda vai sobreviver durante todo este tempo? Muito poucas.

O melhor é aproveitarem esta alta de mercado, vender as Bitcoins e regressar ao conforto de casa. É que os invernos na Holanda são, por regra, muito rigorosos. E não é preciso esperar 100 anos para o saber. É um facto científico.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: poliveira@impresa.pt

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