CAMBRIDGE – BONA – NOVA IORQUE
A vertigem da guerra brilha mais nos filmes, onde somos poupados ao cheiro da carne humana apodrecida. Já a poesia pode ter muito maior capacidade de transporte. Como mostrou Fernando Pessoa, ao fazer versos sobre “o menino da sua mãe”, que para sempre jaz e apodrece no campo de batalha de um certo poema. No caso, tratava-se da I Guerra Mundial. Mas aqueles versos de Pessoa podem ser lidos à luz de qualquer guerra e de qualquer perda profunda, sobretudo se associada à recorrente estupidez humana. Quando acabou em França a primeira batalha do Marne, ficou claro que as forças alemãs não poderiam contar com uma vitória rápida. No início, tinham conseguido avançar nos mapas, até ficarem a apenas 48 quilómetros de Paris. Mas faltaria muita gente morta, desfigurada, amputada ou gazeada, antes que tudo resultasse numa derrota humilhante para a Alemanha. Contando com todo aquele xadrez humano, terão morrido mais de 8 milhões de combatentes e 13 milhões de civis. Mas, naquele final de setembro de 1914, a I Guerra Mundial começara apenas dois meses antes. E o pintor alemão August Macke morreu em combate em território francês, numa fase em que a dinâmica inicial da guerra começava já a estagnar-se em trincheiras, num jogo de avanços e recuos. Até ao final da guerra, as notícias de carne para canhão foram chegando a famílias de vários países. August Macke morreu aos 27 anos, quando liderava o grupo expressionista Der Blaue Reiter. E deixou uma obra que faz parte agora das coleções de museus internacionais importantes.
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