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A beleza e a crueldade podem ocupar duas páginas, ou trinta

Silvina Ocampo nasceu em Buenos Aires, em 1903, no virar de um século que transformaria a literatura argentina e latino-americana
Silvina Ocampo nasceu em Buenos Aires, em 1903, no virar de um século que transformaria a literatura argentina e latino-americana

“As Convidadas” é mais um livro que confirma o tom inquietante dos contos de Silvina Ocampo, a argentina que foi mulher de Adolfo Bioy Casares e amiga de Jorge Luís Borges

Autora, com Adolfo Bioy Casares, seu marido, e Jorge Luis Borges, seu amigo, de uma célebre “Antologia da Literatura Fantástica”, Silvina Ocampo cultivou de modo muito singular essa dimensão. Em Silvina, o fantástico continua fantástico, quer dizer, não se atenua em alegorias políticas ou em alusões privadas; o que é estranho e inquietante mantém-se estranho e inquietante, sejam desaparecimentos enigmáticos, actos gratuitos de violência ou a metamorfose dos humanos em animais.

Tal como nos volumes anteriormente traduzidos (“A Fúria”, 1959, “Dias da Noite”, 1970), “As Convidadas” (1961), que reúne 44 histórias, umas com duas páginas, outras com trinta, tem um método que sofre pouquíssimas variações. Há conceitos fortes: uma cruzada de crianças que libertam um zoo sem pensar nas consequências, uma mulher que sonha com o incêndio que acontece no dia seguinte, um empregado de mesa que continua a trabalhar no restaurante mesmo depois de ter morrido, um médico que propaga doenças, um marido que se interessa mais por canários do que pela esposa, uma menina que gosta de bonecas porque quer ter para sempre a idade e o tamanho das bonecas. Há imagens brutais ou expressionistas: cães mortos à pedrada, fotografias onde do nada se materializam divas do cinema mudo, querelas conjugais numa espécie de “Titanic”, jardins que cuidam de si mesmos, visões à William Blake, mulheres mortas usadas como fertilizante. E há ideias, mais do que teses: a ferocidade solitária das crianças, a semelhança entre as criaturas, a facilidade com que o amor se torna abominável.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: pedromexia@gmail.com

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