Daqui a 10 ou 20 anos, se alguém se lembrar de revisitar o filme das eleições antecipadas mais estrambólicas do pós-25 de Abril (caiu uma maioria absoluta após uma investigação judicial a um primeiro-ministro, de que nada se soube até ao dia do voto), encontrará um dado muito chamativo: um senhor chamado Cavaco Silva que aos 84 anos e já pós-reformado de uma carreira inigualável, com duas décadas acumuladas de poder executivo e presidencial, resolveu colar-se ao elenco da peça estrambólica disposto a sucessivas entradas em palco. E a razão para o ter feito é simples. O seu partido de sempre e um dos partidos-chave do regime democrático, o PSD, histórico agregador do centro-direita, foi atingido pelo anticiclone das direitas radicais e 2024 ficará para a História como o ano em que o Portugal político tremeu. De bipolar, o sistema cheirou o risco da tripolaridade. Uma doença que não augura nem melhor diagnóstico, nem melhor terapia, nem vida mais funcional. Cavaco foi uma espécie de último moicano em defesa do seu povo (há outro neste enredo, chama-se Luís Montenegro). Porque percebeu que há algo de trágico no voto do próximo domingo.
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