“É preciso quebrar os mitos sobre o interior”

Interior: com o litoral a atrair 90% dos turistas, a anunciada Agenda do Turismo para o Interior é uma gota de água nas necessidades destes “territórios ostracizados”
Interior: com o litoral a atrair 90% dos turistas, a anunciada Agenda do Turismo para o Interior é uma gota de água nas necessidades destes “territórios ostracizados”
Jornalista
O ano de 2022 foi o melhor de sempre para o turismo nacional. Os primeiros meses de 2023 indicam que o crescimento se mantém. Mas, contas feitas, apesar de os proveitos terem quase duplicado para €451 milhões, o interior de Portugal continua longe dos holofotes: 90% da procura turística concentra-se no litoral, que absorve 95% dos visitantes internacionais. Para tentar atenuar este fosso, o Governo anunciou um pacote de investimento, em várias áreas, de €200 milhões, que integram a Agenda do Turismo para o Interior e uma nova campanha de promoção nos mercados nacional e internacional, subordinada ao mote “Viaja pelo teu interior”.
Território cristalizado
No terreno, os principais atores do sector turístico garantem que o dinheiro está longe de ser a solução. “É preciso acabar com o estigma de falar sobre o interior como se de outro país se tratasse”, alerta Elsa Marçal, diretora-geral do Hotel Convento da Sertã, secundada por Pedro Machado, presidente do Turismo Centro de Portugal: “O mais importante é quebrar os mitos como a distância, o isolamento, a baixa qualidade cultural e territórios ostracizados.” Para esta “mudança de paradigma”, o responsável aponta as novas gerações como os melhores aliados, por estarem “mais em linha com os destinos do interior, cuja oferta se baseia na sustentabilidade ambiental e diminuição da pegada carbónica”.
Tirar partido do potencial turístico do interior depende de outro fator fundamental: fixar pessoas. Caso contrário, “teremos um território cristalizado, pouco atrativo e muito exposto a ameaças reais, como o despovoamento e os incêndios florestais”, diz Elsa Marçal, que apela ainda ao envolvimento das câmaras municipais, dos empresários, da população e das agências de turismo neste esforço. Para fixar população, atrair novos residentes e renovar os perfis demográficos, Dalila Dias, diretora-executiva das Aldeias Históricas de Portugal, aponta como prioridades a “garantia de serviços de saúde de qualidade, mais mobilidade e acessibilidades”, destacando também o acesso à habitação: “Está tão cara nestas aldeias que o preço por metro quadrado já supera os €1000, e isso acaba por afastar quem estava interessado em mudar-se para o interior.”
Neste contexto, a implementação de “uma discriminação positiva no âmbito das questões fiscais” a par da “estimulação da captação de investimento e novos modelos de negócio” são determinantes para a inversão da situação, garante Pedro Machado. Já João Leitão, presidente da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Regional, remete para a criação de emprego qualificado mediante indústria “mais sofisticada”, como a produção de medicamentos alternativos, “feitos a partir de plantas aromáticas e ervas medicinais, para os sectores cosmético e farmacêutico, a par da indústria agroalimentar e da produção de energia verde alternativa”.
Em paralelo à fixação de pessoas, essencial para gerir a oferta dos territórios do interior, do património histórico à Natureza, passando pelas culturas autóctones, a autenticidade e a genuinidade da gastronomia e novos negócios associados às experiências de lazer, a promoção é outra vertente fundamental na captação de turistas.
Fatores de atração
“A sustentabilidade e a inovação a par da cultura, da identidade e do sentimento de pertença” devem ser os principais eixos, considera Dalila Dias, a que Elsa Marçal acrescenta “o produto ‘Natureza’, disponível ao longo de todo o ano e que pode ser a chave para combater a sazonalidade”. Reconhecendo que o turismo interno “é injustamente desvalorizado por muitos”, Pedro Machado enaltece as condições destes territórios, que designa como “o verdadeiro luxo do século XXI, onde se podem gozar férias com tempo, espaço e qualidade”, ao contrário das regiões do litoral.
Fatores importantes de atração, na ótica de Alfredo Vasconcelos, promotor do Boom Festival, em Idanha-a-Nova, são as ligações ao biológico, à Natureza e à História. É de fora do país que chegam 85% dos participantes no festival, trazendo para a região mais de 40 mil pessoas, a cada dois anos, para um evento feito “inteiramente com dinheiro próprio”.
João Leitão sugere ainda mais ambição na promoção dos territórios do interior, com a “calendarização de eventos desportivos nacionais, internacionais e de eventos ligados à investigação e ao desenvolvimento”, para abrir estas regiões ao mundo e assim “atrair mais investimento”.
O Prémio Nacional de Turismo (PNT) distingue empresas, projetos públicos e personalidades. Para 2023 uma novidade: o Prémio Personalidade, que substitui o Prémio Carreira. As candidaturas decorrem até 31 de maio.
Turismo Autêntico Destacar projetos que valorizam os recursos endógenos, descentralizam e mitigam a sazonalidade.
Turismo Gastronómico Premiar projetos que apostam na valorização de produtos endógenos, promovendo a gastronomia local e regional.
Turismo Inclusivo Eleger projetos que fomentam a confiança e empatia do consumidor, fidelização, inclusão e obtenção de feedback por parte do utilizador.
Turismo Inovador Premiar projetos que desenvolvam inovação a nível da oferta turística e do modelo de negócio, utilizem o digital para comunicar, distribuir e vender; promovam parcerias de cross-selling e utilizem business intelligence para a promoção do alcance e eficiência do negócio.
Turismo Sustentável Distinguir projetos que promovam o uso eficiente dos recursos, incentivam um turismo responsável e implementam medidas e práticas que visem a redução e compensação da pegada ecológica.
Candidaturas: até 31 maio
Avaliação: 1 junho a 31 de julho
Reunião de comités e júri: setembro e outubro
Entrega de prémios: novembro
Para se habilitar a vencer o PNT apresente a sua candidatura até 31 de maio. Saiba mais AQUI.
PRÉMIO NACIONAL DE TURISMO
O Expresso e o BPI, em parceria com o Turismo de Portugal e a Deloitte, promovem pelo quarto ano consecutivo o Prémio Nacional de Turismo (PNT), uma iniciativa para promover, incentivar e distinguir as melhores empresas, práticas e projetos do sector.
Textos originalmente publicados no Expresso de 19 de maio de 2023
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