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Marcelo veta decreto de privatização da TAP, Presidente quer mais "transparência"

Marcelo veta decreto de privatização da TAP, Presidente quer mais "transparência"
TIAGO MIRANDA

Presidente da República devolveu o diploma ao Governo para que sejam clarificadas três dúvidas. Marcelo não quer que o decreto aprovado pelo Governo, que enquadra a privatização da empresa, seja mais ‘branco’ do que o caderno de encargos. Costa já respondeu que “preocupações do Presidente serão devidamente ponderadas”

Marcelo veta decreto de privatização da TAP, Presidente quer mais "transparência"

Eunice Lourenço

Editora de Política

Marcelo veta decreto de privatização da TAP, Presidente quer mais "transparência"

Rita Dinis

Jornalista

Marcelo veta decreto de privatização da TAP, Presidente quer mais "transparência"

Vítor Matos

Jornalista

O Presidente da República vetou o decreto do Governo com as regras para a privatização da TAP. Na mensagem em que devolve o diploma ao executivo, Marcelo pede para que sejam esclarecidas três dúvidas. “O Presidente da República decidiu devolver ao Governo o diploma de privatização da TAP, solicitando a clarificação de três aspetos que considera essenciais: a capacidade de acompanhamento e intervenção do Estado numa empresa estratégica como a TAP; a questão da alienação ou aquisição de ativos ainda antes da privatização; a transparência de toda a operação”, lê-se na nota divulgada no site da Presidência.

O primeiro-ministro já reagiu ao veto, prometendo uma resposta ponderada. Numa muito curta nota enviada às redações, Costa diz que “regista as preocupações” do Presidente da República e garante que que serão “devidamente ponderadas”.

Na carta dirigida ao primeiro-ministro, Marcelo Rebelo de Sousa começa por dizer que “deve ser assegurada a máxima transparência em todo o processo que levará a uma decisão de venda do controlo da empresa”. Sobretudo sendo esta uma empresa que tem um “valor estratégico fundamental” para Portugal, e que não só teve uma injeção “avultada” de capital dos contribuintes para a salvar na sequência pandemia da Covid-19, como esteve debaixo dos holofotes mediáticos durante a comissão parlamentar de inquérito à gestão da TAP.

No entender do Presidente da República, contudo, esse dever de transparência não está assegurado. “O conteúdo do diploma, que é determinante porque constitui a única lei que condiciona as decisões administrativas subsequentes, suscitava múltiplas dúvidas e reticências à luz da desejada máxima transparência do processo". E é isso que Marcelo insta o Governo a esclarecer, considerando que as explicações dadas pelo Executivo às dúvidas do Presidente nos dias anteriores a este veto não são satisfatórias. “Foram solicitados esclarecimentos complementares ao Governo, mas, infelizmente, as respostas ontem [quinta-feira] recebidas não permitem clarificar três aspetos essenciais”, escreveu.

O primeiro aspeto tem a ver com o papel que o Estado terá se for privatizada a maioria do capital da TAP. Marcelo questiona qual será a efetiva capacidade de acompanhamento e intervenção do Estado numa empresa estratégica como a TAP sendo que o Governo já admite vender uma percentagem acima de 51%. Nesse caso, se o Estado perder a maioria do capital da empresa, fica sem poder de decisão sobre qualquer “decisão administrativa posterior” à venda. O segundo aspeto tem a ver com a alienação de vários tipos de ativos, sem “sem mínima precisão ou critério”, antes mesmo da decisão de venda.

E é no terceiro aspeto que reside o busílis da questão: Marcelo quer garantias de isenção no processo de venda da empresa, nomeadamente quer que seja tornado claro que todos os contactos anteriores à elaboração do caderno de encargos feitos pelo Governo com possíveis compradores não são negociações vinculativas, e quer que esses contactos fiquem registados. No seu entender, isso é fundamental para garantir a “prova da cabal isenção dos procedimentos”.

Marcelo não quer que o decreto aprovado pelo Governo, que enquadra a privatização da empresa e que tem força de lei, seja mais ‘branco’ do que o caderno de encargos que será aprovado posteriormente, e que não tem força de lei.

No dia em que Fernando Medina anunciou a privatização da TAP, a 28 de setembro, o Presidente da República já tinha feito referência a aspetos que constam da mensagem que acompanha o veto desta sexta-feira, nomeadamente no que respeita aos contactos com os eventuais concorrentes à privatização: “Haverá um caderno de encargos e os contactos anunciados pelo ministro das Finanças. E desses contactos nascerá o caderno de encargos, e o caderno, uma vez estabelecido, vai estabelecer as regras que irão até ao fim, ao termo da decisão”. Daí que Marcelo considerasse que tinha de “saber se as garantias essenciais para a salvaguarda do interesse nacional constam da lei ou do caderno de encargos”, pois “uma coisa é constar da lei, outra de um conjunto de regras administrativas”. Isto porque a lei, segundo explicou, tem mais força e perenidade no tempo do que o caderno de encargos.

No dia seguinte, em declarações aos jornalistas, Marcelo voltava a levantar estas questões dando a entender que, se o decreto-lei do Governo fosse demasiado vago, isso seria como passar um “cheque em branco” para o caderno de encargos. Ou seja, o Presidente da República queria uma legislação que lhe permitisse antecipar as regras da privatização. E perguntava: “Há referência a valores ou não no decreto-lei? Há referências a pagamentos ou prazos?”. E acrescentava mais uma dúvida que queria ver esclarecida: "Há referência a condições que salvaguardem e protejam o interesse nacional, sim ou não? Está na lei ou no caderno de encargos?”, insistia. Este viria a ser o primeiro ponto para justificar o veto: “Se uma lei não tiver nada sobre isso, é uma lei em branco, atira para o caderno de encargos. Se porventura tiver o básico do básico, o caderno tem de respeitar a lei, que tem mais força do que um documento administrativo”.

O veto do Presidente a um decreto do Governo pode ser ultrapassado de duas formas: o Governo altera e o Presidente aceita a nova versão, o Governo não altera e tem de levar o diploma ao Parlamento. Se a opção for levar ao Parlamento, o Presidente ainda pode voltar a vetar, mas com uma segunda aprovação por maioria absoluta tem de promulgar.

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