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"Não é altura de deitar o jogo abaixo": Marcelo afasta dissolução, mas mantém pressão sobre Galamba

"Não é altura de deitar o jogo abaixo": Marcelo afasta dissolução, mas mantém pressão sobre Galamba
JOSÉ COELHO/Lusa

“Se a responsabilidade política fosse assumida, o membro do Governo já não o era”. Presidente cola-se às sondagens, mantém pressão para que Costa remodele, afasta dissolução da AR e exige mais. Até 2024, “pelo menos 2 mil milhões do PRR devem estar efetivamente no terreno”

O Presidente da República admitiu esta sexta-feira que teve noção de que o povo não queria a dissolução do Parlamento e congratulou-se pela sintonia que conclui existir entre o que os portugueses dizem nas sondagens e a forma como ele próprio decidiu, há mais de um mês, gerir a crise política em torno do ministro das Infraestruturas.

“O que os inquéritos mostram é que os portugueses me acompanharam nas escolhas que fiz”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa na Régua, onde se encontra para as comemorações do 10 de junho. E explicou o que isso significa - “Os portugueses compreendem o que eu, em relação ao Governo, defendia que devia ter acontecido (demissão de João Galamba) e que continuo a defender. Mas não compreenderiam que isso implicasse dissolver o Parlamento e deitar abaixo o jogo nesta altura, parando o país durante quatro meses num momento tão difícil e num momento crucial para a aplicação dos fundos".

Sem desistir de pressionar a queda do ministro das Infraestruturas, o Presidente reafirmou que “há situações em que a responsabilidade política objetiva tem de ser assumida” e, disse, “no caso concreto não foi assumida”, porque, “se fosse, o membro do Governo já não era”.

"Eu quero ser muito sincero: acho que havia muitos comentadores que queriam que eu dissolvesse e eu tinha a noção de que o povo não queria que eu dissolvesse, queria que eu, realmente, chamasse a atenção do Governo para dizer aquilo que disse no dia 4 [de maio]: 'olhe que, às vezes, é preciso mudar o que não está bem antes que seja, depois, muito tarde'. Foi isso que eu quis dizer, foi uma prevenção", justificou.

Questionado se o Governo ainda está a tempo de emendar a mão, Marcelo abriu espaço a António Costa: "Em política é sempre possível, quem está nas oposições como no Governo, ir percebendo que há novos desafios, que há mudanças que é preciso fazer, umas vezes é de pessoas, outras vezes é de ideias, outras vezes é de projetos". “Eu sei que é difícil: eu tenho a idade que tenho, e sei que é mais difícil aos 74 anos mudar do que aos 64, 54, 44, 34. Agora, é esse desafio que se põe a todos os que servem os outros - servem o povo - é, em cada momento, ver: 'o que é que eu posso fazer todos os dias melhor do que tenho feito até agora?'".

Insistindo que as sondagens também confirmam a sua sintonia com o povo no que toca ao registo que o Chefe de Estado deve assumir (mais exigente), Marcelo Rebelo de Sousa reconheceu que “os portugueses também concordam que o Presidente deve ir acompanhando de forma vigilante” o estado do país, “olhando em cada momento para o que é mais importante”. E aqui apontou uma meta ao Governo no que toca ao PRR: até 2024 ter “pelo menos 2 mil milhões efetivamente no terreno”.

“Eu fui dos primeiros a chamar a atenção que 2023 e 2024 eram anos fundamentais”, afirmou, lembrando quw não basta receber os fundos de Bruxelas, é preciso fazaer com que cheguem ao terreno. “Sabemos que a nossa administração pública é complicada”, acrescentou, deixando ao Executivo - a quem lembrou que “a primeira metade de 2023 já foi” - um objetivo a cumprir: “que na segunda metade de 2023 e 2024, dos 6 mil milhões pelo menos 2 mil milhões cheguem efetivamente ao terreno”.

Exemplificando com uma área específica, o Presidente falou da ferrovia como um dos setores onde disse ser urgente passar “dos planos que têm 30 ou 40 anos” e avançar.

O chefe de Estado falava aos jornalistas no Peso da Régua, distrito de Vila Real, onde irão terminar, no sábado, as comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, e referia-se à declaração que fez no dia 4 de maio, depois de o primeiro-ministro ter rejeitado a demissão do ministro das Infraestruturas, João Galamba. Marcelo disse que, nessa ocasião, o povo considerou que não ser altura para "deitar o jogo abaixo", porque "poderia ter mais custos do que vantagens".

"Eu tinha a noção do que muitos comentadores achavam: 'é agora, é aproveitar agora, se não é agora, é daqui a 15 dias, ou daqui a três semanas e tal... Deite o jogo abaixo e começa-se de novo'. E, do outro lado, diziam o seguinte: 'não, não é só deitar o jogo abaixo'", salientou.

O Presidente da República recuou ao discurso que fez na tomada de posse do atual Governo, em março de 2022, para salientar que, na ocasião, tinha alertado que "uma maioria absoluta tem uma responsabilidade absoluta". "Por isso é mais difícil ter maioria absoluta do que não ter porque, quando não se tem maioria absoluta, há sempre várias justificações: porque o partido A não apoiou, porque o B não apoiou, porque o C não apoiou e tal... Se se tem maioria absoluta, não há essas justificações", sublinhou. Para o chefe de Estado, quando se tem maioria absoluta, "só há uma justificação para as coisas não acontecerem: é haver problemas naqueles que exercem o poder".

"Parece um presente [ter maioria absoluta], mas é um presente com muita responsabilidade. O povo, quando dá esse presente, diz 'bom, eu agora dou-te o poder todo para fazeres o que deves fazer. Mas faz! Porque, se não fizeres, eu vou ser mais exigente do que no tempo em que tu podias dizer, 'olha, eu não pude fazer porque não me deixaram fazer'", destacou.

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