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Oposição de acordo sobre mensagem de Costa: ignorou problemas e esqueceu país real

Oposição de acordo sobre mensagem de Costa: ignorou problemas e esqueceu país real

Da esquerda à direita, os partidos reagiram à mensagem de Natal do primeiro-ministro com acusações de ter esquecido setores como a saúde e a habitação

Oposição de acordo sobre mensagem de Costa: ignorou problemas e esqueceu país real

Eunice Lourenço

Editora de Política

“Há um ponto em que estamos completamente de acordo com ele: nós também confiamos nos portugueses”, começou por dizer Paulo Rangel, o vice-presidente do PSD a quem coube dar voz à reação do partido à mensagem de Natal do primeiro-ministro. Mas, continuou, "podemos ter esperança e confiança se houver uma mudança a 10 de março [de 2024]. A confiança que se pode restaurar dos portugueses nas instituições resulta diretamente, obviamente, da possibilidade de se mudar a governação socialista. Estes oito anos trouxeram-nos a uma situação de impasse", afirmou na sede do PSD no Porto.

"Como é que é possível fazer o elogio dos progressos que houve nas qualificações quando vemos a situação em que está o sistema educativo, a situação em que estão os nossos alunos sem professores, em que estão os professores sem qualquer incentivo, a situação, portanto, de impasse em que entrou a educação", referiu o dirigente social-democrata. A par da educação, o vice-presidente do PSD criticou também a referência de Costa às contas certas, considerando que "foram alcançadas com base na destruição, abandono e desistência sistemática dos serviços públicos".

Para Paulo Rangel, na mensagem de Natal do primeiro-ministro faltou "uma palavra" para os profissionais de saúde, mas também para os sem-abrigo e para os que se confrontam com a crise na habitação. "Sabemos que a pobreza e o risco de pobreza aumentaram especialmente neste último ano, ano e meio, em que o Governo socialista tinha maioria absoluta e era liderado por António Costa", o eurodeputado e vice-presidente do PSD.

Paulo Rangel foi o primeiro dirigente partidário a comentar António Costa, mas os restantes partidos coincidiram na análise. Da direita à esquerda, todos os dirigentes escolhidos para falar apontaram o que consideram ser um afastamento da realidade por parte do primeiro-ministro, que se demitiu a 7 de novembro e que fez a sua última mensagem de Natal nestas funções.

É um primeiro-ministro que consegue na sua última mensagem falhar os dois tópicos principais que era importante tratar e a olhar para o futuro: a crise das instituições e a confiança na justiça, que levou ao fim do seu Governo, e o profundíssimo sistema degradado em que a nossa saúde se encontra hoje”, criticou logo a seguir André Ventura, presidente do Chega.

Ventura acusou o primeiro-ministro demissionário de uma “profunda incapacidade de fazer um exercício de auto responsabilidade, um juízo crítico de auto responsabilização”. Na opinião do líder do Chega, “António Costa falhou em toda a linha ao não conseguir dar aos portugueses a tranquilidade que o país precisava numa noite de Natal”, acusando o PS e o primeiro-ministro de viverem “numa realidade paralela completamente diferente da maioria dos portugueses”.

“Esperemos que em março os portugueses saibam dar a resposta a quem não quer viver nem resolver os seus dramas e os dramas de Portugal”, disse Ventura, que falava na sede do partido, em Lisboa.

No entender de Rui Rocha, presidente da Iniciativa Liberal, esta foi “uma mensagem que encerra um capítulo”, sendo que agora o fundamental “é transmitir confiança e esperança num Portugal diferente”.

António Costa, na mensagem difundida esta noite, não falou do essencial, como as questões ligadas à crise na habitação, aos baixos rendimentos, a “uma classe média absolutamente asfixiada por rendimentos baixos e impostos altos”, à degradação das instituições e à degradação dos serviços públicos, como a saúde, educação, transportes e justiça, disse Rui Rocha. “Sobre estes pontos que são fundamentais para os portugueses não houve uma única palavra de António Costa, que se limitou a fazer um autoelogio, que é aquilo que tem feito sempre ao longo destes oito anos”, adiantou Rui Rocha à Lusa quando questionado sobre que leitura fazia da intervenção do primeiro-ministro.

Maioria absoluta foi “tempo intranquilo”

À esquerda, as soluções para os problemas podem ser diferentes, mas a avaliação da mensagem de Costa é muito semelhante, “Nesta última mensagem de Natal, o primeiro-ministro não fez nenhuma referência aos problemas que as pessoas enfrentam em Portugal, problemas que foram agravados com a maioria absoluta, apesar de ter tido todas as condições políticas e recursos extraordinários”, afirmou Marisa Matias, do Bloco, em declarações na sede do partido, em Coimbra.

Para a eurodeputada bloquista, a maioria absoluta “foi um tempo intranquilo”, não marcado apenas pelo “rodopio de ministros”, mas também por um “sobressalto permanente” na vida das pessoas, com a crise da habitação e os problemas sentidos no Serviço Nacional de Saúde. Sobre estes dois temas, Maria Matias disse que António Costa não fez qualquer referência.

“A habitação é um problema central neste momento em Portugal, o Serviço Nacional de Saúde precisa de ser salvo e precisa de haver investimento concreto para que aquela que é uma das principais conquistas da democracia em Portugal não colapse e para tudo isso é preciso que se olhe, que se apresente soluções concretas para esses problemas e não fugir a eles, ignorá-los, omiti-los”, salientou.

"O senhor primeiro-ministro faz uma declaração que não bate certo com a vida das pessoas. Fala das contas certas, mas não fala do desacerto das contas da vida das pessoas, do salário e da pensão que não chega para enfrentar o custo de vida, que aumentou significativamente nos últimos tempos", começou por dizer , aos jornalistas, no Porto, o dirigente comunista Jaime Toga.

Falando no centro de trabalho comunista na Avenida da Boavista, o membro da Comissão Política do Comité Central do PCP notou a falta dos mesmos temas apontada pelo Bloco, mas também pela direita - saúde e habitação - e frisou ainda que António Costa fala "das qualificações do povo português, mas não fala, por exemplo, dos problemas da escola pública, do facto de haver ainda dezenas de milhares de alunos que não têm professores a todas as disciplinas".

Jaime Toga salientou a "importância de não alimentar ilusões, porque não é a partir do PS, como está demonstrado nos últimos anos, que se encontrarão respostas para os problemas dos trabalhadores, das populações".

Se Marisa Matias falou da maioria absoluta como tempo “intranquilo”, Inês Sousa Real, do PAN, disse que “foi uma oportunidade perdida e desperdiçada”. E defendeu a importância de discutir soluções em fez de centrar a discussão nas coligações que será possível fazer. “É fundamental que, ao invés de perdermos tempo a discutir entre a esquerda e a direita, e qual vai ser a solução para o país, se uma coligação à esquerda ou à direita, que estivéssemos a discutir aquilo que é a visão e o projeto de país que queremos de facto para Portugal”, afirmou a deputada, que sublinhou a falta dos mesmos temas - saúde e habitação - que a maioria dos outros partido já tinha assinalado. .

“As palavras de António Costa esquecem o país real, porque as contas certas têm que ser contas certas em primeiro lugar com as famílias, e num país em que temos mais de 10 mil pessoas em situação de sem-abrigo e quatro milhões de pessoas a viver em situação de pobreza se não fossem os apoios sociais, existe claramente aqui um défice de um país em que António Costa não tem conseguido promover o desenvolvimento social”, considerou a dirigente.

PS defende legado e acusa oposição de “maledicência”

Em defesa e elogio do ainda primeiro-ministro só saiu o PS, com o secretário-geral adjunto do partido, João Torres, a prometer continuar “o legado” de oito anos de governo de António Costa e a qualificar de “maledicência” as reações da oposição.

Foi uma “mensagem de grande lucidez, mas também de grande esperança no futuro” e o que o PS “se propõe é continuar este trabalho, de continuar a desenvolver este legado” e “a trabalhar com base na estabilidade, na previsibilidade e na segurança que os portugueses exigem dos políticos”, disse João Torres, que é também vice-presidente da bancada socialista João Torres.

Minutos depois da mensagem de Natal do primeiro-ministro, o deputado disse que António Costa “entregará um país inquestionavelmente melhor do que aquele que encontrou no final de 2015”. E, em resposta à oposição, à esquerda e à direita, que criticou a mensagem de Costa por alegadamente descolar da realidade, João Torres afirmou: “ao longo do último ano e meio, [a oposição] está hoje especializada na maledicência".

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