Luís Montenegro: "Num dia onde os extremos erguem as suas bandeiras, nós somos o elemento de moderação"
MANUEL FERNANDO ARAUJO
No encontro nacional de autarcas, o primeiro-ministro respondeu às críticas dos partidos presentes na manifestação contra o racismo e xenofobia, colando-os aos extremos. Lado a lado com Marques Mendes, Montenegro disse que o candidato presidencial do PSD "está perto"
No dia em que Lisboa se dividiu entre ações a favor e contra a imigração, Luís Montenegro aproveitou o cenário para fixar o PSD ao centro e ganhar pontos entre o eleitorado mais moderado. "Num dia onde os extremos erguem cada um a sua bandeira em contraponto, em conflito aberto para o outro, nós somos o elemento aglutinador, de confluência, de moderação", disse no discurso de encerramento do 5.º Encontro Nacional de Autarcas Social-Democratas, que decorreu no Auditório do Centro de Artes de Ovar, no distrito de Aveiro, este sábado.
Antes, o primeiro-ministro já tinha vincado a importância de Portugal se manter entre os países mais seguros do mundo. "Temos a obrigação, não é uma questão de opção, mas de obrigação de garantir que continuaremos a ser um dos países mais seguros do mundo", disse num discurso a que Luís Marques Mendes, potencial candidato presidencial, assistiu na primeira fila.
O PSD e a Iniciativa Liberal foram os únicos partidos que não se fizeram representar em nenhuma das ações que decorreram este sábado. Ou seja, a direita ficou apenas representada pelo Chega que promoveu uma vigília de apoio à PSP, após o anúncio da manifestação Não Nos Encostem à Parede contra a megaoperação policial no Martim Moniz, em dezembro. Os restantes partidos (PS, BE, PCP, Livre e PAN) juntaram-se às milhares de pessoas que desceram da Alameda até ao Martim Moniz em solidariedade com os imigrantes visados e contra o racismo e a xenofobia.
Depois de várias críticas da oposição à "instrumentalização" da polícia e "aproveitamento político" do Governo durante o desfile, Luís Montenegro não resistiu em fazer um parênteses no tema das autárquicas para responder através de uma colagem destes partidos a posições extremistas. Depois, recentrou o discurso no tema que justificou a reunião social-democrata e que irá merecer a atenção dos partidos durante os próximos meses. O primeiro-ministro defendeu que o seu Governo tem privilegiado a "relação com as autarquias locais" em todas as "políticas públicas e na proposta de Orçamento do Estado" de forma a permitir uma "maior capacidade decisória sobretudo nos pontos onde têm experiência acumulada, recursos humanos, equipamentos e a capacidade de servir melhor as populações". "Não estamos a fazer nenhum favor às autarquias, estamos com responsabilidade e humildade a dizer que não tem a ver com partidos, mas estruturas. As freguesias e os municípios são parceiros do desenvolvimento do país, do Governo, que não estarão sempre de acordo, mas serão sempre ouvidos, integrados."
PSD "não vai ter candidaturas de amigos" nas autárquicas
"O PSD não quer, não vai ter, candidaturas de amigos. Vai ter candidaturas daqueles que estão em melhores condições de servir o interesse das respetivas populações", garantiu Luís Montenegro. O partido não irá "adulterar" a base programática do partido, contudo, o primeiro-ministro admitiu que esta será "adaptada, em cada município, em cada freguesia, à realidade local, às potencialidades e às capacidades de cada comunidade". "Estaremos sempre do lado das melhores ideias, das melhores soluções, dos melhores candidatos, das melhores equipas, privilegiando a qualidade e a competência", vincou.
Porém, assegurou que o PSD não fechará a porta "àqueles que não são do PSD" e abrirá as candidaturas "aos melhores e aos mais dinâmicos". Isto também num estímulo a possíveis candidatos independentes que possam contribuir para vitórias do PSD a nível local.
Assim, Luís Montenegro pediu aos autarcas social-democratas, "agora que está a chegar o momento decisivo da escolha dos candidatos, da formação das equipas, da decisão do projeto, que não deixem de ter em linha de conta, sempre, em primeiro lugar, o interesse das populações, o interesse coletivo".
Presidenciais: Montenegro diz que candidato do PSD "está perto", Marques Mendes treina discurso presidencial
Apesar de não ser autarca, Luís Marques Mendes foi um dos convidados de honra do 5.º Encontro Nacional de Autarcas Social-democratas a até teve direito a discurso antes de Luís Montenegro — e após nomes como Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, e Pedro Alves, coordenador autárquico do PSD. Desde o início, o social-democrata deixou claro que não iria falar sobre a sua potencial candidatura à Presidência da República. No entanto, Luís Montenegro deu mais um passo no sentido de assumir que Marques Mendes será o candidato apoiado pelo PSD. "Não é assunto para nos preocupar. Não é assunto para provocar, aqui, nenhuma intranquilidade. Sabemos que a solução está perto", disse provocando risos na plateia que antes tinha recebido o comentador da SIC com uma ovação de pé.
Luís Montenegro e Luís Marques Mendes dão um abraço no Encontro Nacional de Autarcas do PSD
MANUEL FERNANDO ARAUJO
Apesar da reação da plateia, o líder do PSD prosseguiu, garantindo que a candidatura apoiada pelo PSD "será uma boa solução, vai mobilizar o país e vai dar ao país aquilo que o país precisa, que é ter, na Presidência da República, alguém que modere os poderes soberanos, que garanta a relação da política com a sociedade e não nenhum projeto pessoal ou político-partidário".
Da parte de Marques Mendes, a estratégia foi adotar um discurso típico de um Presidente da República focado numa análise do país e das suas necessidades futuras face ao cenário internacional. Talvez de olho na prestação de Marcelo Rebelo de Sousa, o social-democrata lembrou a necessidade de resolver as questões da pobreza e dos sem-abrigo, uma das populações mais mencionadas pelo atual Presidente da República nos seus discursos oficiais. “Precisamos de potenciar, consolidar, desenvolver aquilo que temos de estabilidade, credibilidade e atratividade, para resolver as questões da pobreza envergonhada, dos sem-abrigo, da pobreza em geral, sobretudo da habitação que é dos maiores dramas da sociedade portuguesa”.
Já numa lógica de disputa eleitoral, Marques Mendes pareceu ter respondido ao almirante Gouveia e Melo, o seu potencial maior adversário, sobre os gastos na defesa. "Alguns cá dentro e lá fora começam a alimentar a ideia de que mais verbas para a segurança, para a defesa e para as forças armadas deve ser feito à custa do estado social. Pois eu penso exatamente o contrário por uma questão de equilíbrio, de prioridades e de sensibilidade social", atirou. No dia anterior, o almirante Gouveia e Melo tinha defendido o investimento na defesa mesmo que isso afetasse as despesas do estado social. “O que interessa termos despesas sociais se não tivermos país? Ou se tivermos de obedecer a uma autoridade exterior, ainda por cima ditatorial?”, respondeu no "Expresso da Manhã" no festival PodFest, do Expresso.
O social-democrata realçou ainda que face aos desafios que a Europa enfrenta atualmente, Portugal vive “um tempo de exceção”, sendo, ao contrário de muitos países europeus, um país com estabilidade, para além de ser “altamente credível” e beneficiar de uma tendência de atratividade. “Olhando para o estado da Europa e do mundo, é importante valorizar isto que temos. Porque isto não é tanto importante do ponto de vista do político A ou B, isto é importante do ponto de vista das pessoas. Quando há estabilidade, credibilidade, atratividade para investimento, a vida das pessoas tende a melhorar. Quando não há estabilidade, credibilidade e atratividade, a vida das pessoas fica mais difícil”, disse numa intervenção que terminou com uma ovação.