Choveram críticas, de comentadores, da oposição e até dentro do PSD, à forma como o primeiro-ministro resolveu apresentar ao país medidas e objetivos para a área da Segurança Interna. O Governo defende-se com o argumento de querer tranquilizar populações e “dar um sinal de reconhecimento” às forças de segurança
O anúncio de que um primeiro-ministro vai falar ao país às oito da noite tem o efeito imediato de agitar redações e concentrar todas as atenções mediáticas: é o horário habitual de comunicações solenes, escolhido normalmente apenas em momentos cruciais. Luís Montenegro sabe disso, como todos sabem, mas ainda assim foi o que fez esta quarta-feira, para falar sobre Segurança, embora o seu gabinete tenha feito saber entretanto que não havia qualquer crise iminente e que o tema seria esse, após uma reunião com as ministras da área e as forças policiais. O secretário-geral do PS acusou-o ainda antes de falar de estar a querer “disputar o discurso securitário com o Chega”.
Até no PSD há vozes críticas da intervenção de Montenegro. A primeira foi quase imediata: Miguel Morgado, ex-deputado e conselheiro de Passos Coelho, que manifestou "surpresa e perplexidade" sobre a forma da comunicação do primeiro-ministro. No seu espaço de comentário na SIC Notícias, Morgado criticou a forma, mais do que o conteúdo. "Não me interessa se não tinha outra hora na agenda. Para todos os efeitos é a hora nobre a que o primeiro-ministro fala ao país", disse e acrescentou que há um problema com a ministra da Administração Interna: "Se o primeiro-ministro não tem confiança nas competências comunicacionais da ministra da Administração Interna, nem ninguém tem, então há um problema de competência porque a competência comunicacional faz parte do que é necessário para ser ministro."
Outras vozes preferem ficar apenas em off, mesmo entre os que defendem a importância da mensagem, para dentro e para fora, como forma de tranquilizar a população: “Até podia ser uma forma de dar palco às duas ministras da tutela (Administração Interna e Justiça)”, dizem ao Expresso , sendo que Margarida Blasco tem estado debaixo de críticas: “É um erro ser um primeiro-ministro a tratar este tema e desta forma; agora tem de ser sempre ele a falar sobre Segurança”, afirma uma fonte partidária. Ao que um antigo dirigente acrescenta que é mais um exemplo de que só o Luís Montenegro tem força política neste executivo: “Percebe-se que só o PM é que marca golos.”
O líder do Executivo, questionado logo na conferência de imprensa pelos jornalistas, desvalorizou: “O nosso foco não é trabalhar para as oposições, é trabalhar para as pessoas”, rejeitando igualmente a ideia de que a hora escolhida para a comunicação pudesse alimentar a perceção de insegurança, ao contrário do que seria o objetivo do Governo. Ao Expresso, fonte de São Bento insiste na tese, alegando que a reunião foi marcada “para a única hora possível” e que foi apenas anunciado que o Primeiro-ministro “falaria no final”; não foi anunciada qualquer “declaração ao país”, defende o Governo.
O objetivo, diz a mesma fonte governamental, tem como contexto ”o que o PM anunciouno congresso (do PSD, em Braga, em outubro) sobre a criação de equipas multidisciplinares das forças de Segurança e o reforço de visibilidade de policiamento nas ruas”. A intenção pode ter sido essa, mas mesmo entre os sociais-democratas, as opiniões dividem-se: fontes mais ligadas ao tema da segurança reconhecem a importância de dar um sinal de reconhecimento para dentro e consideram que o anúncio de investimentos tem o efeito de “tirar discurso aos agitadores”. O mesmo diz fonte próxima de Luís Montenegro. "Passa para dentro e reflete-se depois em melhor trabalho. Melhor trabalho serve o interesse dos cidadãos”, insiste o Executivo.
A antiga ministra da Justiça do PSD, Paula Teixeira da Cruz, secunda a ideia, dizendo que não compreende as críticas ao chefe do Governo. “Luís Montenegro compreende bem o cidadão comum e as duas preocupações, e de facto a perceção de insegurança tem aumentado”, referiu em declarações à Antena 1.
"Então o primeiro-ministro não tem, como chefe de Governo, obrigação de dar a cara pelas forças e serviços de segurança?", questionou já Hugo Soares, o líder parlamentar do PSD que saiu em defesa de Montenegro depois das críticas da oposição feitas no Parlamento
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