Ética dos candidatos autárquicos é valorizada, mas o desempenho da câmara conta mais na hora de votar

Barómetro da Fundação Francisco Manuel dos Santos demonstra “imagem positiva” do poder local
Barómetro da Fundação Francisco Manuel dos Santos demonstra “imagem positiva” do poder local
Jornalista
A pouco mais de um mês das eleições autárquicas, pode ser mais relevante que nunca ficar a conhecer melhor a forma como o eleitorado toma decisões a nível local. É a isso que se propõe o novo Barómetro Poder Local da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), publicado na quinta-feira, quando questiona os inquiridos sobre os principais fatores que influenciam o seu sentido de voto. À cabeça está o desempenho que a Câmara Municipal tem tido e, logo a seguir, as características pessoais dos candidatos. Destas, é a ética que se destaca como o atributo mais valorizado pelo eleitorado — 27% valorizam “candidatos que se mostram intransigentes do ponto de vista ético, nunca contornando a lei ou os princípios quando procuram resolver problemas”, lê-se.
Estes dados podem parecer contraditórios com o sucesso de candidatos que já estiveram a braços com a justiça como Isaltino Morais, presidente da Câmara de Oeiras, condenado por crimes de fraude fiscal e branqueamento de capitais. “Ainda antes do perfil do candidato, as pessoas olham para o desempenho da Câmara. Se virem que independentemente de tudo o resto os resultados foram bons, é por aí que decidem o voto”, explica ao Expresso Nuno da Cruz, um dos responsáveis pelo barómetro e investigador na Governação, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP) da Universidade de Aveiro.
Só depois do comportamento ético é que surge a valorização da orientação ideológica (23,7%), o estilo de liderança (18,3%) ou a experiência profissional (10,6%) do candidato.
Também o impacto do contexto nacional na decisão nas autárquicas parece ser reduzido. O “estado do país” cai para terceiro nos fatores que influenciam o sentido de voto, o que vai ao encontro das diferenças muitas vezes registadas entre os resultados das autárquicas e das legislativas. “Não é impensável que o descontentamento nacional se possa fazer notar, mas não será o fator determinante. As pessoas têm preocupações diferentes nestas eleições”, confirma o investigador.
Os dados do barómetro confirmam também que as autárquicas são eleições altamente personalizadas, com a escolha do candidato a ter um impacto muito mais significativo no voto do que as medidas propostas para os municípios. “Os programas eleitorais são, de todas as coisas que perguntamos, o menos importante”, acrescentou.
A proximidade e o impacto direto das políticas na vida das pessoas explicam a imagem positiva que o eleitorado tem do poder local, que contrasta com a dos políticos ou os partidos. De acordo com o barómetro, 44% do eleitorado tem uma imagem “positiva” ou “muita positiva” do poder local e só 17% vê como “negativa” ou “muita negativa”. “Nos 50 anos da democracia local o sentimento da população é positivo”, congratula-se o investigador da Universidade de Aveiro. O saldo é ainda mais positivo quando se isolam os eleitores dos municípios não urbanos (o estudo utilizou a classificação do Eurostat, segundo a qual há 26 municípios urbanos em Portugal Continental e 252 não urbanos). Aí, os inquiridos “confiam mais no poder local do que na Assembleia da República, no Governo, no sistema judicial e nos partidos políticos”, explica Nuno da Cruz. O mesmo não acontece com os inquiridos dos municípios urbanos e a diferença explica-se pela proximidade que é “muito mais sentida” nos municípios com menor densidade populacional.
Embora os munícipes não urbanos confiem mais no poder local, acabam por valorizar mais as instâncias centrais e o inverso acontece nos municípios urbanos. “É o Governo central que decide sobre se é ou não construída uma barragem, se avança ou não um investimento. Enquanto nos municípios urbanos, as pessoas sofrem mais no dia a dia com assuntos da esfera municipal como o trânsito, a habitação, a segurança ou a higiene urbana.”
NÚMEROS
69%
dos inquiridos dizem que vão votar nas eleições autárquicas deste ano “com toda a certeza”. 22,3% afirmam que “em princípio” vão votar e apenas 2,6% têm a convicção de que não vão participar nas eleições de 12 de outubro
44%
dos inquiridos responderam ter uma imagem “positiva” ou “muito positiva” do poder local. O valor sobe nos municípios não urbanos e entre os eleitores mais velhos
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