Quantos governos minoritários chegaram ao fim? E quantas maiorias absolutas e blocos centrais houve? (perguntas para queijinho Limiano)
Esta é uma breve história sobre as geometrias variáveis dos nossos executivos em tempo de democracia
Esta é uma breve história sobre as geometrias variáveis dos nossos executivos em tempo de democracia
A maioria dos governos minoritários em Portugal, seis em oito, não cumpriu o seu mandato de quatro anos até ao fim.
Em democracia, apenas dois executivos sem maioria conseguiram estar no poder e ambos do PS – os executivos de António Guterres (1995-1999) e António Costa (2015-2019).
Em quase 50 anos de democracia, houve governos de geometria variável – maiorias absolutas de um só partido, em coligação, alianças PS/CDS, um Bloco Central PS/PSD.
E em matéria de viabilização de orçamentos, há para todos os gostos: até o PCP de Álvaro Cunhal chegou a abster-se num orçamento do PS de Mário Soares, em 1976. Para a história ficará também a "abstenção violenta" do PS, sob a liderança de António José Seguro, a um orçamento do Governo PSD/CDS.
Os primeiros anos de democracia, desde as eleições legislativas, em 1976, foram caracterizados por grande instabilidade governativa: nenhum dos governos conseguiu cumprir o seu mandato, apesar de cinco deles (PS/CDS, Aliança Democrática e Bloco Central – PS/PSD) terem governado com maioria no parlamento.
Dois anos depois da Revolução dos Cravos, em 1976, as primeiras legislativas em democracia ditaram a vitória, com 34,9% e 107 dos 250 deputados, ao PS liderado por Mário Soares, que foi primeiro-ministro. Em vez de quatro anos, o I Governo Constitucional durou metade e caiu com o chumbo de uma moção de confiança, em que pesaram os votos do PCP.
Mário Soares conseguiu ver aprovado o Orçamento do Estado de 1977 com a abstenção de partidos da oposição, o PPD de Sá Carneiro, o PCP de Álvaro Cunhal e o CDS de Diogo Freitas do Amaral. Votaram contra Acácio Barreiros, da UDP, mais tarde deputado do PS, e dois dissidentes dos socialistas – Aires Rodrigues e Carmelinda Pereira, que fundaram um partido já extinto, o POUS (Partido Operário de Unidade Socialista).
O II Governo Constitucional também não durou muito tempo, mas por divergências entre os dois partidos que formaram uma “aliança” pouco usual – o PS, à esquerda, e o CDS, à direita.
Com uma Constituição que permitia (ao contrário de hoje) governos de iniciativa presidencial, seguiram-se três executivos impulsionados por Ramalho Eanes, o coronel do 25 de Novembro eleito Presidente da República em 1976.
Em agosto de 1978, tomou posse o Governo chefiado por Nobre da Costa, mas durou pouco menos de quatro meses, por ter sido rejeitado, no parlamento, o seu programa.
Carlos Mota Pinto foi o primeiro-ministro do IV Governo, também de iniciativa presidencial, que durou menos de um ano e caiu devido ao Orçamento de 1979. Uma primeira versão foi chumbada devido à pretensão de pôr fim ao subsídio de Natal. Passou à segunda, mas como as Grandes Opções do Plano foram rejeitadas, Mota Pinto demitiu-se.
Seguiu-se um terceiro executivo que a ex-ministra dos Assuntos Sociais Maria de Lurdes Pintasilgo chefiou por 100 dias. Foi a primeira e única vez que uma mulher foi primeira-ministra em Portugal, em 1980.
Os anos seguintes foram de maioria absoluta de direita, com os executivos da Aliança Democrática (AD), saído das eleições de 1979, primeiro com Sá Carneiro (PSD) como primeiro-ministro e Freitas do Amaral (CDS) como vice-primeiro-ministro, depois com Pinto Balsemão (PSD), chefe do Governo até 1983.
Nesse ano, o país vai de novo a votos, ganha o PS de Mário Soares, que, sem maioria, opta por um acordo com o segundo maior partido, o PSD. Foi a única vez que os dois maiores partidos se entenderam para o Governo, um acordo que ficou para a história como Bloco Central.
Com a morte de Mota Pinto, o PSD elege um novo líder, Cavaco Silva, em 1985, que discorda do Bloco Central, rompe o acordo com o PS e abre caminho a um novo ciclo político de direita.
Nessas legislativas, o PSD teve 29,9% e, em minoria, o primeiro executivo de Cavaco teve que enfrentar um novo partido, o Partido Renovador Democrático (PRD), eanista, inspirado no Presidente da República, Ramalho Eanes, com 45 deputados e 17,9% dos votos.
O primeiro orçamento do executivo de Cavaco Silva foi aprovado graças à abstenção do PRD e do PS e ao voto favorável do CDS e o segundo já teve o voto contra da bancada socialista, beneficiando novamente da abstenção dos renovadores.
O apoio a Cavaco Silva deu lugar à censura. Em abril de 1987, o PRD apresentou uma moção de censura que uniu aquele partido e os partidos de esquerda. O motivo foi uma planeada visita de deputados à União Soviética, que incluía a Estónia, cuja anexação pela URSS não era reconhecida pelo Estado português.
A esquerda ainda tentou apresentar uma solução de governo, mas Mário Soares, Presidente da República, recusou e antecipou as eleições, ganhas pelo PSD, com 50,2%.
Foi preciso esperar 13 anos desde o 25 de Abril para ver um Governo cumprir quatro anos de mandato, que se transformaram em oito depois de o PSD voltar a ganhar com mais de 50,6% em 1991. E Cavaco Silva governou até 1996.
António Guterres, do PS, sucede a Cavaco Silva. Sem maioria absoluta, o executivo socialista negociou sucessivos orçamentos e completou o mandato, primeiro com o CDS, depois com os deputados do PSD dos Açores e da Madeira.
Em 1996, Marcelo Rebelo de Sousa é líder do PSD e deixou passar os orçamentos de 1997 a 1999, em nome do interesse nacional numa fase em que Portugal se preparava para aderir à moeda única.
Os portugueses vão de novo a votos e em 1999 as urnas deram um resultaram inédito: um empate 115-115 entre o PS e a oposição, de esquerda e direita.
António Guterres opta, então, por negociações à direita e o orçamento de 2000 passou com abstenção do CDS, que exigiu aumentos das pensões.
No ano seguinte, e com o PSD já liderado por Durão Barroso, os socialistas fizeram mais uma originalidade – o orçamento limiano.
O Governo negociou com um deputado, Daniel Campelo, do CDS, que chegou a fazer uma greve de fome no parlamento contra o encerramento de uma fábrica de queijo em Ponte de Lima. Campelo violou a disciplina de voto do seu partido e ajudou a aprovar o orçamento.
Guterres demitiu-se após um mau resultado do PS nas autárquicas, para “evitar o pântano” político, e seguiram-se, a partir de 2002, os governos de PSD/CDS com Durão Barroso, que saiu para ser presidente da Comissão Europeia, deixando o executivo a Pedro Santana Lopes que não cumpriu o mandato.
Pela primeira vez, em 2005, o PS, com José Sócrates, governa com maioria absoluta, mas perde-a quatro anos depois, ficando em minoria que ditou a sua queda, em 2011, já depois da crise que levou o país a pedir a intervenção da ‘troika’.
Mas antes, e em plena crise, o PSD, com Manuela Ferreira Leite na liderança, viabilizou, pela abstenção os orçamentos de Sócrates. O mesmo aconteceu com Pedro Passos Coelho em 2010, fruto de uma negociação direta entre o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, e um antigo ministro da pasta, Eduardo Catroga, pelo PSD.
Seguem-se quatro anos de maioria de direita PSD/CDS, com Pedro Passos Coelho, medidas de austeridade rigorosas, com cortes salariais. Em 2011, com Passos no Governo, o líder do PS, António José Seguro, viabilizou um orçamento com uma "abstenção violenta". Cumprida a legislatura, a coligação Portugal à Frente (PAF) venceu as eleições, mas a ficou sem maioria no parlamento.
Passos Coelho ainda formou governo, mas o PS, de António Costa, com um acordo parlamentar com o Bloco de Esquerda, PCP e PEV chumbam o programa de Governo e são os socialistas que formam o executivo minoritário. Apelidado de “geringonça”, durou quatro anos, de 2015 a 2019, quando o PS ganha as eleições, sem maioria.
O equilibro foi instável nesta segunda fase de “geringonça” sem papéis assinados e o chumbo do Orçamento de 2022 ditou as eleições antecipadas que deram uma maioria absoluta aos socialistas.
Uma maioria absoluta que durou pouco tempo. Em 07 de novembro, António Costa demitiu-se por o seu nome surgir associado a um processo judicial que investiga casos de alegada corrupção e tráfico de influências em negócios de lítio, hidrogénio verde e um centro de dados em Sines.
No período democrático, foram seis Governos em Portugal com maioria absoluta, quatro liderados pelo PSD, (dois com a Aliança Democrática liderada por Sá Carneiro, em 1979 e 1980, e dois com Cavaco Silva, em 1987 e 1991) e dois pelo PS (um com José Sócrates, em 2005, e outro com António Costa, em 2022).
Apenas Cavaco Silva e José Sócrates conseguiram concluir os seus mandatos
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