Política

Costa explica medidas da Habitação aos socialistas sem falar no arrendamento coercivo

Costa explica medidas da Habitação aos socialistas sem falar no arrendamento coercivo
JOSÉ COELHO

Luísa Salgueiro admite que nem todos os socialistas “perceberam o mérito das propostas” do Governo. Primeiro-ministro e ministra da Habitação foram a Matosinhos explicá-las e Costa elencou quase todas, deixando de fora a polémica medida do arrendamento coercivo. À porta, manifestação de professores exigiu ser ouvida pelo primeiro-ministro - que enviou o secretário-geral-adjunto no seu lugar

Costa explica medidas da Habitação aos socialistas sem falar no arrendamento coercivo

Rita Dinis

Jornalista

Depois de muitas críticas, da esquerda à direita, às medidas apresentadas pelo Governo para resolver o problema da Habitação, e à forma como foram apresentadas e colocadas em consulta pública, António Costa foi a um evento do PS para explicar aos próprios socialistas “o mérito e o alcance” das suas medidas. Foi Luísa Salgueiro, presidente da Associação Nacional de Municípios e da concelhia do PS de Matosinhos, que começou por admitir que, “possivelmente, nem todos tinham percebido”, daí a necessidade de primeiro-ministro e ministra da Habitação se desdobrarem em explicações.

Esta terça-feira à noite, António Costa resumiu a explicação a duas ou três ideias-chave, sem em nenhum momento referir a mais polémica das medidas, sobre o arrendamento compulsivo de casas devolutas, deixando antever que não a considera essencial a poderá cair.

A explicação, desta vez, ao contrário do que aconteceu no fim do Conselho de Ministros de dia 16, foi simples e condensada em 20 minutos: primeiro, Portugal tem apenas 2% de oferta pública de habitação, enquanto a média europeia está nos 5%. Logo, é preciso fazer aumentar esse número - e para isso está em marcha a construção de habitação com a chancela do PRR que, contudo, “demora muito tempo” a chegar ao fim, entre concursos e obras. Enquanto isso não acontece, disse Costa, o Estado “tem de trabalhar com os 98% de oferta privada de habitação” para que ninguém tenha casas a mais, desabitadas, e não as ponha no mercado. “Temos de ter soluções transitórias enquanto se constroem as soluções definitivas”, disse.

Nesse sentido, explicou o primeiro-ministro, o pacote legislativo centra-se em dois eixos: proteção das famílias que têm casas compradas ou arrendadas e estão com dificuldades em pagar; e aumentar o número de casas acessíveis para as famílias. No primeiro eixo, António Costa identificou as medidas mais “emblemáticas” para o apoio aos créditos à habitação: o apoio extraordinário na subida da taxa de juro para as famílias com rendimentos até ao 6º escalão e com crédito à habitação até 200 mil euros que estejam acima do teste de stress feito aquando da assinatura do contrato; a obrigatoriedade de os bancos oferecerem a possibilidade de taxa fixa e a isenção de mais-valias a quem vender casa para amortizar no crédito próprio ou dos filhos. Para quem tem casas arrendas, Costa elencou as restantes medidas, afirmando ter “consciência de que o mercado tem aumentado o valor das rendas e que, hoje, a taxa de esforço exigida à classe média é muito elevada”.

Nesse âmbito, além do apoio até 200 euros para famílias até ao 6º escalão que tenham uma taxa de esforço superior a 35%, e além do reforço da verba do Porta65 para os mais jovens não ficarem sem apoio “por falta de verba”, António Costa destacou ainda uma medida a que não tinha dado muito destaque em intervenções anteriores: o programa Porta65+, que visa apoiar as famílias que “tiveram quebra de rendimento, por causa de divórcios, doença ou situação de desemprego” de um ano para o outro e que não podem deixar de conseguir arrendar as suas casas.


“Portugal é dos países onde a oferta pública é mais baixa”

O segundo eixo, segundo Costa, é aumentar o número de casas acessíveis para as famílias. Admitindo que “Portugal é dos países da Europa onde a oferta pública de habitação é das mais baixas”, o primeiro-ministro e secretário-geral afirmou que uma grande fatia do PRR foi alocada à habitação para fazer aumentar aquele número, mas enquanto isso não acontece, é preciso encontrar formas transitórias de incentivar brutalmente os proprietários (privados) a pôr as casas no mercado de arrendamento, por um lado, e a pôr a preços acessíveis, por outro.

Nesse sentido, elencou algumas medidas que considera emblemáticas para agir nesse sentido:

1º Redução do IRS sobre rendimentos prediais para arrendamentos de longa duração, redução essa que pode ir de 28% para 5% se o contrato for de 20 anos, e que pode chegar aos 0% se o arrendamento for em regime de renda acessível;

2º Isenção fiscal a quem coloque as casas em regime de arrendamento acessível;

3º Isenção de IRS sobre rendimentos prediais a quem passar o Alojamento Local para o arrendamento tradicional;

4º “Quem tem casas vazias e não as coloca no mercado por receio de que o inquilino estrague ou deixe de pagar, propomos que sejamos nós, o Estado, ou o município financiado pelo Estado, a arrendar as casas para subarrendar em regime de renda acessível. Nós suportamos a diferença”, disse Costa, pondo o enfoque na proteção dos senhorios e referindo ainda que, em último nível, quem não quiser arrendar nem aos inquilinos nem ao Estado, pode ainda vender a casa ao Estado com isenção fiscal.

António Costa não referiu em nenhum momento a polémica medida do arrendamento coerciso de casas devolutas que originou as maiores críticas da oposição, por introduzir o caráter obrigatório do arrendamento de casas devolutas, o que poderá ser sinal de que a medida pode não seguir caminho. Em todo o caso, e perante uma plateia de socialistas em Matosinhos, o secretário-geral e primeiro-ministro voltou a dizer que o desenho final das propostas ainda pode sofrer alterações até ao dia 16 de março, altura em que os apoios às famílias serão aprovados em Conselho de Ministros e as propostas legislativas seguirão para a Assembleia da República.

São estes os dois grandes objetivos e as medidas fundamentais. O programa está em debate público e estamos aqui para o debater, e responder às questoes e dúvidas que tenham. Vamos tomar nota das críticas e das propostas que tenham a fazer, de forma a que possamos aprovar um programa que funcione efetivamente para cumprir estes objetivos”, disse a terminar a intervenção.

Professores à porta

Lá fora tinham deixado para trás uma manifestação de professores. Segundo agência Lusa, mais de 50 professores do distrito do Porto concentraram-se em frente ao Teatro Municipal Constantino Nery, onde o primeiro-ministro, António Costa, participa num debate sobre habitação, e exigem "ser ouvidos".

"O Governo já disse que nos ouve, só que de ouvir a ir para a mesa de negociações, negociar, vai uma grande diferença", salientou Vladimiro Campos, professor há 22 anos, atualmente colocado no agrupamento de Escolas do Cerco do Porto.

No local, o secretário-geral adjunto do PS, João Torres, tentou, em representação do partido, acalmar os docentes.




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