Política

Jerónimo "virado de frente para o vento duro e forte", despede-se sem afeto, mas deixa programa completo

Jerónimo "virado de frente para o vento duro e forte", despede-se sem afeto, mas deixa programa completo
Ana Baiao

O último discurso de Jerónimo de Sousa enquanto secretário geral do PCP foi totalmente programático e indicador do caminho futuro. Sem dar lugar a fugas do alinhamento do texto previamente distribuído, durante 40 minutos não deixou uma palavra de expressão de sentimento. A sala aplaudiu de pé o homem, que promete estar “sempre virado de frente para o vento”, mesmo quando ele sopra “duro e forte” e “nos fustiga o rosto”

Um longo discurso, antecedido por uma longa salva de palmas e encerrado por outra ainda maior, marcou a última intervenção oficial do secretário geral do PCP. No Pavilhão do Alto dos Moinhos, em Corroios, os comunistas despediram-se sem sentimentalismo de Jerónimo de Sousa, o homem que há 18 anos está ao comando dos destinos do partido. E o líder fez questão de fazer o mesmo, dedicando o seu último discurso a repetir as linhas programáticas da Conferência Nacional, marcada para este fim de semana pelo PCP e traçando o rumo a seguir nos próximos tempos. “Sabemos que o caminho é duro”, disse Jerónimo. Mas nem ele, nem o partido, são de desistir. “A confiança nunca nos faltou”.

Os tempos não correm de feição e, à maioria absoluta do PS, "acrescentam-se novos problemas" diz o ainda líder. Há uma "nova situação de expressão institucional e ampla promoção das forças e projetos reacionários", diz Jerónimo, que refere expressamente o PSD, CDS, IL e Chega, como forças com "agendas de natureza retrógrada, demagógica, neoliberal ou fascizante", em vez da tradicional designação de "partidos de direita". Há ainda "a acrescida vulnerabilidade do país", com a guerra e o agravar da crise económica, a "intensificação da campanha antidemocrática, de forte pendor anticomunista" ou ainda "o crescente confronto com a Constituição, o com objetivo da sua revisão e subversão".

Contas feitas, Jerónimo de Sousa não tem dúvidas de que é "chegado o momento de subir o nível de confrontação de classe" e os apelos para que o partido se mobilize para a vanguarda da luta, fazem o restante tempo do discurso. Nem uma palavra sobre a sua saída. Nem uma palavra sobre o seu sucessor, mas o secretário geral do PCP elencou todas as áreas em que o partido deve "tomar a iniciativa" e o respetivo programa de ação para os anos mais próximos.

Numa clara intervenção programática, Jerónimo deixou os afetos de lado. Mas não os militantes, que 'aqueceram' as palavras do líder com uma receção efusiva de três minutos de palmas, de pé e o direito a vários momentos de interrupção do discurso. "Obrigada, camaradas, assim é mais fácil", disse no único à parte a que o discurso teve direito.

No final, a sala aplaudiu novamente Jerónimo, de pé e durante seis minutos. Mais tempo do que o comité central lhe dedicou, no passado sábado, com uma salva de palmas de 4 minutos. No PCP, os rituais contam. E mesmo que discreta, esta é melhor forma que os comunistas têm para dizer 'obrigada'.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: RLima@expresso.impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate