Foi por “iniciativa própria” e no timing escolhido por Jerónimo de Sousa que se deu a substituição da liderança do PCP. A garantia foi dada pelo próprio secretário-geral comunista, numa conferência de Imprensa realizada no final da reunião do comité central, onde um inédito tom intimista e até de algumas “inconfidências” foi usado para explicar a assumida “surpresa” de um nome como Paulo Raimundo ter sido catapultado para a linha da frente da estratégia comunista.
“Refleti muito”, assumiu Jerónimo, que quis deixar claro que foi “por iniciativa própria” que a mudança de líder do PCP se processou e que o principal motivo para antecipar a saída foi “a cirurgia e as suas sequelas” a que foi submetido de emergência no início do ano e em plena campanha para as eleições legislativas. “Era o momento para decidir, enquanto temos cabeça e racionalidade” e foi isso mesmo que o secretário-geral comunista fez questão de colocar “aos meus camaradas dos órgãos executivos”.
“Saio como entrei, no plano económico e como um homem do povo”, disse ainda. “De cabeça erguida” e com uma “longa lista de alegrias e tristezas” vividas ao longo dos 18 anos de liderança do partido, Jerónimo fez questão também de marcar o seu futuro imediato e dos seus mais diretos sucessores.
Sai do Parlamento e deixa “a possibilidade real” de ser substituído por Duarte Alves (o que torna a possibilidade num facto). Admite até “não fazer mais nenhuma intervenção no Parlamento”, mesmo quando a fase final de debate orçamental ainda está a decorrer. E é também num tom muito direto, pouco usual para os cânones do partido, que assume ter sido aplaudido de pé, durante quatro minutos, pelos seus camaradas do comité central, depois de ser aceite o seu pedido de entrega da pasta. “Soube muito bem sentir aquele abraço solidário”, confessou aos jornalistas.
Sem unanimidade
Jerónimo confidenciou ainda um dado raro na vida interna do PCP. A escolha de Paulo Raimundo foi feita “não por unanimidade, porque havia outros nomes”, mas “por uma ampla convergência”, o segundo patamar possível na lista de modos de aprovação pelo ‘coletivo’ comunista. O ainda secretário-geral não foi tão longe a revelar quem foi o autor da proposta do próximo líder - “isso também é querer saber demais” - mas assume que “esta substituição foi normal e natural e verificou-se num quadro de grande unidade e coesão na direção”.
Quanto aos méritos do seu sucessor, Jerónimo faz uma lista: “É um camarada estudioso, que conhece os problemas, é um homem sensível, um camarada modesto, que ouve muito os outros e compreende as coisas de forma célere”. É um desconhecido, mas “não se pode ser conhecido se não se aparecer” e o ainda líder está confiante. “Tem muitas potencialidades, que os jornalistas podem puxar para cima ou para baixo.”
O recado fica dado e até em modo de transmissão para memória futura: “Espero que registem estas palavras: é uma solução segura, que corresponde às necessidades do partido neste momento”. “Ele vai ser capaz de dar conta do recado”, Jerónimo dixit.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: RLima@expresso.impresa.pt
Assine e junte-se ao novo fórum de comentários
Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes