Política

PS pede para eliminar gravação de pedido de demissão de Ana Abrunhosa. "Inacreditável em democracia", diz IL

PS pede para eliminar gravação de pedido de demissão de Ana Abrunhosa. "Inacreditável em democracia", diz IL
MIGUEL A. LOPES/LUSA

IL e Chega questionaram a ministra sobre a “questão ética” subjacente ao facto de duas empresas do marido terem recebido fundos comunitários e sugeriram demissão. Deputada do PS, não satisfeita com interpelação, pediu para que esse momento fosse retirado das atas e da gravação da comissão alegando não fazer parte da ordem de trabalhos. Ministra recusou responder às perguntas mas disse que, no que depender de si, nenhuma gravação será apagada. E emocionou-se

A polémica instalou-se esta quarta-feira durante a audição da ministra da Cosão Territorial no Parlamento. A primeira parte da audição tinha tema único - “o estado do ordenamento do território” -, mas a segunda parte era aquilo a que se chama uma audição regimental sobre a política do Ministério. Ou seja, cabia tudo. O tema dominante, contudo, foi a notícia avançada esta manhã pelo jornal Observador, que dá conta de que duas empresas do marido de Ana Abrunhosa receberam fundos comunitários da área por si tutelada.

Tanto o Chega como a Iniciativa Liberal questionaram a ministra sobre o caso logo na primeira parte da audição (a tal de tema único) e a ministra recusou responder, alegando já ter dado todas as explicações necessárias. “Para mostrar que segue as regras da transparência só existem duas soluções no fim do dia de hoje: ou as empresas do seu marido devolvem o dinheiro que receberam ou a senhora demite-se”, disse o deputado da IL Carlos Guimarães Pinto na primeira intervenção, sugerindo a demissão da ministra.

Em sua defesa, uma vez que a ministra recusaria responder, quem falou foi a deputada do PS Isabel Guerreiro que alegou que aquele tema estava fora do âmbito dos trabalhos da comissão e sugeriu, por isso, que as intervenções dos deputados da IL e do Chega sobre esse mesmo assunto deveriam ser eliminadas dos registos da audição.

"Não posso vir aqui falar sobre o café ou o chá que podemos ter tomado ontem à tarde. Estou impedida. O senhor deputado não pode fazer a intervenção que faz, fora do contexto, e continuar a falar como se nada fosse, porque não está na ordem de trabalhos. Não posso falar sobre o concerto que fui ver neste verão porque não está na ordem de trabalhos. E por esse facto acho que deve ser retirada a gravação e deve ser retirada esta parte da ata, não deve ficar a constar [na ata]”, defendeu a deputada.

Para a IL, contudo, tratou-se de uma clara fuga ao escrutínio público. “Agora mesmo na audição à Ministra da Coesão Territorial uma deputada do PS pediu para que a gravação da minha intervenção sobre os fundos atribuídos ao marido da ministra fosse apagada. Incrível. Inacreditável em democracia”, reagiu Guimarães Pinto no Twitter.

Ministra rejeita apagar gravações e emociona-se. “É com a nossa almofada que fazemos contas"

Numa primeira abordagem, a presidente da comissão, a social-democrata Isaura Morais, explicou que a eliminação dos registos pedida pelo PS seria tratada numa reunião de mesa e coordenadores. Mas, mais à frente, seria a própria ministra a recusar apagar o que quer que seja. “Se depender da minha opinião, nada do que disse será apagado, não há necessidade disso. O senhor deputado exerceu a sua opinião como eu tenho a minha. Estamos em democracia, temos as nossas ideias e no fim do dia é com a nossa almofada que fazemos contas”, disse, fazendo depois um compasso de espera para travar a voz embargada: “Sou uma chorona”, admitiu, acrescentando que sabe que há críticas feitas com “amizade” e não apenas por “malícia”.

É que Carlos Guimarães Pinto tinha voltado a insistir na pergunta quando arrancou a segunda parte da audição - a tal que não tinha ordem de trabalhos delimitada - e tinha sublinhado que, apesar de o assunto ser delicado, tinha simpatia pela ministra. Elogiaria, de resto, a “dignidade” da ministra ao ter rejeitado a sugestão da deputada de apagar os registos das perguntas incómodas.

“A situação até pode ser completamente legal, mas o conflito moral é evidente”, tinha começado por dizer Carlos Guimarães Pinto, insistindo de seguida na pergunta: “Existe ou não um conflito ético?”. “É que se se tratasse de uma contratação pública, o seu marido não podia receber fundos públicos do Estado, agora não é uma contratação, é um subsídio, mas o mecanismo é o mesmo”, disse, acrescentando ainda que a ministra “tem conhecimento privilegiado sobre a aplicação dos fundos”. Logo, há conflito.

Ana Abrunhosa, uma vez mais, limitou-se a dizer que não iria responder à questão, o que motivou uma intervenção da presidente da Mesa Isaura Morais: “Estamos no âmbito de uma audição regimental e estamos a repetir-nos num assunto que a senhora ministra já disse que não iria responder”.

Empresas de marido a receberem fundos? “É uma chatice”

Mas Carlos Guimarães Pinto iria até ao fim: “Existe um profundo conflito ético. Eu sei que é uma chatice que alguém possa não estar em situaçao de igualdade por estar casado com uma ministra - é uma chatice, é mesmo, mas se achar que é demasiado chato para si, a opção é deixar o cargo”. No final, Guimarães Pinto agradeceu a postura da ministra em relação à não eliminação da gravação, mas reiterou que só há dois caminhos: ou a devolução dos dinheiros ou a demissão da ministra.

Em causa está a notícia avançada pelo Observador que dá conta de que duas empresas do marido de Ana Abrunhosa receberam fundos comunitários da área por si tutelada. O deputado liberal questionou esta manhã a governante sobre a “questão ética” subjacente ao facto de só uma das empresas detidas pelo cônjuge, a Thermalvet, ter recebido 133 mil euros da União Europeia (UE) e pediu que devolvesse o dinheiro ou se demitisse.

Segundo o Observador, a Thermalvet, detida a 40% pelo marido de Ana Abrunhosa, recebeu 133 mil euros. Esta empresa foi fundada em outubro de 2020, 15 dias antes do arranque do projeto.

Já a Xiapu, empresa que conta com uma participação indireta do conjugue da ministra, recebeu 66.015 euros no quadro do programa Compete 2020.

A ministra da Coesão, que tutela as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) - responsáveis pela gestão dos fundos comunitários - alega que pediu um parecer à Procuradoria-Geral da República (PGR), que não conclui a existência de conflitos de interesses, nem ilegalidades. Contudo, a PGR alerta também no parecer para a “obscuridade da lei”.

em atualização

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: lpcoelho@expresso.impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas