Em 1995, o CDS saído de uma vitória eleitoral que o colocou como terceiro partido do Parlamento, com 15 deputados (o triplo do que tinha tido em 1991) indica o nome de Nuno Krus Abecasis para uma das vice-presidências da Assembleia da República. O nome do antigo presidente da Câmara de Lisboa foi chumbado duas vezes. Não alcançou o número de votos necessários para a eleição. Alguns boletins de voto tinham até escrito a palavra “sanguessuga”. Era isso que Manuel Monteiro, o presidente do partido, tinha chamado aos políticos portugueses.
Abecasis só seria eleito para vice-presidente três anos depois, em 1998, já com Paulo Portas a líder do partido (o que mostra alvo do chumbo não era o ex-autarca, e sim Monteiro). Após a sua morte, em abril de 1999, foi eleito vice-presidente o deputado Pedro Feist, também do CDS, com maioria folgada.
O Parlamento esteve três anos com três vices em vez dos regimentais quatro. E também com um secretário da Mesa a menos: o mesmo voto de protesto que tinha evitado a eleição do ex-autarca lisboeta tinha também impossibilitado Helena Santo de desempenhar as funções de secretária da Mesa. Uma situação que pode agora repetir-se com o Chega como terceiro partido do Parlamento: o partido já indicou Diogo Pacheco de Amorim como candidato, mas, ainda antes de saberem o nome indicado, já os partidos de esquerda tinha avisado que, fosse quem fosse, não passaria.
A votação de Abecasis é apenas um dos episódios de votações falhadas para a Mesa da Assembleia da República que aconteceram ao longo de 48 anos de democracia. E que começaram logo na I Legislatura. Em 1978, quando o Parlamento ainda tinha 250 deputados em vez dos atuais 230, o PS indicou Teófilo Carvalho dos Santos para substituir Vasco da Gama Fernandes na presidência da AR. Não havia adversários e o PS tinha 107 votos, mas o candidato só teve 98 na primeira volta. Só feito eleito dias depois, já com 134 votos.
Na II Legislatura, volta a não haver vitória à primeira volta, mas aí a eleição é disputada por Teófilo Carvalho dos Santos e Francisco Oliveira Dias, do CDS. A AD tinha maioria absoluta com 134 deputados, mas Oliveira Dias só conseguiu 97 votos contra os 98 do socialista. A esquerda ainda festejou vitória, mas a margem era curta: não cumpria a maioria absoluta necessária para a eleição da segunda figura do Estado. Na segunda votação, Oliveira Dias conseguiu 128 votos contra 108 de Teófilo Carvalho dos Santos.
Em 1991, foi necessária pela terceira vez uma segunda volta para a eleição do presidente do Parlamento. O PSD tinha uma maioria mais do que absoluta: 135 deputados em 230 e escolheu Barbosa de Melo para presidir à AR. O PS, que tinha 72 deputados, candidatou Alberto Marques Oliveira e Silva. A votação parecia resolvida à partida. Contudo, nem todos os sociais-democratas votam no seu candidato e, na primeira volta, Barbosa de Melo teve apenas 109 votos a favor e Oliveira e Silva teve 71. A segunda votação ocorreu logo de segunda e o candidato social-democrata alcançou 117 votos, enquanto o socialista baixou para 62.
Fernando Nobre falhou eleição
Em 2011, não foi apenas necessária segunda volta, foi preciso mesmo mudar de candidato. Passos Coelho tinha escolhido Fernando Nobre para ser o candidato a presidente do Parlamento. O médico tinha sido candidato a Presidente da República em janeiro desse ano, alcançando 14 % dos votos na reeleição de Cavaco Silva, e terá sido convidado por PS e por PSD para as listas de deputados. Aceitou a proposta do PSD, que incluía ser cabeça de lista por Lisboa e candidato a presidente do Parlamento. Contudo, o líder do PSD não garantiu os votos do seu parceiro de coligação: O PSD tinha 108 deputados, o CDS tinha 24, mas tinha avisado que não apoiava Nobre. Ainda assim, a 20 de junho, véspera de tomar posse como primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho manteve o seu compromisso e levou Nobre a votos, permanecendo a seu lado no Parlamento.
Não havia adversário. Na primeira votação, Fernando Nobre teve 106 dos 116 votos. Cento e um deputados votaram em branco e houve 21 votos nulos num total de 228 votos expressos. Na segunda votação, teve ainda menos um voto, 105. Nem o pleno dos deputados do PSD conseguia fazer e desistiu. No dia seguinte, Assunção Esteves foi eleita com 186 votos a favor, 41 brancos e 1 nulo.
Umas vezes o que está em causa é o nome escolhido, que nem os votos do seu partido consegue congregar, outras, como no caso de Abecasis, é o partido e as posições que toma. A verdade é que o voto nas eleições para a Mesa da Assembleia é secreto e o que acontecer ao nome indicado pelo Chega para ir a votos não será inédito.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt