A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Catarina Martins, defendeu que os alegados casos de tortura de imigrantes em Odemira por parte de militares da GNR são "chocantes" e criticou a "cultura de impunidade" que leva a que estas situações sejam crescentes entre as forças de segurança.
"Não é um caso pontual, tivemos casos gravíssimos na PSP, no SEF e agora na GNR. Nós temos em Portugal um problema com as forças de segurança de violência racista. Estamos a falar de jovens agentes que se unem em grupo para agredir imigrantes e isto é um de uma brutalidade, de uma gravidade enorme", afirmou Catarina Martins em declarações aos jornalistas, após a entrega em tribunal da lista de deputados do BE pelo distrito do Porto.
Para Catarina Martins, existe uma "atmosfera de impunidade", que conduz à reincidência dos casos de violência nas forças de segurança. "É preciso retirar quem não está à altura da farda que veste. Não é possível aceitar este tipo de comportamentos", reforçou.
A solução, sublinhou, passa por apostar mais na formação de elementos das forças de segurança e garantir também a devida punição. "É responsabilidade da hierarquia e da tutela seguramente. Quando nós sabemos que há casos reincidentes e as pessoas não são afastadas, significa que a hierarquia e a tutela não estão a fazer o que devem para proteger os cidadãos e as próprias forças de segurança", prosseguiu.
Mas cabe também ao Governo "atuar do ponto de vista político" sobre as condições em que vivem e trabalham os imigrantes, disse ainda Catarina Martins, dando como exemplo os casos de trabalhadores agrícolas imigrantes que vivem em condições precárias em Odemira, que ficaram expostas pela pandemia.
"Chamo a atenção que, em Odemira, temos trabalhadores que são colocados em contentores como se fossem alfaias agrícolas. A desumanização de pessoas migrantes é também um problema", observou.
Questionada sobre a alegada infiltração de elementos da extrema-direita nas forças de segurança, Catarina Martins recusou estarem em causa apenas suspeitas, apontando para relatórios internacionais que revelam que esse é um dos problemas do nosso país.
Comunistas pedem "reflexão" sobre recrutamento e formação de polícias
Também o PCP considerou "inaceitável" que os militares da GNR envolvidos em acusações de tortura a imigrantes em Odemira (Beja) continuem em funções, e defendeu "punição exemplar" e reflexão sobre a seleção destes profissionais.
"O PCP considera que tais comportamentos, que dizem respeito a elementos concretos que não à instituição no seu todo, requerem punição exemplar, mas requerem também que as instituições reflitam sobre a seleção, formação e acompanhamento ao longo do tempo dos profissionais que nelas prestam serviço", refere o PCP, em comunicado.
Os comunistas condenaram "veementemente" estes crimes e consideraram "inaceitável que os envolvidos se mantenham em funções".
Na quinta-feira, a GNR esclareceu que dois dos sete militares que se filmaram a torturar imigrantes asiáticos em Odemira, em 2019, encontram-se a cumprir pena de suspensão decretada pelo Ministério da Administração Interna, enquanto os outros aguardam pelas medidas sancionatórias.
De acordo com a GNR, três dos agentes do Destacamento Territorial de Odemira são reincidentes, depois de terem estado "envolvidos em agressões a indivíduos hindustânicos", em 2018.
O esclarecimento surge após uma investigação CNN Portugal e TVI que deu conta da acusação de sete elementos da GNR de um total de 33 crimes, por humilharem e torturarem imigrantes em Odemira.
Segundo a GNR, os restantes cinco militares aguardam medidas sancionatórias, que são da responsabilidade da Inspeção Geral da Administração Interna (IGAI), entidade que tutela o processo de inquérito que ainda decorre.
Num despacho de acusação de 10 de novembro e ao qual a CNN Portugal e TVI tiveram acesso, o Ministério Público refere que os militares cometiam os atos de tortura "em manifesto uso excessivo de poder de autoridade" e que "todos os arguidos agiram com satisfação e desprezo pelos indivíduos".
De acordo com a investigação, a PJ já tinha recolhido os telemóveis a cinco militares do posto da GNR de Vila Nova de Milfontes, suspeitos de maus-tratos a imigrantes.
Em sete vídeos analisados é possível detetar cenas de violência, insultos racistas, tortura física e humilhação contra vários imigrantes de origem asiática.