Política

Deputado do Chega nos Açores não acata “recomendação” de Ventura e segura Governo. Mas avisa que é “a última oportunidade”

Deputado do Chega nos Açores não acata “recomendação” de Ventura e segura Governo. Mas avisa que é “a última oportunidade”
EDUARDO COSTA/LUSA

Em conferência de imprensa em Ponta Delgada, José Pacheco afirmou que “o diálogo está a decorrer finalmente”, confessando-se “mais confortável”, mas ressalvando que “ainda há caminho a fazer”. Quanto à decisão final sobre o seu sentido de voto no Orçamento, só na próxima quarta-feira. Em reação, André Ventura falou em “total sintonia” com o seu deputado regional mas recuou: o que há dois dias era uma decisão “fortemente definitiva” é agora um “cenário não fechado”

Deputado do Chega nos Açores não acata “recomendação” de Ventura e segura Governo. Mas avisa que é “a última oportunidade”

Hélder Gomes

Jornalista

O deputado único do Chega na Assembleia Legislativa dos Açores, José Pacheco, não acatou a “recomendação” do presidente nacional do partido. André Ventura recomendou na quarta-feira a retirada do apoio ao Governo Regional, liderado pelo social-democrata José Manuel Bolieiro. E instruiu o seu deputado a fazê-lo já na votação do Plano e Orçamento dos Açores 2022, que decorre na próxima semana. Mais: Ventura disse que, pela direção nacional, o apoio do Chega ao Governo Regional “já morreu”.

Em conferência de imprensa em Ponta Delgada, José Pacheco afirmou esta sexta-feira que “o diálogo está a decorrer finalmente”, confessando-se “mais confortável”, mas ressalvando que “ainda há caminho a fazer”. “Esta será a última oportunidade dada pelo Chega”, avisou. Num tom ambíguo, o deputado açoriano disse, por um lado, que “as negociações não estão fechadas” e, por outro, que “o acordo acaba de ser rasgado”. Em rigor, não o foi. O que o deputado pretende é que o acordo seja revisto e acabe por ser “mais objetivo”.

Sem revelar ainda o seu sentido de voto no Orçamento, José Pacheco afirmou que “enquanto há diálogo, o Chega quer e defende a estabilidade para todos os açorianos”. O acordo a que se refere é um dos dois que tornaram possível, há um ano, a governabilidade à direita no arquipélago: um firmado entre o PSD e a IL e um outro entre os três partidos da coligação de governo (PSD, CDS e PPM) e o Chega. Acontece que este último foi assinado por Carlos Augusto Furtado, então líder do Chega açoriano e deputado eleito pelo partido, mas que entretanto passou a independente depois de a direção nacional lhe ter retirado a confiança política.

“As negociações podem resultar em compromissos sérios”

Como os Açores gozam de autonomia, apesar da recomendação de Ventura, a decisão cabe formalmente ao deputado regional. José Pacheco afasta qualquer “rutura” com o seu partido, garantindo que tal nunca existiu e que continua em sintonia com Ventura. No limite, caso o Governo caia, “não temos medo de ir eleições”, assegurou, acrescentando, no entanto, ter “muito medo” de criar instabilidade aos açorianos. É por estes que garante zelar, colocando-os “sempre em primeiro lugar, mesmo que isto não agrade a todos”.

“Estamos em crer que as negociações que ainda decorrem podem resultar em compromissos sérios”, afiançou. Mas “exigimos que comecem a tratar o Chega com o respeito que merece”, advertiu. “E refiro-me às relações tanto nos Açores como a nível nacional: ou entendem que somos um partido confiável ou não contem connosco.”

E, de novo, o acordo: “O acordo vai ser rasgado. O acordo acaba de ser rasgado. O acordo não está bem feito. Tenho tido esta conversa com o presidente do Governo Regional. Ele abriu o diálogo e algumas pessoas do Governo têm trabalhado comigo nalguns aspetos.” Questionado sobre a necessidade de esse acordo (revisto) ser validado pelo Representante da República para os Açores, José Pacheco disse que aquele, “neste caso, não tem papel nenhum”. “Sou um autonomista convicto e não admito que o Representante da República ponha o bedelho num acordo entre dois partidos”, reforçou. E avançou com uma solução: “Mandamos-lhe um email com o acordo.”

Tamanho do Executivo, RSI e gabinete anticorrupção

No essencial, são três as grandes questões que podem desatar o nó ou fazer cair o Governo, devendo José Pacheco anunciar a sua decisão final na próxima quarta-feira. Primeira: “O custo da máquina governativa continua a engordar. O Governo precisa de ser reduzido”, disse o deputado do Chega, acrescentando que recebeu de Bolieiro a garantia de que isso “será para breve”, bem como o bom acolhimento de “uma proposta de redução do endividamento da região”. Na mesma linha, o deputado pede uma “solução definitiva” para que a companhia aérea açoriana SATA deixe de ser “um sorvedouro de dinheiros públicos”.

Segunda: “Uma melhor e mais eficaz fiscalização” dos beneficiários do Rendimento Social de Inserção (RSI), uma proposta que o Chega apresentará “a curto prazo” e sobre a qual o PSD já terá deixado “a garantia de que será acolhida”. Terceira: Um gabinete anticorrupção que deverá começar a funcionar “em dezembro” e em cuja “orgânica” o Chega terá “um papel ativo”.

“Ainda não estamos como queremos”, sintetizou o deputado, mas há sinais de progresso nas negociações. Este foi o motivo pelo qual José Pacheco não acatou, para já, a instrução da direção nacional do Chega, mostrando, em vez disso, um cartão amarelo a Bolieiro. Mas deixou o aviso: “Se tiver de pôr este Governo ao charco, eu ponho.”

De “fortemente definitiva” a “cenário não fechado”

Num vídeo enviado às redações após a conferência de imprensa do seu deputado regional, André Ventura assegurou que há uma “total sintonia” com José Pacheco e sustentou que a decisão de retirar o apoio parlamentar ao Governo de Bolieiro “não está fechada”. E insistiu existir “uma articulação plena e harmoniosa a nível regional, autárquico e nacional na defesa daquilo que é o projeto do Chega”.

“O cenário não está fechado. Vamos continuar a articular, vamos continuar a trabalhar e vamos continuar juntos a exigir aquilo que foi acordado com o Chega e aquilo que é também a exigência da população nos Açores”, disse o presidente nacional do partido.

Trata-se de um recuo de Ventura face àquilo que afirmou na quarta-feira ao assegurar que a decisão era “fortemente definitiva” e que, no que dependesse da direção nacional do Chega e do seu presidente, o apoio ao Governo açoriano morrera naquele dia.

Notícia atualizada às 13h24 com a reação de André Ventura

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