A Operação Miríade deu o primeiro mote: "Tenho simpatia pelo ministro da Defesa. Mas estou a imaginar-me primeiro-ministro e a ver na televisão e ter de telefonar-lhe a perguntar 'o que é que é isto'. É complicado como um ministro deixa assim o Governo e deixa mal o Presidente", disse Rui Rio na entrevista à RTP3, sublinhando que quem devia ter avisado Marcelo sobre a investigação era António Costa. "Um parecer pedido para saber se podia dizer ao primeiro-ministro, é uma história mal contada. É particularmente grave que o ministro não o ponha a par, é muito esquisito".
Mas rapidamente o entrevistador mudou o rumo para a questão interna. Porque diz Rui Rio que não vai fazer campanha interna? O atual líder do PSD respondeu o que tem dito: que quer "evitar" que no PSD "andem uns contra os outros". E lembrou o que fez o PS quando António José Seguro foi desafiado por António Costa "um ano antes de legislativas". "Todos os ataques que fizer ao dr. Paulo Rangel, depois são usados contra mim" na campanha das legislativas, argumentou. "Eu estou na vida política há mais de 40 anos. Acha que era agora em 15 dias que ia mostrar de mim algo diferente? As pessoas conhecem-me há muito tempo".
Para já, 4 anos depois de chegar a líder, Rio diz que se vai preparar para ser candidato a primeiro-ministro. "Não quero chegar lá sem estar preparado" e até 30 de janeiro o tempo "é muito escasso" e "isto tem de ser bem feito". Mesmo assim, acabaria por admitir que "mal fora que eu não estivesse preparado, estou aqui há 4 anos".
"E Paulo Rangel está preparado?", perguntou o jornalista Vítor Gonçalves. "Acho que não. Quando se propõe candidatar-se, estava a olhar e a dizer que tinha dois anos para se preparar. Não para daqui a três meses - para mais com uma disputa interna. Eu não estava, quando cheguei a líder do PSD".
Feita a crítica, o entrevistador perguntou a Rio se aquela não era uma crítica e, portanto, uma contradição. Rio parou: "É verdade". E parou, para reverter: "A seguir vem ele e vai dizer qualquer coisa. Por isso é que não quero fazer" debates, argumentou. Mas Rui Rio fez outra crítica, mesmo sem dizer o nome de Rangel: que "querer muito" ser líder não é bom, porque ser líder "é uma missão".
E terá de ser esta uma guerra intestina? "Na semana passada entrevistou aqui o dr. Paulo Rangel, ele disse o que quis, agora eu estou aqui e digo o que quero. Pronto, está o confronto feito".
Se PSD perder, Rio está disponível para dar governabilidade a Costa: "O país não pode ficar na ingovernabilidade"
Mas o líder e candidato do PSD falou também sobre a governabilidade.
O pior cenário é o de os principais partidos tomarem uma posição igual àquela que o dr. Costa tomou há dois anos, dizendo que só havia PCP e BE e não havia mais nada. Se o dr. António Costa insistir nisso e o candidato do PSD fizer o mesmo", disse Rio com nova farpa a Rangel ("o meu adversário é isso que diz, que nem fala com o PS"), "o país não pode ficar na ingovernabilidade". Rio diz que é diferente: "Não olho para o interesse do partido", diz, lembrando: "muita gente me acusa de ser muleta do Governo".
Assim, Rio está disponível para o quê? "Se eu ganhar sem maioria - é difícilima - estou disponível para negociar com o PS, com o CDS ou IL. Nestes casos é integração no Governo, com o PS não é isso (não vejo necessidade), mas negociação para conseguir-se a governabilidade". Com o PS, sim, "se eu não tiver maioria e se eles quiserem", para que "a governação seja feita ao centro".
E se o PSD perder? "O meu PSD está disponível para conversar com o PS, senão o que acontece é atirar o PS para a mão do PCP e BE". E vem mais uma crítica a Rangel: "Eu não percebo quem no meu partido critica o PS" por ter falado só à esquerda e depois "recuse" dar uma solução. "Isso é incoerente". Pelo que Rio diz que o país "não deve ficar seis meses à espera. Tenho de humildemente reconhecer que o outro ganha". Porém, "falar é falar", não é entregar sem negociar essa governabilidade.
Mas há um senão: se o PS vencer, mas a direita tiver maioria. "Não, nesse caso, tendo em conta o antecedente do próprio PS, eu teria de tentar negociar [uma maioria] com o CDS e IL", disse Rio, sem nunca mencionar o Chega. Não disse, mas foi questionado: "Eu ganhar eleições e haver coligação com o Chega, não. E como o Chega diz que não há nada se o Chega não for para o Governo, então o problema desapareceu".
Um balanço? "Muito positivo"
Pelo meio, Rio fez o seu balanço destes anos de liderança: meteu no mesmo saco a Madeira, o regresso ao Governo dos Açores, as autárquicas. E as legislativas porque, disse, em 2019 o resultado foi "muito positivo". A troika não voltou, o diabo não veio. Foi neste contexto que disputei as eleições. Mas o PS não teve maioria absoluta, conseguimos diminuir muito o que era previsível que acontecesse. Era muito provável que acontecesse bem pior".
Agora, "não se chega ao poder 30 dias" depois de se ser nomeado líder do partido, "principalmente quando é contra o PM em funções. Só se ele estiver mesmo a zero absoluto. Ele está num patamar negativo, o ciclo político baixou, mas não estamos no ponto de qualquer um ganha", disse Rui Rio. "Temos de ser sinceros".
E que eixos leva Rio para uma eventual disputa com Costa?
O primeiro foi (mais) uma indireta a Rangel, que tem acentuado a mobilidade social: "Não tem mobilidade social nenhuma se não tiver melhor competitividade, assente na produção e exportações, não em perdões fiscais para a EDP, em dinheiro para o Novo Banco".
O segundo eixo de Rio são "melhores serviços públicos". Exemplo dado, o atraso na atribuição de pensões, mas também as demissões nos hospitais do SNS ou a "taxa de mortalidade" que, diz, "subiu muito, uma parte pela covid, mas também por não ter havido diagnósticos das principais doenças".
Rio apontou para uma baixa "da carga fiscal" (não de impostos necessariamente), sem dizer ainda como ou em quanto. Para já, é tempo de fazer as contas para saber reponder, dependendo "das folgas orçamentais".
Para já, Rio admite que "a Europa pode estar à beira de uma situação complicada", sobretudo por causa da subida da inflação. Sobretudo se as taxas de juro subirem, admitiu, alertando que Christine Lagarde disse que não o faria "mas não pode alarmar" enquanto presidente do BCE e que pode estar a acontecer uma mudança estrutural que deixe a inflação em níveis mais altos.
Para Costa, ainda ficou a crítica, em jeito de recomendação, para António Costa: "É mais aconselhável" que medidas como o salário mínimo fiquem à espera de eleições. Ou seja, o aumento para 705 euros deve ficar em stand-by. Para Marcelo é que nem mais uma palavra: "Não andamos a chorar sobre leite derramado, nem mais uma palavra". E para o PSD? "Espero que no fim disto tudo, o partido fique um pouco mais unido".
E se Rui Rio perder? Aceita colaborar com Rangel? Para já, Rio "tenderia a dizer que acabou". Mas opta por seguir a máxima 'nunca digas nunca'.
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