Política

Governo quer autorizar polícias a usar câmaras que identificam pessoas e detetam infrações de trânsito em tempo real

Governo quer autorizar polícias a usar câmaras que identificam pessoas e detetam infrações de trânsito em tempo real
MÁRIO CRUZ/LUSA

O uso de videovigilância que reconhece pessoas através de dados biométricos está restringido à prevenção de atos de terrorismo. Governo pretende que imagens possam ser usadas como prova em caso de crime ou na aplicação expedita de multas de trânsito

O Governo apresentou esta quarta-feira na Assembleia da República uma proposta de lei que autoriza as polícias a usarem sistema de reconhecimento de pessoas através de dados biométricos, bem como ferramentas de Inteligência Artificial. Esta possibilidade apenas pode ser usada na prevenção de atos terroristas, “mediante autorização de entidade judicial”. Também está previsto o uso de videovigilância para a deteção de infrações e aplicação de multas, em tempo real.

A iniciativa governamental contempla igualmente os critérios a respeitar pela videovigilância usada em drones, e câmaras individuais de polícias (bodycams), e refere ainda a necessidade de garantir um parecer prévio da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD).

A Proposta de Lei 111/XIV/2 governamental é assinada pelo primeiro-ministro António Costa, bem como pelo ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita e ainda poderá sofrer alterações durante o debate parlamentar.

O recurso a sistemas biométricos, que permitem identificar uma pessoa possivelmente através do rosto, está previsto no artigo 18.º da proposta do Governo. Este mesmo artigo 18.º refere que “a visualização e o tratamento dos dados podem ter subjacente um sistema de gestão analítica dos dados captados”, mas também lembra que estas ferramentas automatizadas não podem “permitir a reversão, a descodificação e a reprodução de forma digitalizada da imagem da característica biométrica” das pessoas que são captadas pelas câmaras.

Com esta salvaguarda, o Governo pretende evitar a reprodução ou extração indevidas de dados biométricos após a eventual deteção de um suspeito, em tempo real ou posterior visualização.

Outra alínea do artigo 18.º refere ainda que o uso do reconhecimento biométrico apenas pode ser feito no combate ao terrorismo.

Também se prevê que o uso de sistemas de inteligência artificial seja precedido de uma análise do impacto que poderá ter na privacidade dos cidadãos.

A proposta de lei prevê, no artigo 20.º, o uso das imagens captadas como “auto de notícia”, que eventualmente poderá ser usado como indício ou prova numa investigação do Ministério Público. Nos casos em que há suspeita de atividades criminais, estes dados deverão ser enviados pelas polícias para os procuradoresaté 72 horas após o conhecimento da prática dos factos”. Podem ser usadas imagens e sons captados no momento.

Bodycams só devem ser usadas em ilícitos criminais

“A decisão de autorização de instalação de câmaras e a decisão de instalação em caso de urgência são comunicadas ao Ministério Público”, detalha ainda a proposta de lei governamental.

A proposta de lei abarca ainda o uso de câmaras de videovigilância portáteis em drones e embarcações. “À utilização de câmaras portáteis é aplicável a legislação própria relativa às forças e serviços de segurança e às medidas de combate à criminalidade organizada”, refere a proposta de lei.

No artigo 11.º, é autorizado o uso das câmaras de videovigilância individuais por parte das polícias. As denominadas bodycams podem ser usadas, “mediante autorização do respetivo dirigente máximo, sendo informado o membro do Governo que tutela a força de segurança”.

Apenas em casos de ocorrência de ilícito criminal os polícias poderão ativar as bodycams – e sempre com aviso explícito para o uso do dispositivo.

O Governo prevê regulamentar, futuramente, através de portaria, os requisitos de gravação e transmissão das imagens das bodycams.

Mais notório no dia-a-dia é o uso de câmaras de videovigilância e tecnologias de localização para a prevenção e deteção de infrações nas estradas. Esta proposta tem em vista “o reforço da eficácia da intervenção legal das forças de segurança e das autoridades judiciárias e a racionalização de meios, sendo apenas utilizáveis em conformidade com os princípios gerais de tratamento de dados pessoais”.

Videovigilância para deteção de infrações rodoviárias e gestão de tráfego

Além da “deteção, em tempo real ou através de registo, de infrações rodoviárias e a aplicação das correspondentes normas sancionatórias”, também está contemplada “a realização de ações de controlo e gestão de tráfego e o acionamento de mecanismos de prevenção e de socorro em matéria de acidentes de trânsito”; “a localização de viaturas para efeitos de cumprimento de normas legais, designadamente de caráter penal, tais como as referentes a veículos furtados ou à deteção de matrículas falsificadas em circulação”; e “a utilização dos registos de vídeo para efeitos de prova em processo penal ou contraordenacional, respetivamente nas fases de levantamento de auto, inquérito, instrução e julgamento ou nas fases administrativa e de recurso judicial”.

A proposta do Governo abarca ainda possibilidade de uso de videovigilância para a deteção de incêndios rurais em tempo real – e como prova que pode ser usada na justiça, em caso de suspeita de crime. A instalação destes sistemas para efeito de deteção de incêndios rurais deverá ser precedida de pareceres da CNPD e da Proteção Civil, e de autorização de proprietários se abranger terrenos privados.

De resto, a proposta começa por referir nos primeiros artigos de que o uso de sistemas de videovigilância pelas autoridades deve munir-se, genericamente, dos pareceres da CNPD, e ainda da autorização do governante que tutela as forças de segurança. As imagens poderão ser conservadas por um prazo máximo de 30 dias, “em registo codificado” – o que leva a crer que deverão ser protegidas por sistemas de cifra, que só os profissionais autorizados poderão vir a usar.

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