Política

Eanes condecorou Otelo há 38 anos mas a Ordem da Liberdade só lhe chegou depois da morte

Eanes condecorou Otelo há 38 anos mas a Ordem da Liberdade só lhe chegou depois da morte
Rui Ochoa

A Ordem da Liberdade, atribuída por Ramalho Eanes, nunca tinha sido levantada por Otelo. Ainda estava em Belém

Eanes condecorou Otelo há 38 anos mas a Ordem da Liberdade só lhe chegou depois da morte

Vítor Matos

Jornalista

Em março deste ano, Marcelo Rebelo de Sousa começou a condecorar, com a Ordem da Liberdade, os 120 militares que participaram no 25 de Abril, mas Otelo Saraiva de Carvalho, o “Óscar” que comandou o golpe de Estado para derrubar a ditadura, não fez parte dos primeiros 27 agraciados. A razão era simples: já tinha sido homenageado com essa ordem honorífica por Ramalho Eanes em 1983. Mas Otelo faltou à cerimónia e nunca levantou a condecoração. O colar esteve 38 anos guardado em Belém e foi entregue à família esta semana, a tempo do funeral (ver obituário na pág. 36).

Zeca Afonso teve um papel nesta recusa de Otelo ir a Belém receber a Ordem da Liberdade. Apoiante do polémico candidato da extrema-esquerda à Presidência em 1976 — quando esteve no lançamento da sua candidatura em Grândola, uma provocação ao PCP —, o cantor havia de falar com o amigo sobre a homenagem que estavam ambos para receber de Eanes. Concordaram que não lhes apetecia aparecer ao lado de certas figuras que na opinião deles não mereciam aquela distinção. A caixa com as insígnias ficou, assim, no palácio presidencial, até Marcelo Rebelo de Sousa telefonar esta semana — “cinco ou seis vezes” — a Sérgio Carvalho, o filho mais novo de Otelo.

Em novembro do ano passado, depois da morte da mãe e apercebendo-se da fragilidade da saúde do pai, Sérgio Carvalho conseguiu convencer Otelo a pedir a Belém que lhe entregasse a insígnia, que, afinal, nunca chegara a rejeitar. O filho contactou então o responsável pelas ordens honoríficas, mas com a proximidade das eleições presidenciais e depois com a pandemia não conseguiu levantar a condecoração.

“Quando o Presidente me ligou”, conta Sérgio Carvalho, “disse-lhe que tinha contactado o chefe das ordens”, mas sem sucesso. Esta segunda-feira, Marcelo — que esteve sempre do outro lado da barricada, a não ser quando Otelo foi a muralha de aço no PREC contra o controlo do Expresso pelo PCP —, garantiu-lhe que ia “tratar disso”. No dia seguinte, o chefe da Casa Civil da Presidência “já tinha tudo preparado” para o funeral decorrer na capela da Academia Militar, onde Otelo dava aulas em 1974, com todas as condecorações civis e castrenses.

Além de Belém, também o Estado-Maior do Exército entregou à família as condecorações militares do major do 25 de Abril, que morreu com a patente de coronel, com base nos registos do ramo, uma vez que os filhos não as encontraram em casa. “Conseguimos encontrar a espada de oficial e a farda, que não vestia há mais de 40 anos”, mas não a caixa com as medalhas recebidas pelos serviços prestados na vida militar e na guerra em África.

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