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Visita de Marcelo à Guiné sob o signo da polémica

Umaro Sissoco Embaló, Presidente da Guiné-Bissau, e o seu homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa
Umaro Sissoco Embaló, Presidente da Guiné-Bissau, e o seu homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa
ANTONIO COTRIM

Maior partido da oposição vai faltar ao encontro de Marcelo com a Mesa do Congresso, criticando a legitimação de diversos atropelos à lei e à ordem democrática na Guiné-Bissau. Presidente eleito Sissoco Embaló recusou tomar posse perante o parlamento

Fernando Jorge Pereira, correspondente em Bissau

A classe política guineense está dividida quanto à oportunidade da visita oficial que Marcelo inicia esta tarde a Bissau, a primeira de um chefe de Estado português ao país há mais de três décadas. Para alguns, o mandatário luso é bem-vindo, enquanto outros consideram que a viagem visa fortalecer a legitimidade do regime instalado

Não se receia nenhum incidente, contudo o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), a maior força política local, atualmente na oposição, decidiu boicotar o encontro de terça-feira a tarde do Presidente português com a Mesa do Parlamento e com os líderes das bancadas. Por outro lado, os membros da Associação de Antigos Combatentes do Exército Português anunciaram um acolhimento público e amistoso a Marcelo, destinado a chamar a atenção de Marcelo para as dificuldades enfrentadas pelas viúvas e filhos dos ex-combatentes coloniais.

Califa Seidi, líder parlamentar do PAIGC, revelou que o seu partido entregou esta segunda-feira à Embaixada de Portugal uma carta aberta endereçada ao Presidente da República, em que manifesta a discordância com a vinda de Marcelo, numa conjuntura de insegurança e de diversos atropelos à lei e à ordem democrática na Guiné-Bissau.

Por seu lado, Agnelo Regalla, o influente líder do pequeno partido União para a Mudança (UM), embora reconhecendo a importância do relacionamento com Lisboa e os laços históricos e culturais que ligam os dois povos, não deixou de questionar as “verdadeiras razões subjacentes a esta visita”. Tal como outras personalidades da oposição, Regalla lamentou a deslocação do estadista português, um constitucionalista, de visitar a Guiné-Bissau nas atuais circunstâncias, e considerou que esta iniciativa que visa “legitimar um Presidente eleito (Sissoco Embaló), mas que se recusa a ser empossado pela Assembleia Nacional Popular “(ANP, o Parlamento), tal como dispõe a Constituição do país.

O político refere-se a polémica cerimónia de posse de Sissoco, que o próprio apelidou de “simbólica”, ocorrida num hotel da capital, sob forte proteção millitar, onde se autoproclamou Presidente da República, sem a presença do corpo diplomático e dos representantes da comunidade internacional, com exceção dos embaixadores do Senegal e da Gâmbia e os cônsules da Turquia e do Líbano. Outros comentários críticos à visita sublinham o silêncio de Belém perante o sequestro e espancamento de opositores e de jornalistas por vontade do homem-forte de Bissau.

Além da ida ao Parlamento, o ponto alto da agenda de Marcelo em Bissau é o encontro restrito com o seu homólogo guineense no palácio presidencial, e depois alargado às delegações dos dois países e seguido de declarações à imprensa. Antes, a comitiva portuguesa prestará homenagem aos heróis guineenses no memorial da Fortaleza da Amura, e cumprirá igual cerimónia no Cemitério Municipal da capital, onde jazem dezenas de portugueses tombados na guerra colonial.

Recorde-se que antes desta visita, Marcelo Rebelo de Sousa já tinha estado pelo menos três vezes em Bissau, numa delas no âmbito do projeto de criação da Faculdade de Direito de Bissau, apoiado pela congénere de Lisboa, e nas outras duas, durante o regime do falecido Presidente Nino Vieira, na qualidade de líder do PSD. Antes dele, o Presidente Cavaco Silva esteve em Bissau em 2006, com a finalidade de participar na Cimeira da CPLP. Ambos foram precedidos por Ramalho Eanes e mais tarde por Mário Soares - tendo sido esta, em 1989, a última visita oficial de um chefe de Estado português.

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