A ex-candidata à Presidência da República Ana Gomes teme que "haja muita gente nas bases do PS e não só que ainda tem o culto de Sócrates”, acrescentando que tudo o que o ex-primeiro-ministro “está a fazer é ao serviço de uma estratégia pessoal de vitimização”. A antiga eurodeputada critica, em entrevista dada ao Programa "Hora da Verdade", do jornal "Público" e da Renascença, António Costa e outros dirigentes por se manterem calados.
"Esse silêncio é de facto ensurdecedor. Dá ideia de que, ou há comprometimento, ou há demissão de uma assunção de responsabilidade que o PS também tem de fazer. Porque o PS tem de aceitar que se deixou instrumentalizar por um indivíduo que tinha muitas qualidades, mas também tinha tremendos defeitos, designadamente o de se aproveitar do cargo para tirar proveito pessoal em esquemas de corrupção, em detrimento do país”, esclarece.
Ana Gomes explica que “não é mais aceitável” o atual primeiro-ministro reger-se pela “linha do ‘à justiça o que é da justiça, à política o que é da política’”, complementando que “o PS não pode fingir que isto não tem consequências políticas". "O PS e os seus dirigentes continuam a não querer assumir que é preciso fazer uma auto-análise e uma autocrítica, até para efeitos preventivos para isto não voltar a acontecer e, sobretudo, para os seus próprios militantes tirarem consequências”, nota.
A antiga candidata elogia, no entanto, a posição do autarca lisboeta, Fernando Medina. “Só tenho pena que não haja mais vozes do PS, eleitos do PS, a dizer aquilo, em particular os seus responsáveis máximos. E a tirar consequências políticas daquilo que se sabe, independentemente do que a justiça venha a apurar. Não se pode deixar tirar consequências políticas, sabendo que um primeiro-ministro do PS ‘mercadejou’ o cargo. Que se aproveitou do cargo para tirar vantagens pessoais. Como disse Fernando Medina, isto quebra a confiança dos cidadãos nas instituições políticas. E estou a falar de uma instituição que muito prezo, que é o meu partido, o PS”.
A diplomata acrescenta que o exercício de auto-análise que os socialistas não estão a fazer sobre aquilo “que representou a era Sócrates é uma desculpa para os partidos também não o fazerem”, sublinhando que mais partidos estiveram envolvidos em esquemas de corrupção.
“Este fenómeno não é exclusivo do PS, lamento dizer. O caso dos submarinos, e não só, é demonstrativo de que havia outros primeiros-ministros e ministros de outros governos envolvidos em esquemas de corrupção. O caso dos submarinos é aquele caso em que na Alemanha foram condenados corruptores de instâncias portuguesas e em Portugal, até hoje, não se quis saber quem eram os corrompidos. E quem tinha responsabilidade, pelo menos política, era um primeiro-ministro chamado José Manuel Durão Barroso e um ministro chamado Paulo Portas”, argumentou.
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