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Marcelo deixa pesado caderno de encargos: “A reconstrução duradoura é muito mais do que regressar a 2019”

Marcelo deixa pesado caderno de encargos: “A reconstrução duradoura é muito mais do que regressar a 2019”
TIAGO MIRANDA

Um discurso a mil à hora, como quem não tem tempo a perder. Marcelo Rebelo de Sousa fez na posse um balanço qb crítico de Costa I - "atenuou suavemente as desigualdades sociais, mas foi adiando investimentos e transformações mais profundas" - e deixou um fardo pesado a Costa II. Mais crescimento, menos desigualdades, "clareza, boa gestão e eficácia" na 'bazuca'. Pela sua parte, o Presidente promete ser "o mesmo de há cinco anos". E "o mesmo de ontem". Se houver estabilidade política, ajuda.

Marcelo deixa pesado caderno de encargos: “A reconstrução duradoura é muito mais do que regressar a 2019”

Ângela Silva

Jornalista

O discurso de posse de Marcelo Rebelo de Sousa foi um hino à máxima segundo a qual a sorte dá trabalho. No arranque do seu segundo mandato, o Presidente da República escolheu falar de esperança - "Nunca as nossas mãos ficarão vazias" - mas o caderno de encargos que deixou ao Governo e a si próprio é imenso, tão imenso que fez da aposta na "estabilidade política" um pilar essencial ao seu cumprimento, e o ritmo acelerado em que discursou é de quem entende que não há tempo a perder.

Marcelo prometeu "ser o mesmo de há cinco anos e o mesmo de ontem", mas como o Presidente nem sempre foi igual nos cinco anos do primeiro mandato, a mensagem aconselha leitura fina. O PR promete "convergência no essencial", "espírito de compromisso e estabilidade", "afeto, proximidade e rejeição de messianismos presidenciais", "com qualquer maioria parlamentar". Mas as críticas qb que fez ao primeiro Governo de António Costa e as exigências que lhe colocou na agenda para esta legislatura, falam por si. O Presidente não vê facilidades e não quer facilitar. Disse-o à entrada do Parlamento: "Os segundos mandatos são sempre mais difíceis".

Reconstruir o país depois da pandemia, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa "é muito mais do que regressar a 2019 ou a fevereiro de 2020". E é, espera o PR, a oportunidade para corrigir o que lembrou ter falhado na legislatura anterior, onde viu "uma atenuação suave da pobreza e das desigualdades sociais" e um "adiar de investimentos ou transformações mais profundas em competitividade, infraestruturas, SNS e em parte Justiça".

Agora, com milhões prestes a começarem a chegar de Bruxelas, o Presidente da República avisa que espera do Governo "clareza estratégica, boa gestão, transparência e eficácia", "nunca esquecendo o que a pandemia destapou", seja na "competitividade da economia, na Saúde, na Segurança Social e na sua articulação".

Eis a dupla face da moeda apontada por Marcelo: "Sem economia a crescer é impossível" reconstruir Portugal pós pandemia. "Mas sem corrigir as desigualdades que existem" será "recuperar Portugal só para alguns".

O Presidente elencou cinco missões para este segundo mandato, sendo a primeira continuar a viver em democracia e assegurar "uma melhor democracia". Com "tolerância", "respeito por todos", para além do género, credo, cor da pele ou convicções" - fica a indireta para a direita radical - e sem cedências a "mitos de portugueses puros". Mas melhor democracia também é, recordou o Presidente, ter "alternativas claras na governação com a subida da oposição ao Governo". "Isto é democracia", afirmou.

A segunda missão é o combate à pandemia e aqui Marcelo insistiu ser necessário mais testes, vacinas, e "sensatez" a desconfinar. Aqui, depois de se ter assumido como "supremo responsável" pelo que correu melhor e pior, Marcelo Rebelo de Sousa considerou "justa a indignação dos mais sacrificados" mas também "parcialmente injusta a crítica por tudo o que não se antecipou". "Nuns casos era possível, noutros não", afirmou. Fica a meia culpa.

A segunda missão é começar a "reconstruir a vida das pessoas" nos próximos meses, coisa que o Presidente espera que aconteça "na maior unidade possível". E a terceira, a partir do próximo ano de 2022, é começar a recuperação estrutural do país, a tal fase em que Marcelo espera "muito mais do que regressar a 2019", com eficácia na gestão dos fundos e políticas mais arrojadas do que as que considerou marcadas por avanços "suaves" ou "adiamentos" na anterior legislatura.

A quarta missão é a coesão social. Se a pandemia destapou "vários Portugais", o Presidente quer o Governo a lutar por "um só Portugal", coisa que exige um salto económico robusto, "com mais crescimento, mais investimento, exportações e mercado interno, e mais políticas que corrijam o que o mercado não permite corrigir".

A quinta missão é internacional e passa pela afirmação de Portugal na defesa do multilateralismo, aberto à Europa, a África, às várias Américas, ao oriente e às "novas fronteiras".

Para os anos que se seguem, Marcelo deixou ainda uma frase algo enigmática, em defesa da descentralização, "toda a que os portugueses quiserem".

Sem deixar de lembrar as agruras do primeiro mandato, em que chegou com uma rutura "total" entre quem saíra do poder e quem acabara de entrar, e num ciclo que começou com "sonhos" mas rapidamente se viu confrontado "com medos", de guerras comerciais, xenofobias e menos tolerância, o Presidente falou do último ano do seu mandato como "ano demolidor" e terminou a citar Sophia de Melo Breyner para falar de esperança. Porque "temos de acreditar".

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: AVSilva@expresso.impresa.pt

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