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MNE classifica como “ridícula” notícia sobre “despesas supérfluas” da presidência da UE e garante redução de gastos

MNE classifica como “ridícula” notícia sobre “despesas supérfluas” da presidência da UE e garante redução de gastos
ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Augusto Santos Silva justifica centro de imprensa ‘fantasma’ com a necessidade de se preparar um “cenário híbrido”, com reuniões presenciais e virtuais. As despesas com vinho, camisas e fatos são explicadas pela promoção da marca portuguesa e pelo caráter institucional do semestre. PAN, Chega e Poiares Maduro pedem explicações ao Governo

MNE classifica como “ridícula” notícia sobre “despesas supérfluas” da presidência da UE e garante redução de gastos

Hélder Gomes

Jornalista

Augusto Santos Silva considera “ridícula” a notícia avançada na quinta-feira pelo jornal “Politico” que dava conta de “despesas supérfluas e contratos de patrocínio” realizados no âmbito da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (PPUE). Em conversa telefónica com o Expresso, o ministro dos Negócios Estrangeiros disse que “evidentemente a presidência portuguesa teve de ser preparada para os dois cenários”: um com eventos maioritariamente presenciais e um “cenário híbrido em que a eventos presenciais se somassem eventos virtuais”.

“Este cenário híbrido significa um acréscimo de custos porque as instalações têm de ser redesenhadas por causa das regras sanitárias. Foi preciso investir mais em equipamentos de comunicações e de informática, em sistemas de segurança informática, etc.”, acrescenta o governante. Segundo o “Politico”, a PPUE está a ter “um conjunto de despesas significativas com eventos que, devido à crise sanitária, estão a ocorrer maioritariamente por via eletrónica”.

Com o título “A presidência ‘fantasma’ de Portugal do Conselho da UE acumula despesas presenciais”, o artigo refere despesas num valor superior a 260 mil euros para equipar um centro de imprensa em Lisboa, no Centro Cultural de Belém, a sede da presidência, “apesar de as conferências de imprensa estarem a decorrer online e de jornalistas estrangeiros não estarem a deslocar-se a Portugal”. O “Politico” aponta ainda despesas de mais de 35 mil euros com uma empresa vinícola e um contrato de quase 40 mil euros para a aquisição de 360 camisas e 180 fatos, numa altura em que “poucas pessoas se reúnem” e em que “várias pessoas estão a trabalhar a partir de casa”.

“Não podíamos deixar de ter uma sede de presidência preparada para as reuniões presenciais”, aponta Santos Silva. “O argumento de que montámos um centro de imprensa, que agora não é frequentado porque os jornalistas estão em teletrabalho, é um argumento que não colhe porque evidentemente uma presidência da UE tem de ter instalações para jornalistas, que aliás podem ser dezenas ao mesmo tempo, e equipamentos”, reforça. O ministro fala mesmo em “poupanças de custos” precisamente porque algumas das reuniões de conselhos informais agendadas para fora de Lisboa acabaram por ser virtuais.

Mas por serem sobretudo virtuais as presidências “não deixam de se exercer e de produzir resultados”, sublinha o governante, que contabiliza um total de 900 reuniões realizadas até ao momento em Bruxelas e em Lisboa. “Já tomámos decisões muito importantes e já desbloqueámos muitos processos no âmbito da nossa presidência. Uma presidência que se realiza sobretudo por via virtual é uma presidência tão efetiva como uma presidência presencial”, frisa.

“Fazemos como fazem quase todos”

Quanto aos brindes, Santos Silva confirma que a PPUE tem “um conjunto de ofertas institucionais” e de produtos tradicionais portugueses. “Fazemos como fazem quase todos, mesmo para promover a marca e a cultura portuguesas. Isso custa alguns milhares de euros, que, na minha opinião, são muito bem empregues”, explica. E os fatos são distribuídos aos colaboradores que andam “uniformizados, aqui na presidência portuguesa como nas anteriores”. “Quando estive em reuniões das múltiplas presidências em que já participei, nunca fui transportado por um motorista que estivesse vestido como quisesse, com a sua roupa normal, de jeans ou casaco de ganga, e nunca fui conduzido ao meu lugar por assistentes que estivessem vestidos a seu gosto”, diz. De resto, os fatos foram adquiridos porque “os colaboradores não têm obrigação de comprar os uniformes que vão usar”.

O “Politico” escreve que a assinatura de contratos de patrocínios pela PPUE “vai contra as boas práticas recomendadas pela UE”. A presidência portuguesa assinou este tipo de contratos com a Delta Cafés, a Sumol+Compal e a The Navigator Company. “Não há nenhuma regra, nem nacional nem europeia, que impeça patrocínios. Reduzimos os patrocínios ao mínimo. São patrocínios apenas em espécie e aceitámos os patrocínios que significavam a promoção internacional de produtos ou sectores exportadores portugueses”, justifica-se Santos Silva. A presidência alemã, que antecedeu o semestre português na presidência rotativa do Conselho da UE, rejeitou os patrocínios, em linha com a apreciação da Provedora de Justiça Europeia.

O patrocínio da Navigator é o que levanta mais polémica devido a “potenciais conflitos de interesse” e por se tratar de uma indústria poluente. “A notícia começa por dizer que a Navigator é uma placa giratória de membros do Governo e de políticos. E depois, mais à frente, cita um responsável dessa empresa que diz que, desde que a empresa foi privatizada, não há registo de nenhum trânsito entre a política e a empresa, o que o jornal não contesta mas mantém a sua informação inicial”, aponta Santos Silva.

“A Europa verde não é uma Europa em que o papel vá desaparecer”

O lema da PPUE é ‘Tempo de agir: por uma recuperação justa, verde e digital’. Questionado sobre se o patrocínio da Navigator não conflitua com a transição energética que a presidência portuguesa assume como um dos seus principais desígnios, o ministro diz que não. “A Europa verde não é uma Europa em que o papel vá desaparecer. É uma Europa que usa cada vez mais papel reciclado, que reutiliza ou recicla o produto e que compensa os danos ambientais de uma dada atividade com outras dimensões dessa mesma atividade ou de outras. Compreendo e é inteiramente legítimo que pessoas ou organizações não gostem da empresa ou sector A ou B, mas não acho que isso deva ser política de Estado”, atalha.

Santos Silva acrescenta que “a instrução política era a de usar da maior sobriedade na aceitação de patrocínios” e que esta acontecesse quando “significava a possibilidade de promover internacionalmente sectores importantes da economia portuguesa”. Os ajustes diretos também não causam qualquer sobressalto ao governante, que explica por que motivo a figura foi usada na preparação da presidência. “Muitas vezes, o tipo de serviços ou de bens a que temos de recorrer é tão específico que não há no mercado oferta variada. E o timing que demora um concurso público não é compatível com as obrigações temporais de uma presidência. Não posso correr o risco de chegar a janeiro de 2021 e não ter as instalações montadas, os equipamentos, os serviços porque a contratação começou, os concorrentes preteridos impugnaram, o júri ainda está a analisar as impugnações, etc.”, diz.

“Fortes suspeitas de empresas criadas para beneficiar desses contratos”

Depois de o PAN e de o Chega terem anunciado que iriam questionar o Governo sobre as “despesas supérfluas” a que o artigo do “Politico” alude, Miguel Poiares Maduro abordou esta segunda-feira o assunto numa crónica na TSF. Citando o “Observador”, o ex-ministro de Passos Coelho diz que “pelo menos uma parte significativa dos contratos foi feita pouco antes do início da presidência e consequentemente por ajuste direto”. Ou seja, “mais de 200 contratos, correspondendo a um total de 8 milhões de euros em ajustes diretos”. “O pior é que ficámos também a saber que alguns desses ajustes diretos foram atribuídos a empresas com poucas semanas de existência e sem qualquer atividade anterior. Isto levanta inevitavelmente fortes suspeitas de que essas empresas foram criadas com o simples objetivo de virem a beneficiar desses contratos do Estado”, acusa o antigo governante.

Santos Silva lembra, por sua vez, que na resolução do Conselho de Ministros, que aprovou a organização e criou a estrutura de missão da PPUE, o Governo decidiu, por sua proposta, que o teto de despesa não podia exceder nominalmente a despesa de 2007, ano em que Portugal presidiu ao Conselho da UE pela terceira vez. O ministro compromete-se a reduzir “de largo” essa despesa em 10%, até porque “há despesas que o Estado deixa de ter por as reuniões não serem presenciais”.

A PPUE, a quarta vez que Portugal preside ao Conselho da UE, arrancou a 1 de janeiro e termina a 30 de junho.

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