Ministro descarta reforço militar na República Centro-Africana e aponta formação em Moçambique para abril
NUNO BOTELHO
O contingente português na RCA é “extremamente valioso no quadro de uma Força de Reação Rápida” e continuará “a desempenhar essas funções”. É “aquilo que nos pedem”, sublinhou João Gomes Cravinho. Quanto à repressão da violência na província moçambicana de Cabo Delgado, o ministro da Defesa adiantou que as Forças Armadas de ambos os países estão a trabalhar para que “em breve possa começar no terreno o trabalho de formação”
Um eventual reforço dos militares portugueses na República Centro-Africana (RCA) está, para já, descartado. A Missão Multidimensional Integrada das Nações Unidas para a Estabilização da RCA (MINUSCA) pediu esta quinta-feira à ONU um reforço de até três mil efetivos, mas o ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, afastou a hipótese de mobilizar mais efetivos portugueses. O pedido, feito pelo major-general Paulo Maia Pereira, que no início da semana tomou posse como segundo comandante da MINUSCA, “está a ser examinado no Conselho de Segurança das Nações Unidas”, disse o ministro.
O contingente português, “extremamente valioso no quadro de uma Força de Reação Rápida”, continuará “a desempenhar essas funções”. É “aquilo que nos pedem”, sublinhou Gomes Cravinho, à margem de uma visita ao Comando Conjunto para as Operações Militares (CCOM), em Oeiras, onde está instalado o grupo de apoio ao coordenador do grupo de trabalho do plano de vacinação contra a covid-19, o vice-almirante Henrique Gouveia e Melo. Além do ministro e do coordenador, estiveram presentes a ministra da Saúde, Marta Temido, e o chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, o almirante António Silva Ribeiro.
A “enorme eficácia do contingente português que lá está” é “reconhecida por todos”, sustentou o ministro. “São cerca de 200 militares num quadro de 11 mil”, tendo “um impacto desproporcional em relação à MINUSCA como um todo”. Portugal tem atualmente 243 militares na RCA, dos quais 188 integram a MINUSCA e 55 a missão de treino da União Europeia (EUTM), liderada pelo brigadeiro-general Paulo Neves de Abreu.
Desde que assumiu o comando em setembro do ano passado, para um mandato de um ano, o brigadeiro-general destaca a formação de mais de 2000 militares, o que “constitui um progresso muito significativo”. Ainda para mais tendo em conta que desde dezembro passado, altura da primeira volta das eleições presidenciais e legislativas, se instalou “um clima de insegurança em todo o país”, acrescenta, em declarações ao Expresso. Esta é a segunda vez que Portugal assume o comando da EUTM.
A RCA mergulhou no caos e na violência em 2013 na sequência da deposição do então Presidente, François Bozizé, por grupos armados, o que suscitou a reação de outras milícias. Desde então, o território tem sido palco de confrontos comunitários, que obrigaram quase um quarto dos 4,7 milhões de habitantes do país a abandonarem as suas casas.
Em dezembro do ano passado, seis grupos armados rebeldes que ocupam dois terços da RCA juntaram-se na autodenominada Coligação de Patriotas para a Mudança. No dia 19 daquele mês, uma semana antes das eleições, anunciaram uma ofensiva para impedir a reeleição do Presidente, Faustin-Archange Touadéra. No entanto, Touadéra viria a ser declarado reeleito a 4 de janeiro numa votação contestada pela oposição.
No caso das legislativas, com uma segunda volta ainda sem data marcada, 118 assentos parlamentares continuam por preencher, depois de o Tribunal Constitucional da RCA ter validado a eleição de 22 deputados na primeira volta.
Questionado esta sexta-feira, à margem da visita ao CCOM, sobre os militares portugueses que vão formar as tropas especiais de Moçambique, Gomes Cravinho falou em “desenvolvimentos quotidianos”. “As Forças Armadas portuguesas e moçambicanas estão a trabalhar no desenho da parte que lhes toca para que, em breve – esperemos que durante o mês de abril –, possa começar no terreno o trabalho de formação", precisou. Tratar-se-á de “uma missão de formação de comandos e fuzileiros, portanto tropas especiais moçambicanas”, “para que as Forças Armadas e de Defesa de Moçambique tenham todas as características necessárias para o desempenho da soberania no seu próprio país”.
A província de Cabo Delgado está sob ataque desde outubro de 2017 por grupos de insurgentes ligados a organizações islâmicas radicais e classificados, desde o início do ano passado, pelas autoridades moçambicanas e internacionais como uma “ameaça terrorista”.