31 janeiro 2021 8:16

Um líder de extrema-direita “ganhar na terra dos comunistas” faz pensar, diz um alentejano que votou em André Ventura e que já foi eleitor do PCP. Viagem de Moura a Cascais pelos votos contra o sistema
31 janeiro 2021 8:16
O monumento ao trabalhador rural destaca-se na praceta da Junta de Freguesia de São Vicente e Ventosa, uma das quatro freguesias alentejanas onde André Ventura foi o mais votado nas eleições presidenciais do último domingo. O sino da igreja anuncia a uma da tarde e ainda há de pontuar o resto do dia a cada 15 minutos. A chegada de forasteiros leva os cachorros a saírem para a rua por uma pequena entrada rasteira no portão da casa da “Maria José do marroquino”. O presidente da Junta está em confinamento, “também lhe calhou agora a ele”. “Desta vez, houve aqui uma surpresa com o Ventura”, diz ao Expresso o vice-presidente, Edgar Eufémia. Num universo de 270 votantes, 113 escolheram o candidato do Chega e 110 Marcelo Rebelo de Sousa. Há cinco anos, o independente Sampaio da Nóvoa ficou em primeiro, com mais 20 votos que Marcelo. Edgar Eufémia atribui o sucesso de Ventura à “falta de votantes”. “As pessoas que costumam vir não vieram com medo do vírus. A parte nova que veio votar foi o que lhe trouxe a vitória.”
Um pouco mais abaixo, Maria José Pedro explica o enigma do marroquino da sua vizinha homónima: “Foi um nome que lhe puseram. É de ser assim muito alvadio, uma pessoa com muita vida.” Agora com 70 anos, Maria José está reformada desde 2003. Um acidente de trabalho levou-lhe a mão esquerda, quando estava “a secar milhos”. “Ainda trabalhei na zona agrária, então era aquela coisa do comunista. Mas depois fui trabalhar por conta do Estado e mudei de ideias, passei para o socialista”, recorda. Quando o “professor Marcelo entrou”, como “gostava muito de o ouvir na televisão”, votou “para ele”. No domingo voltou a fazer o mesmo. Nunca pensou em votar Ventura: “Encontrava o homem muito alvoroçado por tudo. Não gosto daqueles gritos que ele dá.” Parece que tinha medo do homem. “Mas esta mocidade gosta muito dele. A minha neta diz que ele é que é bom para ser Presidente”, contrapõe. Apesar de já ter perdido o companheiro de uma vida, Maria José não tem razões de queixa, mas reconhece que a freguesia “está muito ‘envelhada’”. Em São Vicente não terá sido pelo discurso antagonista em relação aos ciganos que Ventura conseguiu mais votos. “Aqui não temos comunidade cigana. De momento não há ninguém”, garante o vice-presidente da Junta.