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Costa aposta no diálogo (lembrando visita à Hungria) e no sector social para o futuro da UE: “Para rutura já chegou o Brexit”

Costa aposta no diálogo (lembrando visita à Hungria) e no sector social para o futuro da UE: “Para rutura já chegou o Brexit”
GONZALO FUENTES/REUTERS

O Governo definiu a Europa Social como "o foco" e "o coração" da presidência portuguesa e espera ver aprovada na Cimeira Social marcada para maio, no Porto, uma declaração sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais em que os 27 assumam que o emprego, as competências e a proteção social são elementos centrais da recuperação económica da UE

O primeiro-ministro, António Costa, define a aposta da presidência portuguesa no social como "crítica" para assegurar que "ninguém fique para trás" nas mudanças que a digitalização e as alterações climáticas vão impor à economia.

Em entrevista à Lusa sobre a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE), neste primeiro semestre de 2021, o primeiro-ministro aponta também o desenvolvimento da Europa Social como "absolutamente essencial" para "dar confiança" aos cidadãos e, dessa forma, esvaziar a agenda do populismo.

O Governo definiu a Europa Social como "o foco" e "o coração" da presidência portuguesa e espera ver aprovada na Cimeira Social marcada para maio, no Porto, uma declaração sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais em que os 27 assumam que o emprego, as competências e a proteção social são elementos centrais da recuperação económica da UE.

"Este é um tema crítico porque, como temos visto, os desafios que nos são colocados pelas alterações climáticas e pela transição digital requerem um fortíssimo investimento na formação, na requalificação profissional, para que ninguém fique para trás, um fortíssimo investimento em inovação, para que as pequenas e médias empresas possam ter uma oportunidade de crescer e de se inserir nas cadeias de valor global a partir dos mercados digitais, e exigem uma proteção social sólida que assegure que ninguém é sacrificado", afirma.

António Costa insiste que o desenvolvimento do Pilar Social, através de um plano de implementação, é "um instrumento fundamental para que todos tenham oportunidades e ninguém fique para trás" e "absolutamente essencial para dar a todos confiança nos desafios das alterações climáticas e da transição digital". "A falta de confiança gera medo e o medo é o que mais alimenta o populismo, portanto, reforçar o pilar social é mesmo a melhor arma que temos para combater o populismo", afirma.

Este desenvolvimento da agenda social é apontado pelo primeiro-ministro como um de três grandes 'dossiers' cuja resolução o deixaria "satisfeito" no final da presidência, a par de uma recuperação económica "no terreno" e, no plano externo, de uma "tradução efetiva" da parceria com África e da abertura de uma parceria com a Índia.

"Para rutura já chegou o Brexit": PM defende diálogo a 27

As divergências dentro da União Europeia (UE) existem e devem ser assumidas e resolvidas através do diálogo, defende o primeiro-ministro, António Costa, frisando que "para rutura já chegou o 'Brexit'".

Para o primeiro-ministro, o que é "justo" é dizer que, nesta crise, a Europa deu "uma resposta célere e assertiva" e "demonstrou grande capacidade de liderar", de que são "marcos muito simbólicos" a "compra conjunta de vacinas" e o "passo de gigante" de avançar para uma emissão conjunta de dívida para financiar a recuperação.

António Costa admite que persistem diferenças entre os 27, mas frisa que essa é "uma realidade" que se deve "assumir sem dramas e com toda a tranquilidade".

"É muito claro que, hoje, os 27 Estados-membros não têm todos a mesma visão sobre o que a Europa deve ser, nem sequer têm todos a mesma vontade que a Europa seja aquilo que já é. [...] Porventura, a presença do Reino Unido escondeu muitas destas posições nacionais, que ficaram, digamos, a descoberto com a saída do Reino Unido", afirma, exemplificando com as diferenças em temas como as migrações ou a solidariedade orçamental.

Para Costa, "seria mau" procurar "fingir que não existem essas divergências", porque "os problemas só se resolvem quando são assumidos e se conversa francamente sobre eles".

"Não obrigar ninguém a fazer movimentos que não quer fazer, criando situações de rutura. Para rutura já chegou o 'Brexit' e ninguém quer novos processos de rutura", afirma.

Já quanto às fricções a propósito do respeito pelo Estado de direito, que motivaram aliás um bloqueio da Hungria e da Polónia à aprovação do orçamento e do Fundo de Recuperação, só ultrapassado na Cimeira de dezembro, o primeiro-ministro assegura que essa "é mesmo uma das linhas vermelhas", porque "o Tratado da União Europeia é muito claro".

O tema, frisa, é "particularmente sensível" para Portugal, porque "o que motivou a adesão de Portugal à União Europeia, não foi propriamente a existência do euro, que nem sequer existia, ou do mercado interno, que não existia", foram "mesmo os valores" que permitiram que fosse "consolidada a liberdade e a democracia".

Sobre as críticas de que foi alvo quando em julho visitou o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, em Budapeste, e defendeu que as violações do Estado de direito devem ser abordadas como estipulam os tratados e não servir para condicionar fundos, António Costa afirma que "não se arrepende" da visita, que foi "bastante útil" para haver acordo no Conselho Europeu de julho.

"Eu fui à Hungria pela mesma razão de que fui a Haia. Fui tratar de desbloquear os dois grandes obstáculos que existiam para podermos ter em julho, como conseguimos ter, um acordo sobre o programa de recuperação. Em Haia, fui falar com o chefe dos 'frugais' [o primeiro-ministro holandês, Mark Rutte], na Hungria falei com o inspirador do grupo de Visegrado", Viktor Orbán, nota.

"Não me arrependo de nenhuma dessas visitas e ambas as visitas foram bastante úteis para ter sido possível um acordo em julho no Conselho, para ter havido agora um acordo entre a presidência alemã e o Parlamento Europeu e para o Conselho Europeu ter aprovado aquilo que aprovou", sublinha.

E insiste: "Não podemos ser 27 e não falarmos a 27. Quando a decisão tem de ser por unanimidade, não vale a pena ter a ilusão de que é possível ter unanimidade, recusando-nos a falar com um ou com outro. Temos que falar com todos e encontrar o ponto de entendimento entre todos".

O primeiro-ministro frisa, a propósito, a importância de ter sido superado o impasse, apontando que se "agora o que se discute é se o dinheiro chegar em junho vem tarde", o que seria "se estivéssemos a discutir não termos esse acordo".

"Quando é preciso unanimidade, só há uma forma, é haver um compromisso. Naturalmente, tentar compreender quais são os pontos de vista dos outros, fazer os outros compreender os nossos pontos de vista e encontrar qual é o ponto de entendimento", conclui.

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