Política

O longo cortejar entre PCP e PS ainda tem fim incerto. O que encalha as conversas no Orçamento

O longo cortejar entre PCP e PS ainda tem fim incerto. O que encalha as conversas no Orçamento
Luís Barra

Negociações entre as duas partes acontecem mesmo enquanto decorrem as votações do Orçamento do Estado. PCP e PS adiam sistematicamente, desde sexta-feira, a votação de algumas das propostas mais importantes na tentativa de encontrarem compromisso. Estas são as chaves da aprovação do Orçamento (e também o que já foi acordado)

O longo cortejar entre PCP e PS ainda tem fim incerto. O que encalha as conversas no Orçamento

Liliana Valente

Coordenadora de Política

Desde sexta-feira que, assim que começam as votações do Orçamento do Estado, há pedidos de adiamento de votações. O expediente é habitual neste tipo de votações, mas quando é usado de forma repetida pelos mesmos intervenientes é sinal que algo se passa nos bastidores. E tem sido assim com os deputados do PCP, PS (e também PAN), que vão pedindo para que sejam adiadas algumas propostas. Sempre as mesmas. De amanhã não passa, lembrou esta terça-feira o presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Filipe Neto Brandão. Mas até amanhã ainda vai uma tarde e uma noite, e mais uma ronda de conversas e trocas de informação. Mas afinal o que separa estes partidos?

Apesar de já estarem estabelecidos alguns acordos, sobretudo na área da saúde (já lá vamos), quase todas as outras propostas importantes do PCP ainda não foram votadas. A fúria de adiamentos é tal que, por causa dos pedidos dos comunistas e dos socialistas, as poucas propostas do Bloco de Esquerda que faltavam também só serão votadas na quarta-feira, último dia para a votação na especialidade.

Olhando para as propostas que só aí serão votadas, ainda há um mundo que separa PCP e PS seja nos subsídios de risco, extraordinários e permanentes, seja na nova prestação social ou no pagamento dos salários em layoff (apesar de o PS ontem já ter apresentado uma proposta para se aproximar dos comunistas).

Em detalhe, são estas as propostas em negociação:

Suplemento de penosidade e insalubridade - O PCP quer um subsídio permanente para funcionários públicos com profissões de risco de cerca de 20% do salário base. O PS concorda com o princípio de instituir este subsídio, mas quer um valor fixo entre 3 e 4,6 euros por dia. A proposta do PCP, segundo os socialistas, faria disparar a despesa quer da Administração Central, quer da administração local (e este é um ponto a que o PCP é sensível);

Suplemento remuneratório para as carreiras especiais - Ainda não há acordo sobre este suplemento de risco para as forças e serviços de segurança, bem como na saúde, na justiça, na proteção civil e socorro;

Subsídio extraordinário de risco no combate à pandemia da doença Covid-19 - Ainda na onda dos suplementos e subsídios, este tem sido o mais debatido. O Governo propõe que o pessoal da saúde que esteve na linha da frente receba mais 20% da remuneração base mensal com o limite de 50 % do valor do IAS, em estado de calamidade, urgência ou emergência. O PCP defende que devem ser todos os trabalhadores de serviços essenciais. Este é uma das propostas que o Governo receia que possa resultar numa coligação da oposição;

Novo apoio social - Será, por ventura, a medida mais negociada entre o Governo e os partidos à esquerda. O apoio extraordinário para quem perdeu rendimentos está a ser esmiuçado ao detalhe, seja no âmbito, seja no valor a conceder aos beneficiários. Foi este apoio extraordinário que levou também à rutura com o Bloco de Esquerda e que tem várias propostas de alteração, incluindo dos bloquistas;

Majoração do subsídio de desemprego e do subsídio por cessação de atividade - Há ainda um mar que divide as duas propostas. O Governo propõe uma majoração de 10% do valor diários dos dois subsídios, sempre que os dois membros de um agregado familiar tenham ficado desempregados - ou com o subsídio de cessação de atividade e para as famílias monoparentais. O PCP propõe uma majoração de 25%;

Prazo de garantia do subsídio de desemprego - Tanto o PCP como o BE têm propostas para alterar os prazos de acesso aos subsídios de desemprego e social de desemprego. A intenção é reduzir os tempos que os contribuintes tiveram de trabalhar para poderem aceder aos dois subsídios e, com isso, conseguir abranger mais beneficiários;

Programa de apoio ao trabalho artístico e cultural - Para ser votado amanhã fica também a criação de um programa de apoio ao trabalho artístico e cultural, destinado às artes performativas, às artes visuais, artes de cruzamento disciplinar e à exibição alternativa de cinema;

Investimentos nos Cuidados de Saúde Primários - O PCP pediu o adiamento de uma proposta do próprio partido que prevê um investimento nos cuidados de saúde primários de 150 milhões de euros, não só para a aquisição de material como contratação de pessoal;

Reforço da formação médica especializada - A proposta dos comunistas prevê que até ao final do primeiro semestre, o Governo tenha de ter realizado um concurso excecional que permita o "acesso à formação médica especializada pelos médicos internos que, a partir de 2015, inclusive, não tiveram acesso por falta de capacidades formativas";

Pagamento de salários em layoff - Ao segundo dia, o PS alterou a proposta que tinha entregue para passar a prever, de forma efetiva que os salários para quem está em layoff são pagos a 100%. Uma medida para se aproximar do PCP. Contudo, os comunistas pediram para adiar todas as propostas sobre este tema para quarta-feira.

O último dia de votações na comissão de orçamento e Finanças será assim definidor do que acontecerá na votação final. Mesmo assim, os comunistas já conseguiram várias conquistas, sobretudo na Saúde, com a contratação de médicos de família, intensivistas ou investimentos nos cuidados de saúde primários. Alcançaram também a contratação de mais cinco mil funcionários para as escolas. No fim se saberá qual a fatura imposta pelos comunistas para se absterem neste Orçamento do Estado. Isto, claro, caso o PS aceda às reivindicações.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: lvalente@expresso.impresa.pt

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