A palavra de ordem é tentar um consenso o mais alargado possível e o Presidente da República aproveitou hoje a presença da comunicação social em Belém para uma homenagem aos ciclistas portugueses que estiveram na Volta a Itália para insistir nesse ponto. "Há medidas que foram mais fáceis de tomar há oito meses do que agora. É preciso um consenso parlamentar a social para que essas novas restrições sejam eficazes", afirmou o Presidente, acrescentando que "é preciso as pessoas perceberem se sim ou não há razões para pôr outra vez o pé no acelerador na proteção da vida e da saúde".
"Este equilibrio justifica o porquê da calibragem nas medidas", concluiu Marcelo, admitindo falar ao país na próxima semana, depois do primeiro-ministro fazer já no sábado.
"Ele expôs-me as ideias que tem, vai ouvir sobre essas ideias os partidos politicos amanhã, vai reunir o conselho de ministros extraordinário no sábado, falará ao país no sábado a dizer as medidas para que aponta o Governo e qual o roteiro para essas medidas", explicou o Presidente da República. "E depois eu admito eventualmente dizer alguma coisa ao país no decurso da semana que vem".
As medidas já anunciadas pelo Executivo e a certeza de que se terá que ir mais longe, avançando com medidas diferentes para zonas diferentes do país mas que possam incluir o recolher obrigatório, a proibição de circular entre concelhos ou de sair ou entrar em determinados concelhos que os mapas locais confirmem ser de maior risco, estão a ser postas em xeque pelos constitucionalistas .
Jorge Miranda, Paulo Otero, Bacelar Gouveia e Vitalino Canas desmultiplicaram-se nas últimas 24 horas em declarações apontando inconstitucionalidade óbvia ao recolher obrigatório sem que antes tenha sido decretado o estado de emergência. Mas nem o Presidente da República nem o primeiro-ministro querem dar já esse passo. Costa foi, aliás, contra o estado de emergência em março e mesmo Marcelo, que na altura o defendeu, mostra-se hoje mais cauteloso.
Por um lado, o Presidente sabe que da última vez em que decretou este estado de exceção, o PCP votou contra e não é certo que seja fácil um consenso parlamentar em torno de um novo recurso a essa figura legal. Por outro lado, Marcelo também está atento aos movimentos de contestação às restrições dos cidadãos que estão a acontecer noutros países e, a dois meses de ir a votos, a última coisa que lhe convém é avançar unilateralmente com decisões que o ponham no olho do furacão a ser contestado.
Muito críticos da forma como o Governo tem estado a avançar, com cobertura do Presidente da República, com medidas que dizem "roçar a inconstitucionalidade", os constitucionalistas citados também criticam os políticos por não se terem prevenido e terem agora, eventualmente, que remediar.
"O estado de calamidade não está previsto na Lei de Proteção Civil para casos de pandemia. Quanto muito devia-se consagrar na lei o estado de emergência sanitária e mesmo aí há dúvidas se chega para cobrir tudo", afirmou ao Expresso Paulo Otero, ex-juiz do Tribunal Constitucional. Na sua opinião, a situação exigia uma "micro revisão constitucional". E os políticos não são poupados.
"Em abril devia-se ter prevenido o que aí vinha e pensado na cobertura dete tipo de medidas", conclui o constitucionalista. Vitalino Canas também não tem dúvidas: "O que está na lei ordinária não foi pensado para isto nem para restrições desta dimensão", afirmou ao Expresso. Um e outro recomendam uma clarificação e harmonização no atual quadro jurídico.
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