Política

"Assim, sim." Rio partilha tweet com estudo sobre racismo, mas continua em silêncio sobre ameaças

"Assim, sim." Rio partilha tweet com estudo sobre racismo, mas continua em silêncio sobre ameaças
RUI MANUEL FARINHA/LUSA

Rui Rio publicou um post do seu vice-presidente David Justino. Catarina Martins disse que este caso deve envergonhar quem admite dialogar com forças que "normalizam criminosos". Ou seja, porque Rio que não fecha a porta a acordos com o Chega

"Assim, sim." Rio partilha tweet com estudo sobre racismo, mas continua em silêncio sobre ameaças

Liliana Coelho

Jornalista

"Assim, sim." Rio partilha tweet com estudo sobre racismo, mas continua em silêncio sobre ameaças

Vítor Matos

Jornalista

Enquanto todos os partidos condenaram as ameaças racistas que visaram deputadas e ativistas, Rui Rio remeteu-se ao silêncio. Apesar de se encontrar de férias no Minho, o líder social-democrata já fez uma pausa para comentar, na rede social Twitter, o novo contrato polémico do Novo Banco ou a lotação da "Festa do Avante!". Sem comentar o caso da vigília de extrema-direita, o líder do PSD limitou-se a partilhar na sua conta um post do seu vice-presidente David Justino, a recomendar a leitura de um estudo sobre racismo.

"Se quiserem discutir o racismo a sério, ou seja, para além dos acontecimentos e agendas, leiam primeiro o mais recente trabalho do Tiago Santos que é das investigações mais honestas que têm sido feitas em Portugal sobre o racismo", escreveu Justino. "Assim, sim", comentou o líder do PSD.

Contactada pelo Expresso esta sexta-feira (antes de o tweet ser publicado), a assessoria de Rio explicou que não havia nada a comentar, uma vez que o "Ministério Público está a investigar o caso".

Do mais próximos de Rui Rio, quem reagiu mais cedo à parada racista, logo no dia 11 de agosto, foi o vice da bancada parlamentar André Coelho Lima: "Mas o que vem a ser isto!??", escreveu, também no Twitter. "Porventura Portugal agora é um país intolerante a outra raças?? Após séculos de História a demonstrar o contrário?? Não se transforme o meu país em algo que ele nunca foi e - já agora - se se querem manifestar por algo, assumam-no! Aqui pode-se!!" E também o deputado Duarte Marques, que falou à TSF num caso que é "uma ameaça inadmissível" e um "caso de polícia, além de revelar uma grande cobardia". Segundo este ex-líder da JSD, "os partidos políticos e os portugueses devem estar todos ao lado das pessoas que estão ameaçadas".

O estudo partilhado por Rui Rio, não permite, no entanto, perceber o que pensa o líder do PSD da vigília da extrema-direita contra o SOS Racismo ou das ameaças às deputadas e ativistas. Na conclusão do estudo de Tiago Santos, membro do Observatório das Migrações - citado pelo vice-presidente do PSD - define-se o perfil das camadas sociais com mais tendência para o racismo, ou seja, será um fenómeno não estrutural como Rio defende: "Coisa vocalizada sobretudo de pessoas mais velhas, pobres, pouco educadas, isoladas nas margens das grandes cidades, e avessas à mudança. Numa palavra, o perfil assim revelado corresponde ao das pessoas que no referendo realizado no Reino Unido a 23 de junho de 2016 votaram a favor do Brexit". Para Tiago Santos, o racismo "é um aspeto parcelar de um todo mais abrangente" e cita Plauto e a "regra segundo a qual 'um homem é um lobo, não um homem, para outro homem que ele ainda não conheceu'", e a seguir remata: "Mas o pessimismo antropológico, como vimos, vai de par com o racismo, pelo que é melhor não irmos por aí".

Quem ontem não ignorou este silêncio foi a coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), que disse que este caso deve envergonhar quem admite dialogar com outras forças que "normalizam criminosos". Sem mencionar inicialmente o nome de Rui Rio, Catarina Martins referia-se ao líder do PSD que não fecha a porta a acordos com o Chega.

"Tenho reparado nos últimos tempos que houve responsáveis políticos que acharam que podiam ser complacentes com o crime e normalizar o crime. Quem atenta contra os Direitos Humanos é criminoso e, portanto, sim. Este é um caso de polícia e só envergonha as pessoas que na política tentaram normalizar criminosos", declarou esta sexta-feira Catarina Martins à margem de uma reunião com trabalhadores da Ryanair no Porto.

Perante a insistência dos jornalistas, a coordenadora do Bloco sublinhou que se estava a referir àqueles que "acham que podem dialogar com forças que apelam ao ódio ou à violência ou que usam intimidação como arma política. Julgo que haverá agora no PSD quem se arrependa do que tem vindo a dizer e a normalizar até agora."

Catarina Martins disse, contudo, acreditar que Rui Rio – que nega a existência de racismo estrutural no país à semelhança de André Ventura ou do PCP – não teria "perceção do que estava a acontecer", não acreditando que fosse "complacente com o crime".

Partidos unânimes na condenação às ameaças

O PAN repudiou de imediato as ameaças racistas a deputadas e ativistas e pediu uma "punição exemplar" a todos os responsáveis. Numa reação a pedido do Expresso, o partido liderado por André Silva manifestou a sua "total solidariedade" para com todos os alvos destas ameaças e apelou às autoridades competentes para garantirem a sua segurança.

"Não podemos tolerar que por via do medo se tente o silenciamento de titulares de cargos políticos, de ativistas, de partidos políticos e de associações que atuem no respeito pela Constituição e pelas regras do jogo democrático", afirma o PAN.

Também o PCP condenou a manifestação que ocorreu no sábado junto à sede da associação SOS Racismo, em Lisboa, assim como as ameaças de que foram alvo deputadas e ativistas. E apelou à “intervenção firme” no combate à intolerância e ao racismo. "A ação fascizante que se desenvolve há anos, que tem no racismo uma expressão, é hoje inseparável da promoção dada a forças reacionárias e populistas", afirmou ao Expresso fonte oficial do PCP.

Para os comunistas, a situação exige uma "intervenção determinada e firme de combate à intolerância e às ações de confronto com valores e princípios democráticos e com a própria Constituição da República”.

Do lado do CDS, Francisco Rodrigues dos Santos defendeu que os grupos de extrema-direita com as suas agendas racistas e xenófobas “não podem ser tolerados” no país e lamentou ainda que recentemente alguns partidos tenham tentado normalizar “discursos bárbaros”, em linha com Catarina Martins. “O resultado está à vista”, observou o líder centrista.

"Uns e outros, que instrumentalizam estes fenómenos para sua afirmação, apesar de representarem uma franja ultraminoritária da nossa sociedade, devem ser corajosamente reprimidos e censurados", insistiu.

Também o líder da Iniciativa Liberal, João Cotrim de Figueiredo manifestou “solidariedade” para com as deputadas que foram alvo de ameaças e pediu celeridade na investigação.

Nem mesmo André Ventura deixou de comentar o caso. Inicialmente desvalorizou as ameaças às três deputadas, afirmando que quando ele ou o seu partido são ameaçados ninguém se preocupa. "Quando são estes coitadinhos, toda a gente chora e grita. Miserável país!", escreveu o líder do Chega no Twitter. Mas depois, recuou e, em declarações à Lusa, disse que todas as ameaças dirigidas a deputados ou outros agentes políticos "merecem a mais viva reprovação" do Chega,"tenham ou não teor racista".

Em causa está o email que foi enviado a três deputadas e a mais sete ativistas e dirigentes de associações antirracistas: Danilo Moreira, Mamadou Ba, Jonathan Costa, Rita Osório, Vasco Santos, Luís Lisboa e Melissa Rodrigues em que a "Nova Ordem de Avis - Resistência Nacional" fez ameaças diretas aos visados e aos seus familiares.

A mensagem referia que os visados teriam 48 horas para abandonar o país e que agosto será "o mês do reerguer nacionalista". O caso já está a ser investigado pelo Ministério Público.

Notícia atualizada com a informação sobre o post de André Coelho Lima às 12h20 e depois com as declarações de Duarte Marques.

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