Política

Responsabilidade “uma dúzia de vezes” é a resposta de Centeno à esquerda e à direita

Responsabilidade “uma dúzia de vezes” é a resposta de Centeno à esquerda e à direita
MANUEL DE ALMEIDA/Lusa

Bloco de Esquerda diz que “sucesso” de Centeno é um “rolo compressor que passa a ferro” os outros ministros. PCP aponta para a “estagnação” do investimento público

Responsabilidade “uma dúzia de vezes” é a resposta de Centeno à esquerda e à direita

Liliana Valente

Coordenadora de Política

A resposta é política, apesar de, ao longo das respostas aos partidos, Mário Centeno ter debitado vários números para cimentar a sua visão do que é o Orçamento do Estado para 2020. "Responsabilidade" foi invocada "uma dúzia de vezes" para responder à esquerda, ao BE e PCP, e à direita, ao PSD, para garantir que este orçamento não dá "um passo maior do que a perna" e não entra em "devaneios sobre promessas que depois não conseguimos honrar".

Mário Centeno apresentou-se na Assembleia da República esta segunda-feira de manhã sem dar novidades aos antigos parceiros ou sem lhes abrir a porta a novas medidas. Os deputados do BE e do PCP, Mariana Mortágua e Duarte Alves, pediram mais, criticaram o garrote orçamental, mas, na volta do correio, o ministro das Finanças não saiu do guião que levava preparado para todas as dúvidas dos partidos, desde o IVA da eletricidade, as actualizações dos salários da função pública, as injecções no Novo Banco ou o investimento público.

No primeiro minuto da intervenção da deputada Mariana Mortágua percebeu-se logo qual o estado da arte nas conversas com o Governo - amanhã haverá nova reunião com o primeiro-ministro e os lideres dos dois partidos. Nenhum está a sair das suas posições: "Nos anos anteriores estas audições eram feitas para discutir as medidas negociadas e que já estavam no Orçamento. Este ano podemos passar essa fase à frente e poupamos tempo", ironizou Mariana Mortágua.

IVA da eletricidade

A deputada apontou a Centeno a escassez de "medidas concretas", mas também "as intenções que não têm tradução na lei e as formulações na lei que são processos de intenção". A maior de todas: o IVA da eletricidade. O BE insiste que no documento não pode ficar apenas uma autorização legislativa para que o Governo crie escalões de IVA diferentes consoante o consumo, dependendo da autorização de Bruxelas. Centeno nem falou sobre o assunto.

Salários da Função Pública

Depois, para o BE, a "valorização dos salários dos funcionários públicos é uma afronta". O mesmo disse a deputada do PCP Diana Ferreira. Na resposta, Centeno tinha números para dar, mas nenhum que permitisse abrir a bolsa do orçamento para um aumento maior: "Teremos um aumento real das remunerações pagas em oito pontos percentuais acima da inflação [dos últimos 5 anos]. É a maior recuperação de rendimentos em mais de 30 anos".

Assunto fechado para o ministro e neste ponto a diferença entre Governo, BE e PCP parece não ser possível de fechar.

Investimento público e cativações

Também não há grande aproximação no que ao investimento público e à execução de despesa pública diz respeito. Mariana Mortágua acusa Centeno de não ter "contas claras" e de fazer uma "péssima execução da despesa pública". A bloquista quer saber qual o nível de cativações de 2019 e quais as previstas para 2020 uma vez que estas são em parte "prova do seu sucesso", disse a Centeno. Contudo, acrescentou, "o seu sucesso é um problema porque é um rolo compressor que passa a ferro os outros ministros". Na primeira ronda de perguntas, o ministro das Finanças não respondeu sobre cativações.

Outro dos temas caros à esquerda é o investimento público. Feitas as contas à inflação, disse o deputado Duarte Alves do PCP, "há uma estagnação do investimento público" numa altura em que há muitas necessidades.

Centeno tem outras contas, diz que "o investimento cresceu em termos reais 28%. Não existe neste século um período tão acentuado do investimento" como este. Sobretudo na saúde. Já na segunda ronda de perguntas dos partidos, Centeno diz que as cativações de 2020 "são iguais às de 2019" não dando, no entanto um valor final para as que foram executadas no ano passado.

Serviço Nacional de Saúde

É o ponto que mais une os três vértices deste triângulo entre o Governo, BE e PCP. Mesmo assim, o BE pede mais investimento em equipamentos de saúde. Centeno responde que o que está no orçamento para o SNS, 940 milhões de euros a mais, já é "acima do valor que o BE tinha lançado como desafio. Com o dinheiro, disse, chegará também maior exigência de rigor na gestão na saúde. Tal como "responsabilidade", esta frase foi repetida várias vezes por Centeno.

Novo Banco

Mário Centeno não abre o jogo sobre o que será a injecção de capital no Novo Banco. Mariana Mortágua notou que há uma previsão de 600 milhões de euros que não bate certo com os 850 milhões de euros de autorização de despesa e ainda menos com os 1200 milhões de despesa prevista pelo Fundo de Resolução. Centeno, responde que tem como estimativa uma injecção de 600 milhões de euros, mas que tem no orçamento os 850 milhões que "decorrem do contrato". Contas que, garante, "não interferem nos cálculos orçamentais que o Governo faz"-

Esta ano de 2019, anunciou Centeno, não houve no entanto qualquer injecção devido a activos por impostos deferidos no Novo Banco. Para este ano está prevista uma despesa de 130 milhões de euros, mas o ministro não indica a que banco se destina.

IRS

O PCP insiste na ideia que é preciso aumentar a progressividade do IRS. Tendo ficado uma mexida nos escalões para o ano, o deputado Duarte Alves perguntou a Centeno como é que pode haver mais progressividade "mantendo o número de escalões, actualizando abaixo da inflação o mínimo de existência?". O comunista quer perceber como é que se salvaguarda os rendimentos mais baixos e intermédios uma vez que, tal como os restantes escalões, o mínimo de existência não é actualizado à inflação esperada para 2020, mas de Novembro deste ano.

No geral, a esquerda difere de Centeno na leitura global do Orçamento. Para o ministro, os anteriores eram até "mais exigentes do que este" quanto à gestão orçamental. "É muito mais progressista no sentido de conseguir avanços do que os outros", defendeu.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: lvalente@expresso.impresa.pt

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