28 novembro 2019 14:48

miguel a. lopes
Não têm sido dias fáceis para o Livre. O mal estar interno é evidente e já levou a uma demissão. Direção do partido mantém a confiança na deputada Joacine Katar Moreira, que avisou que não é “descartável”. Mas o caso será ainda analisado pelo Conselho de Jurisdição. As polémicas podem não ficar por aqui
28 novembro 2019 14:48
Quando Joacine Katar Moreira se estreou no Parlamento, no arranque dos trabalhos, no passado dia 25 de outubro, as expectativas eram elevadas. A saia de pregas do seu assessor principal, Rafael Martins, roubou em parte as atenções da deputada única do Livre, mas os holofotes estavam (quase) todos apontados para Joacine, que recebeu as honras na receção na Assembleia da República. Mal se podia imaginar que menos de um mês depois, a deputada única do Livre estaria envolta em várias polémicas.
Após a primeira intervenção de Joacine no Parlamento, foram várias as personalidades que criticaram a gaguez da deputada e que defenderam que a mensagem do Livre não passa com as dificuldades de comunicação da estreante, críticas que não foram bem recebidas pela deputada.
Mas o primeiro episódio que levou os ânimos a exaltarem-se surgiu na sequência de um artigo de Daniel Oliveira no Expresso, no passado dia 1 de novembro, quando o comentador criticou a postura de Joacine Katar Moreira na política e a personalização do Livre, assumindo-se incomodado com a “biografização da representação política, muito presente na atuação da nova deputada Joacine Katar Moreira”.
'Guerra' no Twitter com Daniel Oliveira
As palavras de Daniel Oliveira conduziram a uma acesa troca de palavras no Twitter entre o comentador e a deputada. Joacine acusou, por seu turno, Daniel Oliveira de não ter uma postura “muito diferente da de muitos associados à direita e sua extrema”.
A nível interno, os problemas começaram quando a deputada única do Livre se absteve na passada sexta-feira na condenação pela “nova agressão israelita a Gaza”, aprovada no Parlamento, o que motivou críticas no partido, que apoia a causa palestiniana. Embora reconhecesse “dificuldades de comunicação”, a direção do Livre decidiu manter a confiança política na deputada. Mas o mal estar é evidente e já causou vítimas.
Felipe Henriques, um dos fundadores do Livre, confessou esta quinta-feira que sente uma “vergonha enorme” pela “telenovela” em que se transformou o seu partido. “Em 2013, começou o projeto por um partido verde, sério, europeísta, libertário, consequente, inclusivo (...). Sinto uma vergonha enorme. Uma vergonha que cresce diariamente. Não foi para este tipo de política que dei o meu esforço”, escreveu Filipe Henriques no Twitter.
Já Miguel Dias, outro dos fundadores do Livre, anunciou há dois dias a sua demissão, manifestando-se “triste” e desagradado quanto à postura política que tem assumido o partido. “Posso adiantar que não estão relacionadas com o conteúdo, pois os meus valores ideológicos e as ideias politicas continuam a condizer em larga medida com o defendido com o partido. Antes com uma questão de forma e de postura política na qual não me revejo”, justificou Miguel Dias no Twitter.
Em declarações à TSF, o porta-voz da direção do Livre, Pedro Nuno Rodrigues, agradeceu a “dedicação” de Miguel Dias ao longo de seis anos e disse lamentar a decisão de um dos fundadores do partido, embora reconheça que é “natural que as pessoas se desvinculem do partido.”
Clima de tensão. Joacine diz que não é “descartável”
O também fundador do partido, Rui Tavares, quebrou o silêncio num artigo de opinião publicado na segunda-feira no “Público”, afirmando “que da mesma forma que a liberdade de voto é respeitada, o partido também pode afirmar qual é a sua posição política”, admitindo que “não é caso para se rir, pelo contrário”.
Pelo meio, Joacine negou um clima de tensão interno e divergências programáticas com o partido. Mas os sinais mostravam precisamente o contrário. Tanto que mais tarde, a deputada acusou o seu partido de a ter “abandonado” e de estar a orquestrar “um golpe” contra si.
“Nunca imaginei que um mês depois das eleições – não é um ano, é um mês – eu ia estar a ser avaliada e colocada numa situação destas pelos meus camaradas. Isto trata-se de um autêntico golpe e a minha resposta é esta: não sou descartável e exijo respeito”, afirmou a deputada em declarações ao Notícias ao Minuto.
Escolta por elemento da GNR no Parlamento
A última polémica refere-se ao facto de a deputada única do Livre ter sido escoltada por um elemento da GNR no Parlamento para afastar jornalistas, depois de um repórter ter questionado Joacine Moreira porque não foi entregue a tempo o projeto de alteração à Lei da Nacionalidade, justificando só mais tarde que não tinha sido informada das regras.
O assessor de Joacine Katar Moreira, Rafael Martins, explicou que o objetivo foi travar a pressão dos jornalistas, sustentando em declarações ao Observador que “não é possível fazer um trabalho claro, esclarecido e lúcido quando estão sempre a interromper”. Posteriormente, Joacine insistiu que exige “respeito” por parte dos jornalistas.
O caso levou mesmo o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, a pedir explicações sobre o sucedido, tendo o secretário-geral do Parlamento, Albino de Azevedo Soares, esclarecido que a escolta por elementos da Guarda do Palácio só se pode justificar quando está em causa a segurança dos deputados.
O Expresso tentou contactar Rui Tavares, mas sem sucesso. Por enquanto, o Livre remete-se ao silêncio até ser tomada uma decisão sobre o caso da deputada no Conselho de Jurisdição do partido. Será que as polémicas ficam por aqui?