Depois de meses de mistério, acaba de ser revelado o relatório final da Comissão Independente para a Descentralização, criada por acordo entre PS e PSD. E traz uma conclusão clara: o país deve mesmo ser dividido por regiões, dando-se início formal ao processo da regionalização, para combater problemas de desenvolvimento e de eficácia nos serviços públicos.
O assunto está muito longe de ser pacífico: em 1998, a pergunta sobre se o país deveria ser regionalizado foi a votos em referendo, como a Constituição prevê - e chumbou, com 60% dos votos contra. Agora, através da criação de uma comissão liderada pelo regionalista João Cravinho, socialistas e sociais-democratas voltaram a lançar o tema, com um calendário para a execução de novo referendo e concretização deste novo modelo para o país.
No documento com 312 páginas que já foi apresentado ao presidente da República, ao Governo e ao presidente da Assembleia da República, são descritos os problemas a que tem levado o excesso de centralismo e concentração de decisões no país, concluindo-se que "nos últimos anos, o grau de centralismo das decisões públicas em Portugal acentuou-se de forma significativa", levando a "elevados custos do ponto de vista da eficácia, eficiência e equidade das políticas e serviços aos cidadãos e empresas".
Assim, conclui o relatório, "apenas a criação e instituição de regiões permite responder de forma integrada" a estes desafios. Isto deverá ser feito num "processo gradual, programado, faseado e com metas". Por exemplo, prevê-se que, para tal, tenham de ser alteradas uma série de leis relativas ao modelo de organização do país e que cerca de dois anos depois do arranque do processo se leve a ideia a referendo, com um novo mapa de regiões que deverá coincidir com as atuais CCDR.
Um aspeto poderá facilitar a aprovação da regionalização, prossegue o documento: é que neste caso a lei prevê que seja preciso conseguir uma maioria qualificada de votos favoráveis entre os participantes na votação, e não entre todos os cidadãos recenseados. Se a aprovação for conseguida, começará então um processo gradual de atribuição de novas responsabilidades às regiões - um processo que fica detalhado no documento, que já estabelece um modelo para o sistema de governo dessas regiões, para o respetivo sistema eleitoral, o seu cronograma de aplicação e os meios de financiamento.
Há um passo que ficaria a faltar: o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, fez em 1998 campanha pelo 'não' à regionalização. Por isso mesmo, numa entrevista concedida ao Expresso em junho, António Costa dizia querer evitar uma "confrontação" com o presidente da República para não correr "o risco de comprometer o processo por mais 20 anos". Mas admitia que Marcelo pudesse ter "evoluído na sua posição" sobre este assunto. Ou seja, ficava a faltar a luz verde do presidente para poder dar início a uma nova reforma estrutural para o país.
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