Política

Augusto Santos Silva: “A forma como nos relacionámos com Angola é hoje completamente obsoleta”

Augusto Santos Silva: “A forma como nos relacionámos com Angola é hoje completamente obsoleta”
Tiago Miranda

No dia em que o Presidente João Lourenço aterra em Lisboa, Augusto Santos Silva antecipa um virar de página nas relações bilaterais. Para o chefe da diplomacia portuguesa, não podemos continuar a olhar para Angola “para examinar a sua evolução política” ou “ver um mercado para obras públicas”. Temos que perceber a oportunidade “vastíssima” da “lição que João Lourenço está a dar a toda a gente”

Augusto Santos Silva: “A forma como nos relacionámos com Angola é hoje completamente obsoleta”

Ângela Silva

Jornalista

A forma como Portugal encarou nas últimas décadas a relação com Angola é hoje "completamente obsoleta". Quem o o diz é o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, que em declarações ao Expresso no dia em que o Presidente de Angola aterra em Lisboa para uma visita de Estado de três dias, espicaça um novo olhar sobre as relações bilaterais.

"Durante muito tempo, tivemos essencialmente duas formas de percecionar a nossa relação bilateral: ou sentiamo-nos no direito de examinar a evolução política e institucional de Angola, ou víamos um mercado para as nossas exportações, obras públicas e construção civil", resume o ministro. Hoje, avisa, isso está completamente ultrapassado e ou mudamos de "chip" ou desperdiçamos a oportunidade.

Convicto de que "o Presidente João Lourenço está a dar uma lição a toda a gente", o chefe da diplomacia portuguesa alerta para a abertura de Angola ao mundo - "eu sei do interesse com que a União Europeia, as Nações Unidas, a Alemanha, a França, a Espanha, ou a China acompanham a evolução política de Angola". E confia que nesta nova fase de Angola "cabem todos" e "Portugal só tem a ganhar ", se souber reposicionar-se no novo xadrês.

"Temos que passar a olhar para Angola como um mercado vastíssimo para um relacionamento em todas as áreas", sublinha o ministro dos Negócios Estrangeiros, insistindo que "o que carecteriza o atual patamar é uma cooperação em todos os domínios" e não só na base de ver um mercado para negócios rápidos.

Sobre o "irritante" diferendo judicial que nublou as relações Luanda-Lisboa em torno do processo contra o ex-vice-Presidente angolano Manuel Vicente, Augusto Santos Silva considera-o enterrado e diz não ver "nenhum handicap" no relacionamento entre os dois países.

Nem o facto de termos que passar a relacionar-nos com Angola num âmbito mais aberto e por isso mais concorrencial? "Não estou nada preocupado", afirma o ministro, "a nossa relação é muito forte", a língua é um ativo diferenciado, e "se esta nova fase de Angola, aberta pelo Presidente João Lourenço, der certo, como desejamos, cabem todos e Portugal só tem a ganhar".

Dois acordos na área da Justiça

Durante a visita de Estado que o Presidente de Angola inicia quinta-feira em Lisboa e que o levará também ao Porto, vão ser assinados mais de 20 compromissos (entre acordos e protocolos) entre os dois países. Dois deles serão precisamente sobre Justiça, a área que no último ano perturbou seriamente as relações políticas e diplomáticas.

Augusto Santos Silva dá grande relevo à cooperação na área agro-alimentar, um setor fulcral num país que, como Angola, importa quase todos os bens de alimentação. Não por acaso, a passagem de João Lourenço por Lisboa inclui uma visita ao Instituto Agrícola e Veterinário, com a presença dos ministros da Agricultura de Portugal e Angola.

A componente política da visita incluirá, além de encontros do Presidente angolano com o seu homólogo Marcelo Rebelo de Sousa, com o Presidente do Parlamento, Ferro Rodrigues, e com o primeiro-ministro António Costa, um discurso de João Lourenço na Assembleia da República. Algo que só aconteceu com o Rei de Espanha, os Presidentes Chissano de Moçambique e Ramos Horta de Timor Leste e com Fernando Henriques Cardoso, do Brasil. Marcelo vai estar no Parlamento a ouvir Lourenço

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: AVSilva@expresso.impresa.pt

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