Estava uma manhã fria, muito fria, no Alto Minho - já não sei bem onde, talvez Ponte da Barca. O dia de pré-campanha ainda estava a começar, nem digo a aquecer porque o frio do Alto Minho consegue ser cortante no inverno.
Em 1995, Jorge Sampaio corria para Belém pela primeira vez, tinha Cavaco Silva como principal adversário, o homem que tinha deixado de ser primeiro-ministro poucos meses antes e que queria chegar a Belém. Sampaio entra num café estreito, balcão do lado direito, duas ou três mesas do lado esquerdo. O candidato vai para beber a bica, estavam duas ou três pessoas lá dentro. Há um apoiante, um homem alto, de pé junto ao balcão, que diz:
- Camarada, bem-vindo!
Sampaio retribui o cumprimento, trocam duas ou três palavras, diz o homem:
- Vê lá se dás cabo desse ladrão, desse bandido que nos andou a roubar estes anos todos...
Sampaio faz má cara, acena com a cabeça que não... O apoiante continua:
- É um ladrão que aí anda, um gatuno...
E vai por aí fora, num chorrilho interminável de insultos.
A certa altura, Jorge Sampaio ergue o dedo indicador direito, fica encolerizado, furioso mesmo, não está muita gente dentro do café, ouve-se bem, e diz ao apoiante:
- Não diga mais nada! O professor Cavaco Silva nunca roubou nada a ninguém, é um homem decente, não lhe roubou nada a si.
E continua, de dedo em riste, dá um ralhete ao apoiante, diz que não quer ataques pessoais, pede-lhe para não continuar a conversa naquele registo, que está a insultar um homem que não está ali para se defender, apesar de ser seu adversário.
Não quer que a campanha corra assim, não é pelo insulto que lá quer chegar.
O apoiante fica sem palavras, emudece, ruboriza com o vexame, ainda balbucia qualquer coisa. Sampaio já está sem paciência, ainda mal começou o dia de campanha, sai do café, já não me lembro se à saída cumprimentou o apoiante nem recordo se chegou a tomar a bica.
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