Educação e emprego: as melhores armas para “travar o recrutamento de crianças e jovens” para o terrorismo em Cabo Delgado
Após uma visita de quatro dias a Moçambique, Jorge Moreira da Silva, diretor-executivo da UNOPS, a agência da ONU para as infraestruturas e a gestão de projetos, toma o pulso à situação na província assolada por atos terroristas desde 2017. Oiça aqui o podcast O Mundo a Seus Pés
Depois de um 2023 de relativa acalmia, Cabo Delgado voltou na primeira metade deste ano a ser palco de ataques terroristas de considerável envergadura. O Daesh, o autoproclamado Estado Islâmico, tem reivindicado a autoria de vários desses ataques, sobretudo no sul da província situada no extremo nordeste de Moçambique.
O último grande ataque, ocorrido a 10 e 11 de maio, visou a sede distrital de Macomia. Cerca de uma centena de insurgentes saquearam a vila e houve vários mortos e intensos combates com as Forças de Defesa e Segurança do país.
A organização não-governamental Human Rights Watch afirmou que nesse ataque os extremistas usaram crianças para invadirem e saquearem a vila, havendo relatos de “dezenas de crianças com cintos de munições e espingardas”.
Jorge Moreira da Silva, subsecretário-geral da ONU e diretor-executivo da UNOPS, a agência das Nações Unidas para as infraestruturas e a gestão de projetos, defende que “a melhor forma de travar qualquer potencial de recrutamento do Daesh e de outras forças extremistas junto de jovens e crianças é assegurar que as crianças têm condições para ir à escola e que os jovens têm emprego”.
Falando ao Expresso a partir de Kigali, a capital do Ruanda, após uma visita de quatro dias a Moçambique, Moreira da Silva sublinha que “Cabo Delgado tem de continuar a ser uma prioridade da comunidade internacional”, devendo esta dar “um apoio decisivo” e sem “qualquer tipo de hesitação”.
Patrulha militar na cidade de Palma, em Cabo Delgado
Porque há “duas crises muito sérias e extremamente graves”, como as de Gaza e da Ucrânia, “não é aceitável que, de repente, se esqueçam outras crises que não desapareceram do terreno, apenas da discussão internacional e mediática”, diz. Ao surgimento de novas crises deve corresponder “um esforço adicional” e não “uma substituição do apoio a uma crise pelo apoio a outra”.
O diretor-executivo da UNOPS, que lidera o apoio humanitário e de desenvolvimento a mais de um milhão de deslocados em Cabo Delgado, reconhece o “equilíbrio difícil” que é necessário estabelecer. Por um lado, não se pode “criar a ideia de que o problema está resolvido, porque não está”, mas, por outro, tal não deve “servir de desculpa para que não se trate do investimento na economia”.
De resto, Moreira da Silva deixa o apelo: “Está na altura de o sector privado e os investidores internacionais regressarem a Cabo Delgado.” Porque só assim, a par com os projetos de reconstrução de habitações, escolas e outras infraestruturas e a criação de oportunidades de trabalho, os deslocados podem definitivamente regressar a casa.
Para escapar aos ataques há quem caminhe dias, como este grupo que se refugiou na escola de Namicire, na vila de Chiúre