Carlos Vidal: “Percebes que a tua vida está um esterco quando na medicina te conhecem como humorista e no humor te conhecem como médico”
Carlos Vidal desdobra-se entre médico especialista em Medicina Geral e Familiar e humorista. Faz parte do regressado “Salve-se Quem Puder”, na SIC e é também uma das grandes apostas dos novos episódios de “Levanta-te e Ri”, disponíveis na Opto. Em conversa com Gustavo Carvalho no podcast Humor À Primeira Vista, fala sobre o respeito pelo palco do “Levanta-te e Ri” e explica que benefícios terapêuticos traz o humor.
Dos tempos da escola em que vias o "Levanta-te e Ri", o que te ficava mais na memória? Ainda há uns tempos tivemos lá esta conversa. Antigamente a malta ia ao "Levanta-te e Ri" para se divertir. Muitas vezes iam fazer texto que nunca tinham testado, havia um lado muito mais virgem da coisa. Hoje em dia sinto que as coisas são mais trabalhadas, há outro tipo de pressão, talvez porque as coisas foram mudando. Mas do que eu me lembro era do lado muito natural. Nos intervalos das aulas acontecia muito cada um referir uma parte específica de que gostou mais. Às vezes havia aqueles “bits” que eram mais unânimes e a malta andava com isso durante semanas, sabíamos os textos de cor, era espetacular.
Achas que o formato ainda tem a capacidade de dar a conhecer novos nomes da comédia ou já não tem esse impacto? Acho que continua a ter esse impacto. Primeiro porque há espaço para ter malta nova. Estes quatro episódios foram todos com malta nova que faz coisas espetaculares. Percebo que hoje em dia seja muito mais fácil mostrares o teu trabalho, coisa que antigamente não acontecia. Pões coisas na net, no instagram, é tudo muito mais fácil. Mas há um respeito único pelo palco do “Levanta-te e Ri”. O primeiro que fiz foi na Figueira da Foz e lembro-me de estar parado a olhar para aquelas luzes a pensar que passou por ali tanta gente. “Isto fez parte do meu imaginário durante tantos anos e eu estou aqui ao lado.” Acho que continua a ser um palco incrível e que é sempre bom atuar e voltar.
As artes e a medicina têm em comum meter o riso um bocado de lado, curiosamente. É verdade. As pessoas acham que um médico e humorista não pode ser. Ou é um ou é outro. É porque o riso está associado a uma falta de rigor. Tu podes achar que não mas, em traços gerais, numa altura em que estás apertado e precisas de alguma coisa, no teu inconsciente confias mais em alguém que é sério porque te transmite confiança. A seriedade está associada a um grau de confiança e sabedoria, e o riso não. Uma das minhas grandes bandeiras é bocado essa. Não é por eu me rir ou por ser bem-disposto que sou menos sério e profissional.
És um humorista com jeito para a medicina, ou um médico que tem jeito para humorista? Acho que nem sou um nem o outro. Faço as duas exatamente com o mesmo profissionalismo, para mim é a mesma responsabilidade. Sinto que preciso das duas para estar bem. Quando estou mais sério na parte da medicina, às vezes tenho ideias para a parte humorística. Às vezes estou no humor a pensar no doente que mediquei, que tenho de lhe ligar. E dou dois passos atrás: “Então, senhor João, está a correr bem?” E fico tranquilo. Agora eu muitas vezes digo que percebes que a tua vida está um esterco quando na medicina te conhecem como humorista e no humor te conhecem como médico [risos].