Não é a primeira vez que o Presidente da República alerta para as implicações políticas de um eventual chumbo do Orçamento do Estado. Já o fez em anteriores orçamentos, quando algures por este calendário se instalou a dúvida sobre como terminariam as negociações à esquerda. Mas fá-lo agora com maior dramatismo, perante a fasquia muito mais elevada que os parceiros da velha geringonça estão a colocar ao Governo, ameaçando chumbar o Orçamento.
Marcelo Rebelo de Sousa alertou esta quarta-feira que se isso acontecer os custos são tão elevados que incluiriam ter de perder seis meses de fundos europeus que estão previstos na proposta orçamental do Governo para o próximo ano. E afastou a hipótese de o país ficar a viver em duodécimos, admitindo que um eventual chumbo do OE terá "muito provavelmente" como consequência óbvia a convocação de eleições antecipadas.
Isso teria "custos muito elevados", avisa o Presidente, que diz por isso não estar “pessimista” - o que "é natural é que tudo seja feito para haver Orçamento”, afirmou, pedindo "bom senso" às partes envolvidas na negociação e lembrando que é possível negociar "até ao último minuto".
Para quem ainda possa ter dúvidas, Marcelo fez um 'desenho' em traço fino das inconveniências de uma crise política.
Primeira: o calendário. “Quero aproveitar para esclarecer o que tenho dito sobre o Orçamento. Para mim é natural que passe na Assembleia da República porque imaginem que era chumbado: se fosse, dificilmente o Governo poderia continuar a governar com o OE deste ano dividido por doze e sem fundos europeus", explicou. "Portanto, muito provavelmente ia para eleições e isso significa 60 dias entre a convocação e a eleição”, conclui, atirando eleições antecipadas "para janeiro". "Isso significava um Governo em fevereiro e um novo Orçamento só em abril."
Segunda inconveniência: perda de tempo no processo de recuperação da economia. "Seriam seis meses de paragem na nossa economia e em muitos fundos europeus que precisamos de usar para a reconstrução do país" nesta fase "em que estamos a sair de uma pandemia".
Terceira e politicamente das mais relevantes inconveniências: poder ficar tudo mais ou menos na mesma. "Eu vou ouvir os partidos na sexta-feira e admito sempre que em democracia me expliquem que um Orçamento aprovado em abril seja muito melhor", afirmou Marcelo, com um esgar de ironia. "Admito que me expliquem que vai haver uma solução política mais clara e que será mais fácil alcançar entendimento no Parlamento", concluiu, insistindo não estar pessimista por lhe parecer óbvio que o estado de necessidade acabará por levar as negociações a bom porto.
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