Genericamente, a geopolítica é chata e, por isso, remetida habitualmente para o fim dos telejornais. Ninguém se cola à televisão para ouvir expressões como "a multipolaridade pós-11 de setembro", "a cooperação securitária intergovernamental entre o Reino Unido e a União Europeia", "a ambiguidade estratégica entre os Estados Unidos e China" ou "a natureza expansiva da arquitectura de segurança regional da NATO". A única frase que insta o nosso amigo mais desligado da política a colar-se às notícias é "VAI COMEÇAR A TERCEIRA GUERRA MUNDIAL!!!!". Tem sido assim nos últimos 80 anos - e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, aproveita bem essa ansiedade.
O poder que Donald Trump usa de forma mais eficaz é o de lançar o pânico para gerar uma expectativa de desastre que, não se confirmando o pior cenário, é transformada em retumbante vitória. Primeiro, provoca uma instabilidade tal que leva a que se declare o fim do Mundo como o conhecemos. Depois, surge como o exemplo maior da contenção e da dissuasão. Primeiro, mostra os dentes de forma belicosa e irredutível. Depois, aparece como o negociador ponderado que encontra soluções disruptivas para conciliar.
Foi assim com a imposição de tarifas, está a decorrer de igual modo com o bombardeamento do Irão. Ter a capacidade de solucionar enormes salgalhadas seria uma qualidade política notável, não tivessem sido criadas pelo próprio. Para evitarmos cair na armadilha de Trump aparecer como o salvador do caos que ele mesmo criou, teríamos de desprezar as suas declarações. Infelizmente, ele desempenha o cargo menos ignorável do planeta.
Mas uma coisa é não ignorar Trump, outra é lambuzá-lo. É que o rei vai nu e há quem aproveita para beijar-lhe os pés. Foi o que fez Mark Rutte, secretário-geral da NATO. Rutte congratulou entusiasmadamente Donald Trump pelas suas acções recentes e ainda disse que "a Europa vai pagar à grande". Ou seja, fica claro que o leitor financiou o bombardeamento do Irão: espero que pelo menos o tenha acompanhado em directo.
Basicamente, Donald Trump mostrou o míssil e Rutte ficou cheio de Teerão. A posição do secretário-geral da NATO é de uma gritante pusilanimidade. Mark Rutte é um daqueles atores geopolíticos quem põe “macia” em “diplomacia”. O que as mensagens mostram é que Mark Rutte pretende ser um servo da gleba da política internacional. No fundo, é da NATO mas quer ser do campesiNATO.
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