A amiga Olga
A deliberada confusão entre publicidade institucional e propaganda político-partidário é um abuso e uma ilegalidade. A Câmara não é o seu presidente e Carlos Moedas não é Luís XIV
Vereadora do PS na Câmara Municipal de Lisboa
A deliberada confusão entre publicidade institucional e propaganda político-partidário é um abuso e uma ilegalidade. A Câmara não é o seu presidente e Carlos Moedas não é Luís XIV
Todos tivemos uma amiga Olga em algum momento da vida. Serviu-nos de álibi quando chegámos tarde a um jantar de família, quando nos esquecemos do aniversário do chefe ou quando não fizemos o que nos compete. A amiga Olga costuma saltar da plateia do anonimato para dar o corpo às balas, uma espécie de escudo humano.
Carlos Moedas terá, com certeza, muitas amigas Olga e ninguém tem nada a ver com isso. A não ser quando essas amigas, por mero acaso candidatas pelo PSD a assembleias de freguesia, são bafejadas pela sorte ao serem escolhidas entre centenas de munícipes para usar da palavra em reuniões da Câmara. E quando, ao defenderem o Presidente e atacarem a oposição, servem o fim último de se converterem em rostos e vozes propaganda nas redes institucionais da Câmara Municipal, em contas com mais de um milhão de seguidores. A partir desse momento, as amigas Olga de Carlos Moedas passam a ser um problema de todos, em particular da Democracia.
O que se contesta não é o critério de escolha (de geometria variável) que permitiu que Olga Borges falasse na referida reunião, a voz (politicamente comprometida) que lá se ouviu, nem as opiniões que expressou (às quais tem todo o direito), desculpando Carlos Moedas pela inação da sua política de higiene urbana, pelo lixo que domina a cidade e pela falta de soluções. Nem sequer o facto de, enquanto munícipe, estar desgostosa com a oposição e com a herança do passado. Até aqui tudo bem.
O problema é quando essa intervenção, de defesa a Carlos Moedas e ataque a um partido político, passa a ser usada para propaganda descarada nas redes e contas institucionais do Município, apagando a fronteira que tem de existir entre a comunicação institucional e as mensagens ao serviço de um projeto político. O problema está na instrumentalização dos recursos próprios da autarquia para defender politicamente o Presidente e atacar diretamente a oposição, numa confusão chocante, abusiva e ilegal, entre o que é a comunicação de um município e o que são mensagens partidárias.
E não é caso único.
Nas últimas semanas vemos que a rede de mupis digitais da cidade, destinados a informação institucional da CML (com programas, concursos, atividades da Câmara ou de instituições de relevo para a cidade, ou informações de obras, cortes de trânsito, alterações nos serviços camarários, alertas da proteção civil…) foi apropriada por Moedas e serve, agora, para a sua não assumida campanha autárquica. Basta passar nas avenidas centrais de Lisboa para vermos centenas de mupis anunciar despudoradamente mensagens como “Lisboa devolve o teu IRS”, que a Câmara já entregou mais de 2000 casas, ou outras propostas do candidato que ainda não o é.
A mensagem política de Moedas que ocupa de forma inaudita todas estas posições na cidade eliminou ainda a cedência gratuita de espaço às instituições culturais, desportivas ou de utilidade pública para divulgação de peças de teatro, assinalar dias internacionais ou apoiar associações não governamentais de combate, por exemplo, à violência contra vítimas ou mulheres. A propaganda pessoal de Carlos Moedas secou tudo à sua volta.
A deliberada confusão entre publicidade institucional e propaganda político-partidário é um abuso e uma ilegalidade. A Câmara não é o seu presidente e Carlos Moedas não é Luís XIV. O sequestro e a apropriação de meios públicos para uso privado ou partidário ofendem os princípios democráticos que deveriam nortear a gestão pública. As amigas Olga, que outrora poderiam ser convenientes, tornaram-se um embaraço para a cidade e uma mancha para a Democracia.
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