Não foram as 223 vidas perdidas em Valência que clivaram a paisagem política espanhola, mas a catástrofe que assolou a região expôs a nu uma democracia europeia doente
O debate no Parlamento Europeu sobre as inundações em Valência foi, mais do que provavelmente, o momento mais tenso dos primeiros seis meses da legislatura. “Não percebo o que se está a passar”, foram palavras proferidas, como se a realidade política espanhola fosse a de um continente estrangeiro, de uma lua política na nossa órbita que observamos mas não compreendemos de todo. A sala crepitava. Um grunhido emitido nas galerias fez girar cabeças de todos os lados, sem nunca ter sido identificado. À medida que a discussão se acentuava, as interjeições começaram a ter origem no próprio plenário. “Vergonha”, dedos apontados, insultos trocados, gente de pé e a sessão interrompida. Não foram as 223 vidas perdidas em Valência que clivaram a paisagem política espanhola, mas a catástrofe que assolou a região expôs a nu uma democracia europeia doente. A incompetência dos governantes regionais (do PP) ultrapassa o cariz político. A lentidão do primeiro-ministro espanhol (do PSOE) também merece as maiores dúvidas, com o estado de emergência a não ser decretado ao fim de uma semana e o Mecanismo Europeu de Proteção Civil tão-pouco. O facto de o fenómeno climático ter alastrado a outras regiões (Málaga, na Andaluzia, Girona, na Catalunha) evidencia como o Governo nacional deveria ter assumido o controlo há muito. Não o fez. Face à incapacidade de Carlos Mázon, atrasado em almoços com jornalistas, olvidado de avisar a sua população no devido tempo, impunha-se outra intervenção do Estado central.
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