Opinião

Portugal, um país para velhos ou para todos?

Portugal, um país para velhos ou para todos?

Margarida Quinhones

Diretora executiva da Pedalar Sem Idade Portugal

Portugal enfrenta um equilíbrio intergeracional fragilizado, onde tanto os jovens como os idosos lidam com dificuldades crescentes que impactam o desenvolvimento e a coesão social. Com o aumento do envelhecimento populacional e a falta de políticas públicas inclusivas, abriram-se portas para iniciativas que procuram responder a estas necessidades

O equilíbrio entre gerações tem vindo a fragilizar-se cada vez mais no nosso país. Por um lado, os mais velhos, que representam já 25% da população portuguesa, não encontram respostas adequadas às suas necessidades. Por outro, os jovens enfrentam dificuldades em prosperar e viver uma vida emancipada no país. As políticas públicas têm-se mostrado insuficientes para a sociedade em geral e, sem uma estratégia clara para atender às necessidades de todas as gerações, existe um grave problema de desenvolvimento e coesão social.

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, em 2023 o índice de envelhecimento em Portugal aumentou para 188,1 idosos por cada 100 jovens, em comparação com o ano anterior. Neste contexto, o distrito com o pior quadro é Bragança, com um índice de 352 idosos para cada 100 jovens. Observamos, assim, que a pirâmide demográfica está invertida, com mais seniores a consumir do que jovens a contribuir. Embora seja necessário garantir uma vida digna aos mais velhos, é urgente criar condições que ofereçam possibilidades aos jovens para viver e contribuir ativamente para o futuro do nosso país, bem como para a criação de famílias e renovação de gerações.

Este desafio é agravado por outro fator preocupante: a solidão. Segundo um relatório de 2020 da Segurança Social, mais de 40 mil idosos estão em situação de abandono, sem qualquer tipo de apoio familiar e institucional, uma realidade que requer uma resposta urgente e eficaz. De acordo com os últimos Censos, cerca de 500 mil pessoas com mais de 65 anos vivem sozinhas. É precisamente neste contexto que se torna essencial reconhecer o potencial que ambas as gerações têm: jovens e mais velhos, de modo a contribuir para um futuro mais inclusivo e solidário.

Para enfrentar este cenário, têm surgido algumas iniciativas intergeracionais que unem realidades distantes pela idade, mas unidas pela mesma necessidade: ver respondidas as suas necessidades concretas. Um exemplo, são os projetos que oferecem aos mais jovens uma solução de habitação acessível e, em troca, proporcionam companhia aos mais velhos, criando um ambiente de apoio e troca de experiências. Ou outras respostas sociais que promovem passeios em bicicletas adaptadas (trishaws), criando momentos de lazer e interação entre pilotos voluntários e seniores, incentivando a inclusão dos mais velhos na sociedade e reforçando laços e promovendo amizades improváveis. Estas iniciativas inovadoras, e que têm dado provas de provocarem impacto positivo em ambos os beneficiários, devem ser mais exploradas, ampliadas e, sobretudo divulgadas para alcançar uma maior efetividade pelo país, comprovando a intergeracionalidade como um valor social central.

Afinal, quantas vezes ouvimos que “os jovens estão perdidos” e que “os idosos já não têm nada para dar”? Os jovens trazem a nova realidade tecnológica, a inovação e uma revitalização para os mais velhos. Os mais velhos, por seu outro lado, trazem a sua experiência de vida, que podem funcionar como guias para os jovens, num mundo cada vez menos centrado na individualidade. Através destas iniciativas intergeracionais, é possível colmatar dois problemas prementes no nosso país: a falta de habitação para estudantes deslocados, ou jovens trabalhadores, e a solidão e isolamento social dos mais velhos.

Olhemos para o futuro com esperança. Levará décadas a inverter a pirâmide, mas se nos focarmos no problema presente, nos focarmos em implementar políticas que não procuram responder somente a uma geração, mas que articulem medidas que favoreçam ambas, talvez consigamos resultados positivos. Mais do que nunca, é preciso ter uma visão equilibrada, holística e inclusiva da sociedade, sem clivagens ou colocar em caixas separadas. Através de iniciativas bem estruturadas, podemos construir comunidades mais resilientes e preparadas para enfrentar os desafios sociais do futuro.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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