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Opinião

Quer violar a minha mulher?

Quer violar a minha mulher?

Isabela Figueiredo

Escritora, vencedora do Prémio Urbano Tavares Rodrigues

Gosto de ser mulher, mas estou cansada do que tenho vivido por ser mulher. Já não é aceitável ter medo de ser violada

Gisèle Pélicot, uma francesa de 72 anos, foi sedada e violada pelo marido e por homens que o mesmo aliciava na internet, durante nove anos. O caso chegou a tribunal. O marido, Dominique Pélicot, confessou a culpa, o que não aconteceu com os restantes violadores, com idades compreendidas entre os 46 e os 74 anos. Defendem-se, alegando que pensavam que a senhora estivesse a dormir ou que disfarçasse dormir. Se o marido consentia, estava consentido. Eu tento perceber como é que uma mulher sedada, inanimada, sem qualquer movimento muscular, poderia dar a impressão de que estaria a fingir dormir. Estes sujeitos, cuja saúde mental se escangalhou algures, acreditam que uma mulher é capaz de vivenciar um ato sexual adormecida, mantendo a cabeça, os braços, as pernas caídos, moles. Sem acordar, apesar do impacto de um corpo masculino. Pensam que o corpo de uma mulher é igual ao de uma boneca sexual mais realista, de carne, corruptível. E como consenso, basta o do marido. Se o marido os convida para o repasto, o que interessa que a mulher esteja a dormir? Não lhe ouviram a voz, mas o marido é que sabe. Violá-la a pedido do marido e à sua frente foi um gosto para todos. A mulher não existe. Ela é uma coisa.

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