Opinião

Humanização no Sistema de Saúde

Humanização no Sistema de Saúde

José Fonseca Pires

Associate Dean na AESE Business School

Não basta “tentar resolver” a materialidade dos problemas e das situações. Os assuntos, nos sistemas de saúde, nunca são meramente técnicos, materiais, operacionais: o serviço que se presta numa instituição de saúde deve ser humanista e humanizador

O atual momento do sistema de saúde – muito politizado, em larga medida numa situação de emergência, exposto a inovações disruptivas e as sucessivas negociações com os diversos grupos de técnicos e especialistas - não nos pode fazer esquecer o que somos como pessoas e como profissionais.

As instituições de saúde são, essencialmente, uma comunidade de pessoas que servem outras pessoas, numa sociedade de pessoas. Isto quer dizer que, em qualquer processo ou atividade, as pessoas estão antes, durante e depois. As pessoas são centrais, nucleares, essenciais.

Num estudo sueco, com sobreviventes de um grave acidente de trânsito, após a recuperação, perguntou-se quais eram as lembranças mais marcantes. Eram de dois tipos: as dores que padeceram e a falta de humanização com que foram tratados. Tinham sido internados em hospitais de ponta e tratados por médicos especialistas e diferenciados… mas isso não basta!

Não basta “tentar resolver” a materialidade dos problemas e das situações. Os assuntos, nos sistemas de saúde, nunca são meramente técnicos, materiais, operacionais: o serviço que se presta numa instituição de saúde deve ser humanista e humanizador.

Para tal, os profissionais de saúde devem ser valorizados, respeitados, também eles objeto de cuidado. E as carreiras profissionais que desenvolvam e reconheçam o talento, e uma adequada e justa retribuição salarial fazem parte integrante desta valorização.

Só assim os profissionais de saúde estarão capacitados e motivados para, por sua vez, serem capazes de prestar atenção, sintonizar com o outro, entender a fundo os problemas e agir para os tentar resolver. É que àqueles que trabalham no sistema de saúde é-lhes pedido que tenham coração e mãos: “ver” e descobrir as feridas e vulnerabilidades dos outros e, além disso, ter o talento e a capacidade para as cuidar e tentar resolver.

Isto conduz a um estilo de trabalho que valoriza mais a atenção às pessoas do que a gestão das coisas; a colaboração, mais do que a competição; a concretização mais do que a especulação; a tenacidade mais do que o brilho; o cuidado mais do que a eficácia.

E esta atitude humanizadora tem, além disso, um potencial inovador surpreendente: quando se “vê” mais profundamente, quando se presta atenção aos detalhes, descobrem-se com maior nitidez e perspicácia as necessidades dos outros e a forma de lhes dar solução. Chega-se mais longe, tem-se mais impacto.

Tudo isto leva a uma mudança organizacional profunda, pois constroem-se relações mais justas, de elevada qualidade no relacionamento entre os membros da organização, criam-se ligações profissionais baseadas na confiança e fortalece-se a partilha de valores, acabando-se por construir o compromisso em redor da nobre missão da Instituição de saúde. Isto redunda numa maior qualidade e humanização do serviço que se presta.

Como pessoas, todos somos especiais, diferentes, às vezes surpreendentes. Cabe aos líderes criar condições e dar estímulos para que se estabeleçam sólidas relações interpessoais, fortes vínculos e compromissos duradouros que construam a unidade nas organizações. E cabe a cada um valorizar as pessoas e as equipas com quem trabalha, e servir com competência profissional e humanidade os doentes e os seus familiares.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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